Tributação dos super-ricos pode chegar mais cedo do que pensamos
O que antes parecia impossível agora está sendo considerado pelos ministros das Finanças do G20
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A reforma tributária corporativa global que entrou em vigor neste ano foi algo como um milagre. Menos de uma década atrás, poucos pensariam ser possível que a maioria dos países do mundo concordasse em fechar brechas na tributação corporativa, instituir um imposto mínimo global e decidir como distribuir a nova arrecadação —prevista para ser mais de US$ 200 bilhões por ano— entre si.
No entanto, aqui estamos. Algumas partes da reforma ainda precisam ser ratificadas, mas o nível mínimo está sendo amplamente implementado. E, se um milagre é possível, por que não dois?
É assim que devemos encarar os recentes movimentos de algo semelhante: um esforço multilateral para reformar o sistema falho de tributação dos super-ricos.
Em fevereiro, o economista Gabriel Zucman —um crítico dos otimizadores fiscais ricos— apresentou aos ministros das Finanças do G20 uma proposta de imposto global para bilionários, a pedido do Brasil.
O país, que atualmente preside o grupo, está ansioso para avançar para a próxima etapa da agenda tributária global, que poderia ser fechar as brechas que permitem que as pessoas mais ricas do mundo paguem muito pouco imposto.
Foi a primeira vez que o tema foi levantado em uma reunião do G20, disse Zucman a mim, mas "a maioria dos ministros que falaram em São Paulo elogiaram o Brasil por propor o debate".
Ele observou que a riqueza dos mais ricos cresceu de 7% a 8% ao ano nas últimas décadas —além da inflação— em comparação com a taxa de crescimento médio da riqueza de 2% a 3%.
Zucman propõe um imposto anual de 2% sobre a riqueza dos cerca de 3.000 bilionários do mundo. Não é exatamente um imposto sobre a riqueza, mas sim um híbrido entre um imposto sobre a riqueza e um imposto sobre a renda, baseado na ideia de que os ultrarricos acham fácil definir suas receitas fora de qualquer categoria tributável (mantendo ganhos dentro de empresas de investimento, por exemplo).
O objetivo é lidar com as complexas estruturas legais que permitem que os super-ricos minimizem a renda tributável sob regras nacionais, postulando que essas não devem resultar em menos imposto de renda do que 2% do patrimônio líquido.
Quaisquer impostos sobre renda e riqueza realmente pagos seriam deduzidos. Isso ainda deixaria os bilionários se distanciando do resto de nós.
Pode parecer algo impossível de ser realizado —incrivelmente complicado e politicamente morto a princípio.
Mas, da mesma forma, a reforma tributária corporativa global, cujos desafios técnicos foram superados e cuja política tomou rumos surpreendentes e positivos, também parecia.
Lembre-se de que o trabalho político foi feito em conjunto entre a França e os EUA liderados por Donald Trump, certamente um dos presidentes menos inclinados à multilateralidade.
Já houve expressões notáveis de apoio político. O ministro das Finanças da França endossou a ideia, para o G20 e também em nível europeu.
Ministros não apenas do Brasil, mas da África do Sul, Espanha e Alemanha escreveram a favor. E os EUA? Zucman destaca que o último orçamento de Joe Biden apresenta um imposto para bilionários "muito semelhante em espírito" à sua própria proposta.
Minhas próprias conversas me convencem de que um segundo governo Biden gostaria de reforçar suas conquistas marcantes em infraestrutura e política industrial, e esta é certamente uma maneira atraente de financiar isso.
Esse ponto é ainda mais forte na Europa. O desafio central da economia política da UE no campo financeiro é como conciliar a necessidade reconhecida de muito mais investimento em defesa, infraestrutura e indústria verde com regras fiscais nacionais rígidas e resistência a mais empréstimos comuns pelo bloco como um todo.
Um imposto sobre a riqueza coordenado e, portanto, à prova de fuga certamente será difícil de resistir, em um bloco onde o direito de se mover livremente é garantido por tratado.
Zucman e seus colaboradores estimam no Tax Evasion Report mais recente que sua proposta arrecadaria cerca de 40 bilhões de euros anualmente em toda a Europa.
Nem tudo isso está na UE, mas para comparação, esse valor cobriria quase um quarto dos gastos orçamentados do bloco para 2024. E isso é apenas dos bilionários.
Uma vez implementado, é difícil ver por que políticos financeiramente pressionados decidiriam poupar aqueles com centenas ou até dezenas de milhões.
Em retrospecto, a "transferência de lucros" que permitiu a subtributação severa de empresas multinacionais foi condenada por duas causas: a pressão extrema sobre os orçamentos públicos após a crise financeira global e a revolta popular contra corporações que não pagam sua parcela justa.
Ambas as condições estão amplamente presentes hoje em relação aos ultrarricos. Um imposto global sobre a riqueza pode chegar mais cedo do que você pensa.
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