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Anna Nery, grande símbolo da enfermagem brasileira, morreu há 140 anos

Sem conhecimentos técnicos, ela se forjou na Guerra do Paraguai, quando perdeu um filho e adotou seis órfãs

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São Paulo

Há 140 anos, o Brasil perdia Anna Justina Ferreira Nery, 65, vítima de pneumonia, no Rio de Janeiro.

Nome bastante comentado em 12 de maio, quando da comemoração do Dia da Enfermagem no Brasil, Anna Nery tornou-se ícone da profissão de um jeito muito particular. Isso porque a baiana nascida em Porto de Cachoeiras, em 13 de dezembro de 1814, e mãe de três filhos (Justiniano de Castro Rebêllo, Isidoro Antônio Néri e Pedro Antônio Néri), chegou à profissão numa época, o século 19, em que o cuidado de enfermos era realizado, quando não dentro de casa, por religiosas, prostitutas redimidas e viúvas.

Anna Nery, que era de família abastada, encaixava-se nesta última categoria. Tanto que, em 1844, ao perder o marido, o capitão-tenente Isidoro Antônio Néri, morto aos 43 anos em serviço na Marinha, dedicou-se aos filhos, todos ligados à carreira militar. E, quando dois deles foram para a Guerra do Paraguai (1864-1870), ela deixou tudo para acompanhá-los.

Fachada da casa de Anna Nery, na rua da Matriz, nº 7, em Porto de Cachoeiras, na Bahia - Manuela Vila Nova - 1995

Primeiro, como não tinha conhecimento técnico de enfermagem, fez imersão no Rio Grande do Sul, onde aprendeu técnicas de cuidados.

Depois, foi enviada ao front de batalha e aí construiu sua reputação, que lhe rendeu o título de Mãe dos Brasileiros.

Foto de Anna Nery, com cenário da guerra, em pintura a óleo de Victor Meireles (1870) - Victor Meireles

Lá, além dos conhecimentos de gestão que tinha adquirido por formação, conseguiu criar protocolos de ação dentro do hospital de campanha.

“Primeiro, ela ficou responsável pela lavanderia do local. Então criou todo um conceito de manter limpas roupas, instrumentos de trabalho e ambiente de trabalho. Além de gerir essa higienização, inclusive das mãos, como agora, ela se importava com as pessoas e passou também a cuidar de gente, trocando curativos e se entregando a atividades da enfermagem”, afirma Manuela Vila Nova, vice-diretora da Escola de Enfermagem Anna Nery, na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Manuela escreveu sua tese de mestrado sobre a enfermeira, trabalho que a levou a visitar o local de nascimento da figura histórica e a pesquisar curiosidades sobre a vida dela.

Constatou que, além da forte personalidade, Anna Nery obteve aval para estar na guerra do presidente da província da Bahia, Manuel Pinto de Souza Dantas, porque as autoridades da época detectavam no gesto de uma dama da classe alta um exemplo para levar outras pessoas a se alistar para a guerra —já que muitos foram contra a vontade. “O presidente da província, na época, até publicou a carta de pedido dela e a autorizou rapidamente”, afirma.

Magali, da Turma da Mônica, vira a britânica Florence Nightingale para homenagear enfermeiros - Mauricio de Sousa Produções

Ela ainda aponta uma diferença básica entre a britânica Florence Nightingale (1820-1910) e Anna Nery, consideradas pioneiras na enfermagem. “Florence tinha conhecimentos matemáticos e de física e ditava suas condutas com base nisso. Já Anna Nery teve seu foco na atividade, ao treinar no Rio Grande do Sul e gerenciar um hospital na guerra.”

Mônica virou Ana Néri para homenagear enfermeiros - Mauricio de Sousa Produções

Ao atuar na Guerra da Crimeia (1854-1856), Florence tornou-se a Dama da Lâmpada. Anna Nery, que esteve na do Paraguai, passou a ser conhecida como a Mãe dos Brasileiros.

A guerra a marcou profundamente. Primeiro, por ter assistido a muitos feridos. Depois, mais doloroso, por amargar a perda de um filho (Justiniano) e de um sobrinho —dos 140 mil brasileiros que foram à guerra, morreram cerca de 50 mil. Por fim, por ter adotado e levado para casa seis órfãs de soldados mortos.

Anna Nery posa com as seis órfãs que adotou na Guerra do Paraguai - Centro de Documentação da Escola de Enfermagem Anna Nery-EEAN/UFRJ

Seus feitos renderam homenagens e a tornaram madrinha da enfermagem no Brasil. Em uma delas, em 1919, da Liga das Sociedades da Cruz Vermelha, em Paris, foi reconhecida como pioneira da enfermagem e precursora da Cruz Vermelha no país.

Apesar de sua história não ser tão conhecida como merecia, deixou também legado de caridade após sua morte, em 20 de maio de 1880. Em março de 1926, o governo federal deu o nome dela à Escola de Enfermeiras do Departamento Nacional de Saúde.

Hoje Escola de Enfermagem Anna Nery pertence à Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nesse local, mais de 2.000 voluntários trabalham diariamente, em meio à pandemia do coronavírus, para produzir máscaras e equipamentos de proteção individual para entregar a hospitais onde profissionais da saúde cuidam de pacientes com Covid-19.

Segundo Manuela, o exemplo de Anna Nery, que se apresentou voluntariamente para atuar num ambiente suscetível a muitas doenças, hoje motiva as enfermeiras, que têm sido tão demandadas contra a Covid-19 como numa guerra.

Erramos: o texto foi alterado

Anna Nery morreu há 140 anos, e não há 120 anos. O texto foi corrigido.

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