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Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

Descrição de chapéu Tragédia em Brumadinho

Nossa vida, mais amores

Como Gonçalves Dias escreveria hoje sua 'Canção do Exílio'?

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Socorrista que atua na busca por vítimas após o rompimento de barragem em Brumadinho (MG) - Mauro Pimentel/AFP

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Um dos maiores poemas, e talvez o mais célebre, da literatura brasileira diz em sua segunda estrofe: “Nosso céu tem mais estrelas/ Nossas várzeas têm mais flores/ Nossos bosques têm mais vida/ Nossa vida, mais amores”. Você adivinhou: é a “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias (1823-1864), que começa, claro, com “Minha terra tem palmeiras/ Onde canta o sabiá”.

Quando o poeta o escreveu, em 1843, o Brasil, ainda com 90% de território a desbravar, tinha de si próprio uma visão romântica e idealizada. Hoje sabemos muito mais sobre o país —e tanto que, se Gonçalves Dias fosse reescrever seu poema, teria outras imagens a escolher. Eis algumas.

Nossas barragens são criminosas e inseguras —rompem-se e levam à morte o que encontram pela frente. Nossos viadutos e pontes vão abaixo ou racham, pela ação do tempo ou por serem feitos com material de quinta. Nossos museus se incendeiam e destroem patrimônios que não nos pertencem, mas à humanidade. 

Nossos mares, baías e rios recebem nossos abjetos dejetos naturais e industriais e só têm o odor como protesto antes de morrer. Nosso céu é, às vezes, uma hipótese —algo que deve existir acima da camada de poluição. E nossos sistemas de fiscalização, obedientes a interesses maiores, não fiscalizam. 

Nossos hospitais, escolas e transportes públicos são carentes, insuficientes ou inexistentes. Nossas estradas, ruas e calçadas são crateras, impróprias para humanos e carros. Nossas cidades têm vastos territórios vedados aos cidadãos e outros em que, pela miséria, seus habitantes podem praticar tudo, menos a cidadania. E nossos administradores são inoperantes, incompetentes ou corruptos.

Falando neles, nossos corruptos são, estes, sim, dignos de poemas e rapsódias. Penetraram por todas as brechas conhecidas da vida pública —e, como não paramos de descobrir, também pelas desconhecidas.

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