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Advogado, é professor de direito internacional e direitos humanos na FGV Direito SP. Doutor pela Central European University (Budapeste), escreve sobre direitos e discriminação.

Para ganhar em 2020, esquerda deveria olhar para Hungria

Divididos, partidos à esquerda patinam diante do bolsonarismo

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Que Bolsonaro incorpora o fascismo ao léxico político brasileiro já sabemos. Tampouco chega a ser novidade o plano bolsonarista de radicalizar a política nacional ao ponto da caquistocracia, o governo dos piores. Ponto, aliás, a que já chegamos, apesar ou talvez justamente por causa das pilhas de notas de repúdio burocraticamente escritas, e arquivadas. Mesmo com o poder do necrofascismo bolsonarista de ofuscar o futuro que deveríamos estar construindo, recai sobre os ombros do campo progressista a responsabilidade histórica de, unidos, construí-lo. Nisto, estamos falhando magistralmente.

O PT definiu que o ex-deputado federal e ex-secretário de Transportes da capital paulista Jilmar Tatto, 54, será o candidato do partido à Prefeitura de São Paulo nas eleições municipais deste ano - Filipe Araújo/Divulgação

“Diante de uma ameaça fascista e de um governo autoritário como o do Bolsonaro, nós nos comportarmos como sempre nos comportamos: divididos e fragilizados”, nos ensina o deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) em entrevista ao jornal O Globo no último dia 16 ao, infelizmente, anunciar ter desistido de sua candidatura à prefeitura do RJ. Em 2016, Freixo havia ganho parcela expressiva dos votos, 40%. Freixo ressalta o apoio do PT, mas lamenta não ter fechado com outros partidos de esquerda, como PDT e PSB. Mesmo com o fim das coligações em eleições municipais, o que tende a aumentar número de candidaturas a prefeitos, a ausência de uma frente ampla anti-fascismo é estarrecedor.

Quem esperava por renovação no campo progressista para prefeituras em 2020, que espere sentado enquanto o fascismo permanece de pé. No mesmo dia da entrevista de Freixo, o PT em SP decidiu escolher Jilmar Tatto, em votação eletrônica na qual participaram os 615 membros dos diretórios regionais do PT. Mas, calma, em seu discurso o candidato escolhido acenou para periferia e minorias. Quem entre os 180 mil filiados do partido na cidade esperava por democracia intrapartidária, que espere fora da sala do petit comité do partido, àqueles resta o aceno, não o lugar à mesa.

Corta para Budapeste, Hungria, 2019. Partidos de oposição ao regime do poderoso premiê Viktor Orbán ganharam 14 dos 23 distritos da capital Budapeste. No país, a oposição obteve 10 das 23 maiores cidades. Nada desprezível. Orbán controla dois terços do Parlamento húngaro, o que o permite mudar a constituição que o seu próprio partido escreveu a seu bel prazer. Orbán controla a mídia – de radio, a jornais e até outdoors, e moldou a lei eleitoral para favorece-lo.

Neste cenário improvável, a oposição húngara aprendeu a lição para tirar do partido de Orbán a fama de invencibilidade: união. Não por altruísmo ou por concordarem entre si, mas por pragmatismo. Depois de sucessivas tentativas frustradas de coalizão e derrotas eleitorais, partidos de oposição na Hungria desenvolveram a receita bem-sucedida: realizaram primárias para escolher os candidatos, deram espaço para novos políticos, incorporaram pautas que apelam a uma gama maior de eleitores como meio ambiente.

No Brasil, partidos de esquerda e de centro esquerda, até o momento, não tem mostrado igual maturidade na corrida eleitoral para as prefeituras. “Para derrotar o bolsonarismo é preciso mais que responder as crises que ele provoca. Tem que ir além. Temos que vencê-lo com um projeto que seja melhor que o dele. Qual é o nosso projeto? (...) Precisamos de um projeto que não seja meu, do (Fernando) Haddad, do Ciro (Gomes), de quem for. Estou pedindo uma unidade tanto no Rio quanto em outros lugares”, segue Freixo na mesma entrevista do último dia 16. Ironicamente, PT lançou na mesma semana o “Plano Lula para o Brasil” – quaisquer que sejam os méritos do programa (muitos serão), colocá-lo sob o manto personalista vai na contramão de uma coalizão mais ampla do que o lulismo.

Bolsonaro não é Orbán, não ainda – este é bem mais poderoso do que aquele. Se a esquerda não se unir hoje, estaremos recolhendo os cacos de nossas escolhas personalistas nas eleições municipais, quiçá, em 2024 ou 2028. Lembro aqui da frase memorável de Shirley Chisholm, primeira congressista negra nos EUA e primeira pré-candidata à Casa Branca nos anos 70 pelo Partido Democrata: “Se eles não lhe derem um assento à mesa, traga uma cadeira dobrável."

Para que um futuro progressista seja construído, aqueles que hoje se sentam à mesa precisam ou se levantar ou colocar mais cadeiras à mesa. Ainda há tempo de escolher.

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