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'Cadeia, fome e frio me tornaram bicho', diz idosa que viveu entre rua e cárcere

Formação, emprego e terapia oferecidos pela associação Passarela Alternativa restauraram dignidade de egressa aos 64 anos

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São Paulo

É como "um bicho do mato" que Silvia Helena, 64, se via há pouco mais de um ano. A violência sexual sofrida na infância, seguida da gravidez, foi só o começo.

Foi expulsa de casa, morou na rua, teve a filha tomada dos braços. Passou fome e frio até "se envolver com coisa errada" e ver os anos se passarem atrás das grades.

Já idosa, encontrou a Passarela Alternativa, associação que oferece formação, renda e apoio psicológico a mulheres presas e egressas. Aprendeu a costurar, foi contratada e deixou de se ver como bicho.

Em depoimento à Folha, ela relembra, entre lágrimas, sua trajetória e como emprego, terapia, carinho e um lar restauraram sua dignidade.

Silvia Helena enfrentou vida na rua e no cárcere até encontrar dignidade e renda na Passarela Alternativa - Arquivo pessoal

"Desde criança durmo na rua, passei por muita coisa sozinha. Aos 11 anos, fui vítima de estupro. Fiquei grávida. Não tive amparo da minha família, que me colocou pra fora. Uma senhora viu a situação e me acolheu em sua casa, comprou enxoval para mim e para a bebê.

Quando ela nasceu, minha irmã de criação apareceu e pediu que a senhora me devolvesse porque eu era menor de idade. Disse que chamaria a polícia. Eu era uma criança, sabe, estava feliz de voltar para casa. Mas não demorou um mês e me expulsaram de novo, ficaram só com a menina. Fiquei desesperada.

Tenho 64 anos. Vivi muito tempo na rua. Passei fome e frio. Comecei a fazer coisa errada e, com uns 30 anos, fui presa. Foram idas e vindas, uma delas injusta porque eu era usuária, não traficante, e peguei cinco anos. Aí virei esse bicho do mato.

Quando saí, tomei muita porta na cara. Tentei limpar banheiro, passar roupa, mas falavam palavras macias no meu ouvido e nunca chamavam. Cheguei a trabalhar um mês por R$ 150.

Foi essa aí a vida que eu conheci. Estava desanimada. Há um ano e meio, ligaram do Caef (Centro de Atenção ao Egresso e Família) chamando para um curso de costura.

Cheguei como bicho, não confiava em ninguém. Parecia que todos queriam caçoar de mim, me julgar, era um turbilhão na cabeça.

Elas me estenderam a mão. Fui tratada com carinho. Dormi uns tempos em um colchão inflável nesta sala e largaram isso aqui tudo na minha mão, confiaram sem me conhecer.

Aprendi a costurar, mas não estou craque porque ainda tenho problema nas vistas. Fui contratada, me ajudaram com um lugar para morar e a psicóloga trabalhou minha cabeça. Foi por isso que mudei.

Ecobag confeccionada por Silvia Helena, egressa contratada pela associação Passarela Alternativa - Divulgação

Estava calejada de levar bordoada. Não tenho mais idade para estar na rua. Agora posso me sustentar sem precisar fazer nada errado, sem passar fome, sem receber humilhação.

Se eu tivesse tido essa oportunidade lá atrás, seria tudo diferente."

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