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As políticas de migração sul-americanas na era pós-pandêmica

Em um contexto de xenofobia crescente nos países, o cenário é motivo de preocupação

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Stephanie López Villamil

Cientista política e professora da Universidade Nacional da Colômbia, doutora em Estudos Políticos e Relações Internacionais, mestra em Relações Internacionais pelo Instituto de Estudos Políticos em Estrasburgo (França) e especializada em políticas migratórias na América Latina

Latinoamérica21

O surto de Covid-19 levou ao fechamento total das fronteiras na América do Sul e, em alguns casos, à sua militarização para conter a pandemia, deixando milhares de migrantes retidos tentando retornar aos seus países de origem.

A crise sanitária é agravada por uma crise econômica cujas dimensões ainda estão sendo estimadas e que tem afetado os migrantes de maneira exponencial: despejos, perda de sustento diário, insegurança alimentar e aumento da xenofobia em alguns países.

Além disso, a crise humanitária que tem gerado um êxodo de mais de 5 milhões de pessoas da Venezuela, principalmente para Colômbia, Equador, Peru e Chile, foi acompanhada de mudanças normativas: criação de permissões temporárias, imposição de vistos e, em alguns países, propostas de reforma das leis migratórias que levaram a políticas mais restritivas.

Migrantes venezuelanos fazem caminho por área de mata para tentar entrar no território colombiano, nas proximidades da cidade de Cúcuta - Schneyder Medoza - 14.out.2020/AFP

Apesar de nas últimas duas décadas, e com o giro à esquerda na região, leis migratórias vanguardistas em termos de garantia de direitos e cidadania terem sido propostas, como as do Equador e as do Uruguai, o retrocesso nas políticas migratórias é cada vez mais latente.

Nesse contexto, o Chile e a Colômbia estão debatendo suas propostas de lei de migração.

Por um lado, no Chile, a vigência de uma lei dos estrangeiros da era Pinochet (1975), somada aos diversos fluxos migratórios das últimas duas décadas (Haiti, Colômbia, Venezuela), sugere uma mudança necessária e urgente na normativa, ainda mais quando se considera a possibilidade de um novo processo constituinte.

A sociedade civil e a academia se pronunciaram sobre o projeto, apontando, entre outras deficiências, que ele não introduz mecanismos de regularização permanente.

Por outro lado, na Colômbia, um país tradicionalmente de envio de migrantes, com 10% de sua população vivendo no exterior, e agora um país receptor com mais de 1,7 milhão de venezuelanos e mais de 500 mil colombianos retornados, a criação de uma lei de migração que reúna todas as regulamentações dispersas é mais do que necessária.

A Colômbia não pode continuar multiplicando decretos e deve avançar para uma política inclusiva e garantidora de direitos. A nova lei de migração não pode ser uma simples compilação de normas.

Além desses dois projetos, vários sobre o tema migratório foram recentemente apresentados ao Congresso peruano, entre eles o projeto de lei 5.349, de 2020. No mesmo, pretende-se a retirada do Peru do Pacto Global para uma Migração Segura, Ordenada e Regular das Nações Unidas, firmado em dezembro de 2018, e que se crie o crime de entrada irregular, criminalizando os imigrantes, contrariando as normas internacionais a esse respeito.

Agora, com essas reformas, quais cenários se apresentam a nível regional numa era pós-pandemia? Estamos diante de um cenário restritivo generalizado? Embora ainda seja cedo para responder a essas perguntas, em princípio os países sul-americanos têm dois caminhos.

O primeiro é fechar definitivamente as fronteiras, um cenário pouco viável já que se viu que, mesmo com o fechamento, a população segue em movimento através de fronteiras porosas e, algumas vezes, com a ajuda de traficantes.

O caso da migração da Venezuela é o mais evidente: no início da pandemia, a população começou a retornar, e atualmente os caminhantes já perambulam pelas estradas da Colômbia em direção ao sul.

O segundo é continuar fortalecendo alguns espaços regionais de diálogo, como o Processo de Quito, que, embora não vinculante, coloca a política migratória regional sobre a mesa.

Embora isso tenha se concentrado na denúncia da ditadura de Nicolás Maduro, os países membros não apenas enfrentam o grande desafio de regularizar a população venezuelana, mas também sua inclusão socioeconômica.

É evidente que essa população foi para a Colômbia para ficar, embora alguns governos se recusem a aceitá-la, criando medidas temporárias em vez de medidas de longo prazo.

Mas nem tudo é preto e branco.

Primeiro, a política de migração regional não pode se concentrar exclusivamente nos fluxos migratórios venezuelanos. Na rota Brasil-Equador-Colômbia há milhares de migrantes em trânsito que necessitam de proteção internacional. O que os governos estão fazendo a esse respeito? Até o momento, parecem ser invisíveis.

Segundo, a possível reabertura da fronteira da Colômbia com a Venezuela no próximo mês trará mais migração para a região. Há a previsão de que levará mais milhares de migrantes a deixar a Venezuela.

Dada essa situação, que possibilidades os governos da região lhes darão de se regularizarem permanentemente? Em um contexto de xenofobia crescente, onde metade dos mais de 5 milhões de pessoas que migraram carece da documentação necessária para uma estadia regular nesses países, o cenário pós-pandêmico é motivo de preocupação.

Em tempos de crise (humanitária ou de saúde), parece que as políticas migratórias mais restritivas são a solução, e isso pode ser visto em algumas das medidas adotadas para conter os fluxos migratórios na região.

Agora parece que os países sul-americanos deixaram para trás todos os vestígios de avançar para uma cidadania sul-americana, como foi proposto em algum momento na extinta Unasul (União de Nações Sul-Americanas). Algumas respostas governamentais parecem não corresponder a essa visão de livre mobilidade, uma vez promovida nos espaços de integração regional.

A ideia de uma cidadania sul-americana ainda é utópica. Por enquanto, os governos sul-americanos não terão outra escolha senão continuar enfrentando a migração intrarregional em meio a uma crise econômica e sanitária.

A pergunta é: como? Esperamos que seja com respostas acolhedoras que apelem à solidariedade e à hospitalidade, mas acima de tudo que garantam os direitos dos migrantes e suas famílias.

www.latinoamerica21.com, um projeto plural que dissemina diferentes visões da América Latina

Tradução de Maria Isabel Santos Lima

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