Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.
Fico espantado que Hebert Conceição só tenha dito um palavrão depois do triunfo
Reclamações de comitês só reforçam a falta de respeito pelos palavrões, mais chocantes que os próprios
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Quando se qualificou para as semifinais dos Jogos Olímpicos, o jovem pugilista brasileiro Hebert Conceição declarou, e cito: "Eu sou medalhista olímpico, caralho! Eu mereço pra caralho! Nós trabalhamos pra caralho, porra!".
De acordo com a Folha, citando a assessoria do COB, estas palavras geraram uma reclamação de uma agência portuguesa de comunicação, o que, se for verdade, me envergonha. E o COI recomendou que a equipe brasileira evitasse afirmações "não apropriadas", o que me enfurece.
O que vejo de menos apropriado nas declarações de Hebert Conceição é a sua surpreendente contenção. Quando, depois de anos de esforço e sacrifício, alguém atinge um dos seus objetivos e consegue dizer apenas um palavrão (repetições não contam, e é preciso ser muito mesquinho para considerar "porra" um palavrão), eu fico espantado.
Não apropriado seria que um atleta cujo ofício envolve ser esmurrado no nariz celebrar dizendo: "Vossas excelências não calculam o maravilhoso êxtase que neste momento me invade".
Há uma falta de respeito pelos palavrões que é mais chocante do que palavrões. A indecência não está a ser tratada decentemente. Basta ver a vergonha que se passa a toda a hora, perante a indiferença das autoridades.
Um amigo assusta-se e envia por SMS: "fodasse!". Gente do Twitter indigna-se e grafa: "fodasse!". Por todo o lado, sempre que há um sobressalto, um lamento, uma discordância, alguém escreve: "fodasse!". Ora, a palavra "fodasse" não existe. Escrever "fodasse" é exprimir uma obscenidade e incorrer num erro ortográfico. É falta de educação e falta de educação.
Na verdade, quem escreve "fodasse" não exprime obscenidade nenhuma. No máximo, trata-se da expressão de uma obscenidade na forma tentada. Estamos perante alguém que deseja dizer um palavrão e não consegue --o que prova que é preciso ter formação para ser malformado.
As crianças não têm culpa. Os programas escolares estão desajustados da realidade, como se vê. Estudam-se verbos das três conjugações, mas ignora-se a forma reflexa de um dos verbos que mais vamos usar pela vida fora. O resultado é este: um número chocante de pessoas que não sabe exprimir-se convenientemente. É uma área do saber que não pode continuar a ser negligenciada, foda-se.
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