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Usuários buscam sexo sem camisinha em aplicativo e se expõem a riscos

Preferência é 'aventura irresponsável' mesmo com profilaxia para HIV, alerta infectologista

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São Paulo

Abrindo o aplicativo, não é preciso procurar muito. "Só no pelo" e "sem capa", expressões populares para sexo sem camisinha, são inscrições comuns em bios do Grindr, plataforma LGBTQIAP+ para encontros casuais.

Lançada em 2009, a plataforma rapidamente alcançou pessoas em todos os continentes, a maioria de homens que se fazem sexo com outros homens. Só no Brasil, são mais de 50 milhões de downloads do aplicativo.

Usuários do Grindr, aplicativo de relacionamento gay, fogem de adeptos a sexo sem camisinha - Catarina Pignato

Há muita representatividade. Sigilosos, nerds, ursos, barbies, daddies e twinks lançam seus atributos em busca do alvo mais qualificado —ou somente o mais próximo.

Filtros são inexistentes e fetiches são incentivados. Há os submissos, os podólatras e os exclusivamente operantes sob efeito de entorpecentes. Mas, entre as preferências, uma começa a causar preocupação entre os usuários: a ausência do preservativo como condição para as ficadas.

É o caso do publicitário Felipe Souza, 26, de São Paulo. No Grindr, Felipe não divulga seu nome, mas utiliza um emoticon de berinjela, simulacro virtual de um pênis.

O jovem também esconde o rosto, mas não suas preferências: "ativo e só sem capa", mostra, em caixa alta, sua descrição.

Há quem tope a empreitada, e muitos, afirma o jovem.

Somente nas regiões da Santa Cecília e República, no centro de São Paulo, há mais de duas dezenas de perfis com descrições similares à de Felipe.

A aparente despreocupação do publicitário tem um motivo: ele está em Prep (Profilaxia Pré-Exposição), método preventivo à infecção por HIV, vírus causador da Aids.

De acordo com estudos, a terapia reduz em até 95% a incidência do vírus em participantes com níveis sanguíneos detectáveis do medicamento —ou seja, com adesão constante à prevenção.

Existem duas formas de utilizar o método. A contínua, com o uso de um comprimido diário sem tempo determinado, e a sob demanda, em que se deve consumir a associação até duas horas antes da relação sexual e tomar outras duas doses em até dois dias.

No entanto, há ressalvas: a Prep, que consiste na combinação dos antirretrovirais tenofovir e entricitabina, barra somente o HIV, deixando caminho ainda aberto para outras ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis), além de proteger exclusivamente quem faz o tratamento, e não o parceiro.

Para o infectologista Alvaro Costa, do Centro de Referência e Treinamento DST/Aids de São Paulo, a desinformação é um grande problema. "O desejo guia nossas relações, até nos deixando sem noção das furadas em que poderíamos nos meter", diz.

Ele explica que a Prep é um método complementar de prevenção, sendo ainda crucial o uso de camisinha.

"A pessoa aparece no aplicativo e te diz: ‘tô em Prep, tá seguro’. Beleza, ela está segura em relação ao HIV, mas e sífilis, gonorreia e afins? Quem se dispõe a ter uma relação com ela, mesmo que também tomando a profilaxia, embarca em uma aventura irresponsável", alerta Costa.

Dados do Ministério da Saúde mostram que a maior parte dos beneficiários da Prep são homens que fazem sexo com outros homens. O método alcança mais os brancos, pessoas acima dos 30 anos e as mais escolarizadas, além de ter alta taxa de desistentes.

"É muito comum ver pessoas procurando sexo sem camisinha em vários aplicativos, mas especialmente no Grindr. Eles têm um modus operandi: dizem que a camisinha incomoda e vêm com o argumento de que fazem a utilização da Prep", diz o assistente administrativo Douglas Reri, 26. Morador de Salvador, na Bahia, ele usa a plataforma com frequência.

Douglas prefere ignorar perfis do tipo. Não usuário da profilaxia, o soteropolitano afirma ter relações somente com uso de camisinha.

A queixa é a mesma do marqueteiro Gyan Carlos, 26. O jovem vive no Rio de Janeiro e utiliza meios virtuais de relacionamento, em especial o Grindr, para sexo casual.

Quando pipoca uma notificação de "tap", termo da plataforma para um botão que sinaliza interesse em alguém, Gyan já procura se há no perfil informações sobre o uso da "capa".

"Não faço sexo sem camisinha, e isso é sempre uma questão quando procuro envolvimento com alguém casualmente. Não dou abertura alguma", diz ele.

O designer paulistano Janderson Sarquis, 30, é um dos que treinaram o olhar analítico para a plataforma. "Tem gente de todo tipo, com todo fetiche e preferência. Precisamos entender o que queremos e fazer um filtro, porque aquelas pessoas estarão sempre ali, boas ou ruins para a nossa necessidade", diz Sarquis.

Ele afirma que esse processo de reconhecimento é importante para se manter longe de problemas. "Quando você descobre seu ponto, é uma boa experiência e você consegue desviar de qualquer toxicidade para se encontrar naquela dinâmica", completa.

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