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Jornalista e autor de "Escola Brasileira de Futebol". Cobriu sete Copas e nove finais de Champions.

Descrição de chapéu 25 anos do tetra

Com frieza e eficiência, seleção deu fim ao maior jejum em Copas

Se foram patinhos feios no passado, campeões de 94 recebem afagos nos 25 do tetra

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“Essa é pra vocês, seus traíras, filhos da puta.”

A frase de Dunga, com a taça de campeão do mundo nas mãos, marcou a seleção de 1994 pelo sentimento de revanche. Até hoje os tetracampeões sentem-se os mais desprestigiados dos campeões mundiais: “Comparando com 1970 e 2002, não tem dúvida”, diz o meia Zinho, camisa 9 daquele time e apelidado de “enceradeira” de maneira jocosa, pelo programa Casseta & Planeta, da TV Globo.

“Faltou respeito com as famílias”, costuma dizer o meia-esquerda daquele time, que se vestia com o número de centroavante, porque Romário era 11.

Veja mais: Lembre a campanha jogo a jogo do Brasil no tetra

Da esquerda para a direita, Mauro Silva, Márcio Santos, Romário, Dunga, Viola e Cafú, da Seleção Brasileira, durante a comemoração do tetra - Pisco Del Gaiso - 17.jul.1994/Folhapress

Rever a primeira página da Folha no dia da estreia —20 de junho— torna incompreensível a sensação de vingança. Telê Santana, pedido pela torcida paulista para o lugar de Carlos Alberto Parreira, durante as eliminatórias, inaugurou a cobertura com a maior crença no troféu. “Das 24 seleções, a brasileira é a que mais confio para o título”, escreveu.

O maior treinador da década de 1990 aplaudia a seleção. E o povo? 

Na semana estreia na Copa 1994, pesquisa Datafolha mostrou que 66% acreditavam no sucesso do Brasil Na edição da revista Placar de abril de 1994, uma pesquisa do Ibope indicava a seleção do povo. Oito dos onze titulares de Parreira estavam lá. Os entrevistados queriam Zetti no lugar de Taffarel, Cafu na vaga de Jorginho e Palhinha em vez de Dunga. 

Telê via condição de o Brasil ser campeão depois de 24 anos, porque conhecia futebol. Também porque se decepcionou com as estreias de Alemanha e Itália, nos dias anteriores à coluna.

Havia desconfiança de parte da torcida e da crítica porque o time teve a primeira derrota nas eliminatórias, em 1993, contra a Bolívia. Porque primeiro turno dos jogos classificatórios foi sofrível, com empates contra Equador e Uruguai. Porque se repetia que o Brasil era retranqueiro e europeizado.

Exagero da análise, sempre respondido por Parreira: “Somos escola brasileira. Jogamos com linha de quatro atrás, saímos com bola no chão e troca de passes.”

Retrancado aquele time não era. Era chato. Gastava a bola com trocas de passes incessantes. Quando perdia o domínio, recuava. Nada da marcação por pressão que, junto com a posse de bola, compôs o Barcelona da década seguinte.

Para Parreira, o jogo era de controle com bola no pé e recuo para marcar sem ela. “Só Bebeto e Romário ficavam sem obrigação defensiva”, diz o estudo da Fifa sobre aquele Mundial. 

Em 1970, Gérson e Rivelino também tinham responsabilidades defensivas. Pois Rivelino e Gérson, comentaristas do programa Apito Final, da Band, que fechava as noites da Copa com críticas ácidas à seleção de Parreira, estavam na mira de jogadores como Dunga e Branco.

Na concentração, não se admitia que o tom crítico viesse justamente de quem tinha jogado futebol em alto nível e vencido Copa do Mundo pelo Brasil.

Os jogadores queriam blindagem total na concentração de Los Gatos, a 85 quilômetros de San Francisco, sede na fase de grupos. Só havia atendimento a familiares e jornalistas numa tenda montada nos jardins do hotel. Era um bunker, o primeiro sistema defensivo intransponível de Parreira.

Durante o torneio as sedes mudaram e o atendimento ficou menos restrito. Na última semana, em Fullerton, a 41 quilômetros do centro de Los Angeles e 66 quilômetros do Rose Bowl, palco da final, o hotel da seleção ficava repleto de jornalistas em seu saguão, na semana da final.

Os jogadores moravam em seus quartos e o discurso seguia o mesmo. Parreira pretendia a seleção fria e calculista. Marcos Augusto Gonçalves escreveu no caderno de esportes da Folha, no dia da final, que o duelo entre futebol de resultados e futebol-arte era um Fla-Flu bocó. Porque ganhar não significaria ser a única maneira de jogar futebol.

Hoje, parece que a frieza dos números venceu. Mas, quatro anos depois, Vanderlei Luxemburgo foi escolhido para treinar a seleção, não por ser pragmático, mas por ser, à época, o mais ofensivo técnico do Brasil.

No retorno, os jornais tratavam do voo da muamba, matéria de Fernando Rodrigues, na Folha, denunciando que jogadores e dirigentes tentaram entrar no país, com compras e equipamentos, sem pagar impostos, sob o pretexto de serem campeões mundiais.

Ao mesmo tempo, a população homenageava os ídolos, nas ruas de Recife, Brasília e Rio de Janeiro. As informações certeiras amplificaram o sentimento de revanche dos campeões com a imprensa. A torcida não tinha nada a ver com isso.

Sempre que foi campeão do mundo, o Brasil dependeu de seus craques. Em cada campanha, houve uma particularidade. Em 1958, o primeiro 0 x 0 da história das Copas e Pelé como mais jovem vencedor. Em 1962, Garrincha decisivo, liberado para a final, apesar do cartão vermelho na semi. Em 1970, o México consagrou Pelé, vencendo todos os seis jogos, mas sofrendo gols em cinco deles. Em 2002, com Rivaldo e Ronaldo e erro de arbitragem contra Bélgica.

Os 25 anos do tetra são comemorados com festa oficial da CBF, na Granja Comary, e encontro comemorativo num hotel em Ipanema, organizado pelos jogadores. Se foram patinhos feios no passado, recebem afagos em suas bodas de prata que nem Pelé e Garrincha tiveram.

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