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Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

Como discutir com uma criança bêbada

Donald Trump tem elementos de infantilidade e de embriaguez

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O que gera maior perplexidade, no discurso de Donald Trump, é que tem elementos de infantilidade e de embriaguez. Parece que estamos ouvindo uma criança bêbada —uma ideia muito perturbadora.

Tudo é tremendo: "Os maiores comícios de sempre", "eles cometeram a maior fraude de todos os tempos", "nunca ninguém viu nada assim". Há também o recurso de argumentos de autoridade pueris: "Todo o mundo sabe que eles são mentirosos", "muita gente tem me dito que eu sou mesmo bom".

E por fim temos os argumentos do mundo da fantasia: "Eles matam bebês recém-nascidos", "os imigrantes estão comendo cães em Springfield, Ohio".

Em ambos os casos, os jornalistas intervieram dizendo que não há um único Estado americano em que seja legal matar bebês recém-nascidos" e que as autoridades de Springfield afirmam não haver qualquer relato fidedigno de rapto e ingestão de animais de estimação por imigrantes naquela cidade. O problema é que desmentir uma criança bêbada é uma tarefa complexa.

Ilustração de Luiza Pannunzio para coluna de Ricardo Araújo Pereira de 15 de setembro de 2024 - Folhapress

Contrapor fatos a fantasias não funciona. Fatos e fantasias são unidades monetárias de países diferentes —ou, talvez melhor, de planetas diferentes. Quando uma criança nos pergunta por que é que o Papai Noel ainda não chegou, nós não avançamos com fatos sobre a inexistência do Papai Noel. Compomos uma história em que o Papai Noel, aos comandos do seu trenó voador, tem de fazer paradas em várias casas de outras crianças antes de chegar à nossa.

O ideal, por isso, não é apresentar depoimentos oficiais que negam a ideia de que os imigrantes se dedicam a comer os animais de estimação dos residentes em Springfield. O que há a fazer é mostrar um documento segundo o qual os imigrantes têm, de fato, cozinhado animais de estimação, mas apenas no caso em que esse animal é um dragão. E juntar algumas receitas de arroz de dragão, moqueca de dragão etc.

A criança fica estupefata por duas razões: por verificar que a nossa capacidade de fabulação é superior à dela; por ser obrigada a reconhecer que aquilo de que se queixava é, afinal, uma coisa boa. Matar dragões é geralmente entendido como positivo. É a atividade mais heróica de sempre. Nunca ninguém viu nada assim.

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