Mortes: Médica baiana, foi grande nome da pesquisa sobre assédio moral
Margarida Barreto teve infância pobre e atuou no Partido Comunista Brasileiro
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
Em seus 50 anos de medicina, Margarida Barreto trouxe ao mundo incontáveis crianças. Ela ficou conhecida, porém, pelo trabalho pioneiro sobre assédio moral, o que a tornou um dos grandes nomes brasileiros na área.
Da infância pobre em Salvador, contava como a mãe a acudiu com folhas de bananeira quando derramou em si uma panela de óleo que estava no fogão.
A mãe, inclusive, sempre foi um exemplo de honestidade e solidariedade para a filha. "Uma vez ela achou uma boneca no lixo, ficou muito feliz e levou para casa. ‘Vá e devolva. Está no lixo, é do lixo. Aprenda a não pegar nada de ninguém’", conta a sobrinha Danyella Barreto.
Sem energia em casa, aproveitava a luz do poste para estudar. A persistência rendeu frutos e ela passou em medicina. Os colegas diziam que a aluna bolsista usava apenas dois vestidos –o que era verdade.
No início da graduação, se alimentava com o que uma freira lhe dava e com doses de glicose que sobravam dos pacientes. Foi nesse período que uma cirurgiã experiente passou a orientá-la ao ver sua destreza com as mãos. A sua aptidão fez com que a médica contatasse uma colega, com quem tinha rixa, para também ensiná-la.
Margarida conheceu o marxismo na faculdade e entrou para o Partido Comunista Brasileiro. Engajada politicamente, trabalhou seis meses em uma aldeia indígena. Tempos depois, ficou um ano na União Soviética e atuou como médica, por quatro anos, na guerra civil de Angola.
Nos anos 1970, fez residência em obstetrícia e ginecologia em São Paulo e, no trabalho, dizia sofrer preconceito por ser nordestina e pobre.
"Todo fim de semana ia para as comunidades para atendimentos e atividades do partido", afirma a sobrinha.
Após a morte trágica da filha adolescente, em 1991, a baiana mudou seu enfoque e passou a se dedicar à medicina do trabalho. Cursou também mestrado e doutorado em psicologia social e se especializou em assédio moral.
No sindicato dos químicos de São Paulo, onde atuou por anos, ouviu centenas de relatos sobre assédio. A partir das conversas, escreveu dois livros e criou núcleos de estudo em várias cidades e países.
"O Brasil acabou tendo uma importância em toda a América Latina e o reconhecimento no exterior graças à Margarida", afirma o amigo Roberto Heloani. A pesquisadora foi convidada a fundar ouvidorias em estatais e também travou inúmeras conversas com legisladores para mudar a visão judicial sobre o assédio moral.
A médica estava se tratando de um câncer no estômago desde abril de 2021 e, após uma metástase, morreu no último dia 3, aos 77 anos. Deixa familiares, amigos e incontáveis pacientes que se lembrarão de suas consultas que duravam horas.
Receba notícias da Folha
Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber
Ativar newsletters