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Descrição de chapéu

Vania Toledo esquadrinha o corpo masculino como paisagem dramática

Série de 13 fotografias exposta em São Paulo mostra lado quase desconhecido do trabalho da artista

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O caos sempre rondou as fotografias de Vania Toledo. A artista que fez do retrato da noite suada das boates o ponto central de sua obra se ancorava no descontrole da pista de dança, no flash estourado refletido no espelho e nos vestidos manchados por drinques derramados no calor da hora como alicerces febris de cada enquadramento.

Mas isso não acontece diante de um homem nu. Na enxuta série de 13 fotografias agora na galeria MaPa, em São Paulo, Toledo mostra um lado quase desconhecido de seu trabalho. Nessas imagens de garotos pelados, impera um rigor áspero, quase absoluto.

Quase, porque o acaso ainda vaza pelas frestas. Desde a década de 1970, a artista fotografa o corpo masculino, mas não chegou aonde queria. Foi censurada, ela diz, mesmo tendo construído mais tarde um ensaio hoje cult. Em "Homens", de 1980, seus amigos —alguns famosos, como Caetano Veloso e Ney Matogrosso— tiraram a roupa diante da lente de sua Nikon.

Naqueles registros um tanto cândidos, Toledo enfrentava a irregularidade problemática da anatomia masculina para quem busca algo apolíneo. Homens de verdade, ela parece descobrir diante deles, não são estátuas gregas ou romanas —o sexo muito mais frágil do que sedutor, menos simétrico do que o desejável, pelos indomáveis e outros acidentes geográficos do corpo.

Não que isso torne pouco magnético um dos melhores retratos que fez então, de um Ney Matogrosso pelado na banheira, o fio de um abajur atravessando a cena e um olhar de fera sob os holofotes do palco a desafiar a fotógrafa.

Banheiros bagunçados, quartos escuros com televisores virando farol baixo na penumbra também emolduravam os homens e rapazes ali —meninos sendo meninos diante do olhar desbravador de uma mulher fotógrafa.

Talvez por isso o espanto diante da série da década seguinte que vem à tona agora. O cartão de visitas desse trabalho pensado como um calendário e nunca publicado é a imagem do mamilo de um rapaz, uma ilha escura na alvura da pele que se estende até os limites do enquadramento.

Toledo já disse que mulheres têm curvas e homens têm volumes. E lembrou as dramáticas paisagens de Ansel Adams, que desbravou o faroeste americano em retratos de vales, montes e abismos rochosos, ao falar dessa série.

Surgem, de fato, homens com nádegas que são montes roliços, de mamilos como ilhas virgens e barrigas trincadas como lavouras em flor.

Na mais bem construída dessas imagens, é a linha entre luz e sombra que encontra seu ponto de fuga na virilha do modelo que orienta toda a sua arquitetura de carne e osso, transformando em duna de um deserto masculino o que seria o mármore como homem que Robert Mapplethorpe, Alair Gomes e outros homens que fotografavam homens tentaram esculpir em seus delírios de celuloide.

Toledo, no entanto, encontra outra rota. Não é um olhar de desejo nem de ressaca que ela lança sobre seus modelos. Ali eles são formas plácidas, pele que não é pedra diante de um registro que escancara o seu lado mais belo e frágil.


Vania Toledo

MaPa, r. Costa, 31, tel. (11) 2337-3770. Seg. a sex.: 10h às 18h30. Até 14/6. Grátis

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