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Ciclista, doutor em teoria econômica pela Universidade de São Paulo; foi pesquisador visitante na Universidade Columbia e é pesquisador do Insper.

Violência pode matar a pretensão das crianças virarem cidadãos do bem

Pesquisadores mostram que impacto da criminalidade restringe desenvolvimento de quem cresce nas favelas

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Somos uma sociedade violenta. O Brasil apresenta uma das maiores taxas de homicídios do mundo. Em 2016, de acordo com dados do Banco Mundial, as 61.283 vítimas fizeram com que essa taxa no país fosse cerca de seis vezes maior que aquela verificada nos Estados Unidos e 29 vezes maior que a do Reino Unido.

Vários são os desdobramentos negativos da criminalidade no nosso cotidiano. Medo, restrições à liberdade, trauma psicológico e, nos casos de morte, a dor da perda. Porém, as mortes representam não somente uma perda individual, como também, coletiva.

Calçada em Botafogo, zona sul do Rio de Janeiro, após suspeito de tentativa de assalto levar cinco tiros - Danilo Verpa -21.fev.18/Folhapress

Em 2004, segundo estudo realizado por Daniel Cerqueira, Alexandre Carvalho, Waldir Lobão e Rute Rodrigues, o custo estimado da violência representaria mais de 5% do PIB nacional (Análise dos Custos e Consequências da Violência no Brasil, 2007).

O impacto sobre as crianças também não deveria ser menosprezado. A literatura acadêmica tem documentado efeitos no desenvolvimento cognitivo, depressão, ansiedade e ampliação de comportamentos agressivos.

A exposição diária à violência gera uma sensação de insegurança e tende a ter influência negativa na frequência escolar de crianças que nasceram em lugares de baixa renda, repercutindo assim, na diminuição do aprendizado e na ampliação da evasão escolar.

Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, Joana Monteiro e Rudi Rocha encontraram que os tiroteios entre gangues de drogas nas favelas afetaram o desempenho dos estudantes das escolas que estavam localizadas em suas proximidades (Drug Battles and School Achievement: Evidence from Rio de Janeiro's Favelas, 2017).

Em São Paulo, o cenário não é diferente. Por meio de um conjunto de dados com a localização dos homicídios, Lívia Menezes e Martin Koppensteiner mostraram que esse tipo de morte tem consideráveis desdobramentos sobre os resultados educacionais da capital paulista (Violence and Human Capital Investments, 2021).

Nesse estudo, os pesquisadores encontraram que além do impacto sobre a aquisição de capital humano, a violência também afeta negativamente as aspirações dos garotos. Adicionalmente, verificaram que os homens são os mais impactados no desempenho e frequência escolar.

Todo esse quadro restringe o desenvolvimento das competências de crianças de baixa renda e, consequentemente, acaba tendo importantes repercussões sobre a perpetuação da pobreza.

Além disso, em um país em que parcela da sociedade considera que as favelas são dominadas por bandidos, aqueles que, por ordem do destino, nasceram em ambientes pouco profícuo para o desenvolvimento de um ser humano, precisam ainda lidar com a discriminação social. Deste modo, apresentam altas chances de permanecerem na mesma situação socioeconômica dos pais.

Sem os investimentos necessários para quebrar a armadilha da pobreza a que muitas crianças das favelas estão submetidas, o contexto faz com que algumas sejam seduzidas pelo mundo do crime. De tal modo, acabam virando aquilo que, de certa forma, parcela da sociedade espera delas.

Nesse contexto, a exclusão social e o preconceito fazem com que várias crianças promissoras da periferia não consigam progredir socialmente, tornando-se aquilo que, aos olhos de certos brasileiros, convencionou-se contemporaneamente a ser definido como: "cidadão do bem".

O texto é uma homenagem à música "Minha alma (a paz que não quero)", interpretada pela banda O Rappa e composta por Alexandre Monte De Menezes, Lauro Jose De Farias, Marcelo De Campos Lobato, Marcelo Falcão Custodio e Marcelo Fontes Do Nascimento Vi Santana.

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