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Coligação ampla no governo italiano abre espaço para direita radical, diz cientista político

Segundo Daniele Albertazzi, especialista em populismo da Universidade de Birmingham, status de única força da oposição dará visibilidade à sigla Irmãos de Itália

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Bruxelas

A ampla coalizão formada em torno do novo primeiro-ministro italiano, Mario Draghi, pode favorecer o crescimento do partido de direita radical Irmãos da Itália, afirma o cientista político Daniele Albertazzi, professor da Escola de Governo da Universidade de Birmingham, no Reino Unido.

Draghi se tornou nesta sexta (12) chefe do governo italiano, após reunir sob sua chefia partidos de todo o espectro político. Na manhã deste sábado (13) ele fez o juramento e tomou posse oficialmente no cargo.

Com a adesão de duas das três principais siglas de direita italianas —a Liga, liderada pelo populista Matteo Salvini, e Força Itália, do ex-premiê Silvio Berlusconi—, o Irmãos da Itália se tornou a única força de oposição no país.

Beneficiada da pela lei italiana —que exige representação proporcional de vozes na mídia—, a líder oposicionista Giorgia Meloni e outras figuras do seu partido ganharão enorme espaço em debates na TV e nas rádios italianas, diz Albertazzi, que é especialista em populismo e nacionalismo.

Esse é o motivo pelo qual Salvini se opunha inicialmente a participar do novo governo, segundo o cientista político: “Ele sabe que corre um grande risco de ver o Irmãos de Itália superar a Liga e exigir a cabeça de chapa da direita nas próximas eleições”. O líder populista, no entanto, precisou ceder aos caciques do norte Italiano, principalmente da Lombardia e do Veneto, de onde vem sua sustentação política.

De acordo com Albertazzi, não deveria ser surpresa a união de uma agremiação vista como adversária da União Europeia a um premiê totalmente identificado com o projeto europeu. “A questão europeia não tem a menor importância nos manifestos e na política da Liga. Seus eurodeputados votaram pelo Tratado de Lisboa [que reformou a União Europeia em 2007], e a única ressalva que fizeram à Constituição foi a de que deveria haver menção à fé cristã, o que está muito longe de ser uma atuação eurocética.”

A ampla coalizão formada por Draghi reflete de fato o interesse dos políticos de influenciar a divisão dos fundos bilionários de recuperação pós-pandemia —até 209 bilhões de euros (R$ 1,3 trilhão) devem começar a fluir a partir do próximo semestre. “O gabinete de Draghi é totalmente dominado pelo norte do país e, a não ser que o governo imploda antes em uma guerra civil, a prioridade de investimentos nessa região pode permitir a Salvini manter-se à frente da direita”, diz Albertazzi.

O professor de Birmingham nota que a escolha de um premiê de fora da política em momentos de crise não é novidade na Itália. Aconteceu em 1993, com Carlo Azeglio Ciampi, em 1995, com Lamberto Dini, e em 2011, com Mario Monti, e entre outras causas, procura acalmar os credores (a Itália tem uma dívida pública de 159% do PIB).

Draghi se destacou de seus antecessores “tecnocratas” ao nomear um gabinete majoritariamente indicado pelos membros da coalizão, numa estratégia para “forçar os partidos a assumirem responsabilidades”, afirma Albertazzi.

O que surpreendeu o cientista político, porém, foi a concessão aos “suspeitos de sempre”. “Ele nomeou figuras controversas que estão no poder há anos, em vez de forçar os partidos a indicarem novos nomes, mais mulheres”, opina.

Embora considere inevitáveis fortes disputas internas no novo governo —“por mais dinheiro que venha, não dará para a prioridade de todos”—, o professor lembra que, a partir de julho, há uma blindagem de seis meses por causa das eleições presidenciais, o que manteria a coligação unida “à força”.

No melhor cenário, Draghi pode comandar uma retomada vigorosa da economia e se tornar presidente da Itália no futuro.

No pior, “e, infelizmente, o mais provável, dado o histórico da política italiana”, o milagre que todos esperam de “Super Mario” (como foi apelidado o novo premiê) não acontece: “Todos se jogam em cima do prato para garantir uma linguiça para alimentar seu eleitorado, e o dinheiro do fundo acaba mal usado, em interesses setoriais em vez de em um plano nacional”.

Em qualquer caso, Albertazzi vê riscos também na ideia de que é preciso um tecnocrata para salvar o país, que mostra o quão baixo desceu a credibilidade dos políticos. “No passado, isso fez crescer o Movimento 5 Estrelas [populista antissistema], e sempre há outros à espera para aproveitar essa oportunidade”, aponta o cientista político.

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