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Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

Descrição de chapéu Diplomacia Brasileira

Para concretizar acordo com China, Guedes terá desafios internos e externos

Pressão da indústria brasileira e tratado Mercosul-União Europeia são entraves à frente

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Não haveria teste maior para as credenciais liberais do governo Bolsonaro do que a perspectiva de um acordo de livre-comércio com a China. 
 
No vaivém das notícias, não se sabe se a ideia do acordo é para valer, se a referência a isso não terá sido uma mera provocação por parte de Paulo Guedes ou uma sinalização de que algo virá.

Os líderes de China, Xi Jinping, à esq., e Brasil, Jair Bolsonaro, em Pequim - Noel Celis - 25.out.19/AFP

Ainda assim, vale o exercício de tomar pelo valor de face as declarações do ministro e antecipar o que ele encontraria pela frente para dar a largada. Guedes teria que:
 
1) Encarar os russos —no caso, a indústria brasileira. Evidentemente, não poderia querer combinar com os russos, porque se depender do aval do setor produtivo ele nem dobra a esquina. 
 
Guedes também teria que segurar a pressão de outras forças de dentro do governo, além de parlamentares e todos os que tentariam lhe vender cenários catastróficos.
 
2) Combinar com o Mercosul. O interesse num acordo com os chineses pode ser a desculpa que Guedes buscava para acabar com a regra de que, ao negociar com outros países, os membros do Mercosul precisam atuar em conjunto. 

 

Se quisesse avançar rapidamente, iria sozinho e deixaria o Mercosul no caminho. Ou, menos provável, Guedes poderia preferir esperar para ver o que pensa a administração do presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández. 

Caso o Brasil decidisse negociar sozinho com a China, isso não seria necessariamente o fim do Mercosul, mas com certeza acarretaria a transformação do projeto de integração. 

Implicaria diminuir a ambição do bloco e limitá-lo ao livre-comércio (claro, assumindo que os demais parceiros do Mercosul aceitassem preservar esse aspecto). 

Para fora do Mercosul, seria cada país por si a negociar seus acordos comerciais. Possivelmente seja esse o desejo de Guedes, mas lhe falta um bom motivo para rebaixar o bloco.

Transformar o Mercosul numa mera área de livre-comércio tem custos –comerciais, econômicos, políticos e estratégicos. 

Diante disso, a lógica política recomendaria que, para poder dar um passo atrás no Mercosul, o governo apresentasse um projeto melhor e que exigisse esse curso de ação.

Seria natural pensar que, para este governo, um acordo com os EUA pudesse vir a ser usado como motivo para rever o Mercosul. E não um com a China.

3) Administrar os americanos. Se realmente ao ministro não faltam coragem e apoio do presidente, Guedes poderia logo dobrar a aposta e começar negociações para um acordo de livre-comércio com os EUA também. 

Flertar com China e EUA ao mesmo tempo seria a maneira de tirar proveito da rivalidade entre eles e melhorar a barganha para o Brasil. 

Para quem se lembra, as negociações da Alca e as do acordo Mercosul-União Europeia aconteciam em paralelo. Quando a Alca desandou, a pressão sobre os europeus diminuiu, e as negociações se arrastaram (não apenas, mas também por esse motivo).
 
4) Decidir o que fazer do acordo Mercosul-União Europeia, que foi negociado entre blocos. 

O Brasil precisaria construir uma solução para mantê-lo de pé se o Mercosul se transformasse em outra coisa. 

Poderia tentar substituir o acordo Mercosul-UE por um acordo UE+4, replicando os termos do acordo original em acordos individuais. 

Mas haveria complicações técnicas e, no melhor cenários, as negociações seriam reabertas. No pior, o acordo iria por água abaixo. Poderia ser também a desculpa conveniente para europeus resistentes ao acordo.
 
Guedes teria uma maratona pela frente rumo a um acordo com a China —e à medalha de ouro de livre-cambista. Sendo para valer o que disse o ministro, aqueles que se queixavam que o Brasil não sabia o que queria da China agora não têm mais do que reclamar.

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