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Silvio é símbolo do academicismo bem-sucedido, não do movimento negro, diz coordenador do Idafro

Hédio Silva Jr. critica a decisão do ex-ministro de atrelar denúncias de assédio sexual a suposta tentativa de apagar lutas da população negra

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Brasília

Ex-secretário da Justiça de São Paulo e coordenador-executivo do Idafro (Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras), o advogado Hédio Silva Jr. critica a decisão do ex-ministro Silvio Almeida de atrelar as denúncias de assédio sexual que motivaram sua demissão da pasta de Direitos Humanos a uma suposta tentativa de apagar lutas empreendidas pela população negra no Brasil.

Silva Jr. afirma que, apesar de o ex-ministro ter se notabilizado com a publicação da obra "Racismo Estrutural", ele não pode ser visto como um representante do movimento negro nem habilitado a falar por todo um segmento social.

Silvio Almeida durante entrevista à imprensa no CCBB de Brasília - Folhapress

"Tenho ouvido que Silvio seria símbolo do movimento negro. Silvio é símbolo do academicismo negro bem-sucedido no mercado editorial, e até aqui, tudo bem. Entretanto, nunca teve militância orgânica e não é à toa que todas as organizações negras rapidamente manifestaram-se a favor da ministra Anielle Franco", diz o advogado, citando a titular da Igualdade Racial, uma das supostas vítimas de assédio.

Formado em direito pela Universidade Mackenzie e em filosofia pela Universidade de São Paulo (USP), Silvio Almeida é professor universitário, advogado e filósofo.

Uma de suas atividades principais, além de dar aulas, era proferir palestras sobre racismo, área em que era reconhecido como um dos maiores especialistas do país.

O coordenador do Idafro, instituto que é uma das cerca de 300 organizações integrantes da Coalizão Negra por Direitos, afirma que "não existe um papa do movimento negro no Brasil", mas que é preciso levar em consideração o histórico da pessoa antes de alçá-la ao posto de porta-voz.

"Nós vivemos uma era em que ser preto deixou, essencialmente, de ser uma coisa ruim e se tornou uma oportunidade de se tornar um especialista em um assunto. Isso significa que qualquer pessoa pode escrever e falar sobre qualquer assunto, ter um conjunto de likes e virar, eventualmente, uma referência. Isso, entretanto, não o habilita ou faz dela uma interlocutora do movimento mais antigo do Brasil", diz.

Silva Jr. sustenta que o ex-ministro tem uma trajetória marcada por decisões e intervenções individuais desde antes de sua entrada no ministério, sem atuar junto e sem consultar coletivos e grupos sociais do movimento negro.

Ele cita como exemplo a participação de Silvio no comitê de diversidade criado pelo Carrefour em 2020, após o assassinato de Beto Freitas em uma loja da rede em Porto Alegre. Lideranças populares e a própria Coalizão Negra por Direitos criticaram a ausência de diálogo entre a empresa e movimentos históricos.

À época, o filósofo se defendeu das críticas afirmando que o intuito do grupo era "propor formas de reparação e meios de responsabilização" que contemplassem a família da vítima e a sociedade brasileira, acrescentando que era seu dever contribuir em um momento "tão confuso e tão difícil".

"Ele fala em nome próprio, não em nome de uma demanda social. Falar sobre racismo não faz dele uma pessoa reconhecida ou credenciada pelo movimento negro, como Wania Sant´Anna e Douglas Belchior, para falar em nome de uma demanda social", diz o dirigente do Idafro.

O advogado Hédio Silva Jr., coordenador-executivo do Idafro - @drhediosilva no Instagram

Silva Jr. também critica a decisão do agora ex-ministro de classificar como falsas as acusações de assédio sexual de que foi alvo, sugerindo que a ministra Anielle Franco, uma das supostas vítimas, estaria mentindo.

"Não se trata de instaurar um julgamento público sobre se houve ou não houve assédio sexual. A pior estratégia que você pode ter em um caso como esse, independentemente de ser a Anielle ou não, do fato de ela ser negra ou branca, é adotar como estratégia de defesa a desqualificação da vítima", afirma.

"Ele deveria olhar para a câmera [ao gravar seu pronunciamento] e dizer: 'Eu nunca assediei absolutamente ninguém'. Mas ele vai para o temerário terreno da prova indireta, de que não há materialidade, de que 'elas não têm provas de que eu fiz'. Não é isso que você responde quando está sendo acusado."

Silvio segue negando com veemência as denúncias, mesmo em conversas privadas.

"Sou o maior interessado em provar a minha inocência, apesar de saber que este ônus não deveria ser meu. Que os fatos sejam postos para que eu possa me defender dentro do processo legal", disse, em nota, após ser demitido pelo presidente Lula (PT) na sexta-feira (6).

com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH

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