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Filmes

Obras de Zózimo Bulbul e Fernando Coni Campos veem os cinemas negros

Sessão Indeterminações, no Instituto Moreira Salles, exibe 'Uma Nega Chamada Tereza', com Jorge Ben Jor, e 'Pequena África'

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Andrea Ormond

Crítica e pesquisadora de cinema

São Paulo

Zózimo Bulbul e Fernando Coni Campos estarão no Instituto Moreira Salles, neste mês de agosto. In memoriam, nos filmes "Pequena África" (2002), de Bulbul, e "Uma Nega Chamada Tereza" (1973), de Coni Campos.

A sessão acontece no IMS Paulista, no próximo domingo (25), e tem curadoria de Gabriel Araújo, jornalista da Folha, e de Lorenna Rocha, ambos cofundadores da plataforma online Indeterminações, dedicada à crítica, pesquisa e exibição dos cinemas negros brasileiros.

O ator e diretor Zózimo Bulbul - Folhapress

Indeterminações é nome acertado, assim como o plural colocado nos cinemas negros. Existem diversidades que deixam a vida complexa.

A complexidade foi criada ao longo do cinema brasileiro, que é diverso por si só. Pensem em Cajado Filho —verdadeiro cérebro de "O Homem do Sputnik", de 1959— e em Odilon Lopez— diretor da pornochanchada "Um É Pouco, Dois É Bom", de 1970.

O mesmo pode ser dito de outra dupla improvável: Adélia Sampaio –diretora de "Amor Maldito", de 1984, sobre um casal de lésbicas– e Waldir Onofre –nascido no neorrealismo de Nelson Pereira dos Santos, mas que desaguou no carnaval de "As Aventuras Amorosas de um Padeiro", de 1975.

Todos negros. Mortos e vivos –dos citados, apenas Sampaio continua entre nós. Amores, terrores, Brasis dentro de Brasis, como na "Pequena África", de Zózimo Bulbul. Também ele negro e um dos nomes-chave da resistência cultural.

"Pequena África" tem 14 minutos, mas parece um milênio que passa em segundos. Bulbul segue a linha do cinema-poema, em que o som e a montagem são fundamentais. Vejam "Alma no Olho" (1973), dirigido por ele 30 anos antes. Mistura-se o jazz de John Coltrane com Zózimo acorrentado, em posição fetal, em posição de rei. Nu, absoluto.

A personagem de Bulbul em "Alma no Olho" poderia ser uma das torturadas no Cais do Valongo. O local é conhecido pelas telas de Jean-Baptiste Debret. Por ali chegavam escravizados ao Brasil e integra um sítio arqueológico, chamado Pequena África, no Rio de Janeiro.

O filme de Bulbul conta o trágico e o afetivo pela boca de atores e entrevistados. Surgem detalhes como as festas com crianças, doces e caruru. Chega-se a sentir o cheiro do quiabo, do dendê, da casa da Tia Ciata, do Cemitério dos Pretos Novos, das avenidas com carros do século 21. É um fluxo de imagens com um fio de roteiro, em que aparece inclusive Waldir Onofre, já idoso, como espécie de alter ego do diretor.

Enquanto isso, o raro "Uma Nega Chamada Tereza" é distante da melancolia doce de "Pequena África". Dirigido por Fernando Coni Campos, com argumento de Arnaud Rodrigues, não disfarça intenções ufanistas, em que música e cultura serviam de veículo para a ideia do "Brasil Grande" e do fugaz milagre econômico da ditadura militar.

Isso não o torna menos interessante. No desfile de tipos e modas estão a superestrela Marina Montini, o Festival Internacional da Canção, as roupas hippies-tropicais e a música de Jorge Ben (antes de ser Ben Jor).

A trama, mistura de "screwball comedy" com revista de atualidades, não importa muito. "Ninguém segura este país!", anunciam os créditos iniciais, como declaração de princípios. Daí em diante temos uma catequese mal disfarçada por plumas e paetês: o Brasil é o país inclusivo, da miscigenação amorosa, da festa constante, do progresso futurista.

Esta é uma leitura possível para "Uma Nega Chamada Tereza" e outros filmes do período, como "É Simonal!" e "O Barão Otelo no Barato dos Bilhões". Mas diretores como Fernando Coni e Miguel Borges eram inteligentes o bastante para trabalharem, nas entrelinhas, uma crítica social, ainda que sutil, pressionada pelo olhar vigilante da Censura.

Poucos anos depois, Fernando Coni Campos deixou explícita sua verve anárquica ao realizar "Ladrões de Cinema", de 1977. Produzido pela lendária Lente Filmes, de Zakhia Elias, Morris Israel e Noilton Nunes, e novamente com grande elenco de atores negros, "Ladrões de Cinema" permanece atual.

"Pequena África" e "Uma Nega Chamada Tereza" revistos, um em seguida do outro, parecem falar de lugares opostos, mas só em um olhar apressado. São aspectos do mesmo país, embora narrem versões diferentes da história, movidas por tempos e ideias distintos.

'Pequena África' e 'Uma Nega Chamada Tereza'

Avaliação:
  • Quando: Dom. (25), 18h10
  • Onde: IMS Paulista - av. Paulista, 2424, São Paulo
  • Classificação: 14 anos

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