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Nicarágua decide expulsar embaixador brasileiro após atritos entre Lula e Ortega

Diplomata não compareceu a evento em data comemorativa e irritou regime; Itamaraty alerta nicaraguenses para consequências

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Brasília

A ditadura da Nicarágua decidiu expulsar do país o embaixador do Brasil em Manágua, Breno de Souza da Costa, em retaliação ao congelamento das relações entre os dois governos desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tentou interceder pela liberação de um bispo católico perseguido pelo regime.

O distanciamento entre Lula e o ditador Daniel Ortega aumentou após o petista tentar intermediar a soltura do bispo Rolando José Álvarez, que ficou detido por mais de 500 dias e acabou expulso do país centro-americano em janeiro. O ditador nicaraguense ignorou o presidente brasileiro e nem sequer respondeu a um pedido de telefonema para tratar do assunto.

O ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, em Caracas, capital da Venezuela - Leonardo Fernandez Viloria - 24.abr.24/Reuters

De acordo com um alto funcionário do Itamaraty, que falou sob condição de anonimato, o aviso do regime Ortega de que Costa deveria deixar o país foi dado há cerca de duas semanas. O ministério das Relações Exteriores fez gestões junto à Nicarágua para esclarecer a decisão e, segundo o funcionário, aguarda uma manifestação definitiva de Manágua.

A chancelaria brasileira avisou as autoridades locais de que haverá consequências caso a ordem de expulsão seja confirmada. Até esta quarta-feira (7), o embaixador Breno de Souza da Costa continuava em Manágua.

A notícia de que Costa recebeu ordem das autoridades para deixar a Nicarágua foi publicada nesta quarta pelo site Divergentes, especializado em temas locais e de outros países da América Central. A Folha confirmou a informação.

O site também disse que o regime Ortega deu 15 dias para que Costa deixasse a Nicarágua. Sobre esse ponto, um interlocutor no governo Lula disse que o comunicado da ditadura sobre a expulsão do brasileiro não trouxe um prazo para isso, razão pela qual o Itamaraty viu espaço para tentar dialogar.

O diplomata foi sabatinado pelo Senado em dezembro de 2021. Ele iniciou sua missão na Nicarágua no ano seguinte.

O funcionário do Itamaraty a par do assunto disse que o ato que desencadeou a decisão de expulsão foi o embaixador brasileiro não ter participado de um ato em celebração dos 45 anos da Revolução Sandinista. A ausência teria irritado as autoridades locais.

O diplomata brasileiro agiu sob orientação do Itamaraty. Diante do congelamento das relações, ele tinha instruções de Brasília a não comparecer em determinados atos políticos do regime. O PT é aliado histórico de Ortega, líder da Revolução Sandinista e no poder de forma ininterrupta desde 2007.

A ditadura nicaraguense chegou a anunciar a libertação de Álvarez em meados de 2023, mas o religioso não aceitou a condição, imposta por Ortega, de que deixasse a Nicarágua. O regime voltou a prendê-lo, e Álvarez só foi solto no início deste ano, com o compromisso de ir para o Vaticano —na prática, uma expulsão.

O pedido para que Lula tentasse interceder pelo religioso foi feito diretamente pelo papa Francisco, durante encontro dos dois no Vaticano em junho de 2023. Lula vinha relatando sua frustração com a inflexibilidade de Ortega a aliados.

Ele fez o relato de que Ortega não quis atender seu telefonema ao cardeal Pietro Parolin, principal emissário do papa, durante visita a Brasília em abril deste ano.

O presidente brasileiro tornou o descontentamento com o líder sandinista público em entrevista a correspondentes estrangeiros, em julho, também em Brasília.

"O dado concreto é que o Daniel Ortega não atendeu o telefonema e não quis falar comigo. Então, nunca mais eu falei com ele, nunca mais. Ou seja, eu acho que é uma bobagem", disse Lula na ocasião.

"Quer dizer, o cara que fez uma revolução como o Daniel Ortega fez. Uma revolução. Eu participei do primeiro aniversário daquela revolução. Era um bando de meninas e meninas armados com metralhadoras que derrotaram o Somoza. Mas você faz uma revolução para quê? Faz uma revolução por que você quer o poder ou você faz uma revolução por que você quer melhorar a vida do povo do seu país? É isso que está em jogo".

O caso envolvendo o bispo católico consolidou o congelamento das relações entre Lula e Ortega. Mas mesmo antes essa relação vinha esfriando progressivamente. O processo foi marcado por recados, alguns deles públicos.

Em junho de 2023, por exemplo, o Brasil subscreveu uma resolução da OEA (Organização dos Estados Americanos) que pedia democracia na Nicarágua.

Em outro episódio, também em 2023, Lula fez um discurso em Brasília no Foro de São Paulo, aliança de partidos de esquerda da América Latina. A fala do presidente foi repleta de recados a Ortega, segundo auxiliares palacianos que participaram do evento.

"Aliado não é aquele que está toda hora agradando e alisando. Muitas vezes o verdadeiro amigo é aquele que diz que você está errado", afirmou na ocasião.

A relação no segundo mandato de Lula (2007-2010) era diferente. À época, Lula buscou estreitar as relações com a Nicarágua de Ortega. O petista fez uma viagem oficial ao país centro-americano, a primeira de um líder brasileiro em mais de cem anos de relação.

Em 2010, recebeu Ortega em Brasília, ocasião em que o chamou de amigo e companheiro durante um almoço no Palácio do Itamaraty.

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