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Peter Hakim

Retornar ao Haiti consolidaria Brasil como ator global confiável

Eventual retomada da presença brasileira pode ajudar Lula a demonstrar compromisso total com sua recém-proposta aliança global contra a fome e a desigualdade

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Peter Hakim

Presidente emérito do Inter-American Dialogue

Embora ainda precárias, as perspectivas do Haiti hoje parecem mais promissoras do que nos últimos anos. Os sete membros do recém-formado governo de transição do Haiti, representando uma ampla gama de opiniões políticas, estão encontrando alguns consensos e trabalhando juntos para enfrentar os múltiplos problemas da nação. Recrutaram um primeiro-ministro competente e ativo e começam a enfrentar sua principal tarefa, pavimentando o caminho para eleições que reconduzam a um governo democrático.

Um grupo de países —formado principalmente por EUA, Canadá e nações do Caribe e da América Central— prometeu apoio para a revitalização da economia devastada do Haiti e de suas instituições em colapso. O primeiro contingente de forças de segurança do Quênia chegou a Porto Príncipe para modernizar e reforçar a polícia nacional do país e ajudar a controlar as gangues.

Policial queniano participa de missão de apoio à polícia haitiana nas ruas de Porto Príncipe - Reuters

É tanto intrigante quanto decepcionante o fato de que o Brasil e a maioria dos outros países sul-americanos têm em grande parte ignorado o Haiti e feito pouco para ajudá-lo a sair do atoleiro. Vinte anos atrás, em 2004, foram o Brasil e o Chile que mais rapidamente se levantaram para reafirmar a autoridade governamental do Haiti após um violento golpe de Estado que derrubou o presidente Jean-Bertrand Aristide. Por mais de uma década, comandantes brasileiros de alto escalão exerceram liderança sobre as forças militares e policiais enviadas de inúmeras nações em todo o mundo. Cerca de 37 mil soldados brasileiros serviram no Haiti durante este período. O Chile enviou quase 10 mil, e diplomatas chilenos serviram duas vezes como chefes da Minustah, a missão da ONU para o país caribenho.

O desempenho militar do Brasil teve êxito em muitas frentes cruciais. Gangues foram controladas em várias localidades. Instituições-chave foram protegidas e fortalecidas, e a economia ganhou algum impulso. Embora nem sempre bem organizadas, eleições foram realizadas. As forças policiais do Haiti receberam treinamento necessário e equipamentos melhores.

Sim, durante esse período muitas coisas também deram errado. O evento mais destrutivo foi o terremoto de 2010, que matou cerca de 300 mil haitianos, destruiu grande parte de Porto Príncipe e arrasou a infraestrutura nacional. As forças de segurança internacionais sob a liderança do Brasil também causaram consideráveis danos. Soldados do Nepal trouxeram consigo um dos surtos de cólera mais violentos do mundo, infectando quase 1 milhão de haitianos (10% da população) e causando mais de 10 mil mortes. Vários confrontos entre forças internacionais e gangues resultaram em mortes de civis inocentes. Mulheres e meninas haitianas eram regularmente intimidadas, maltratadas e abusadas por soldados estrangeiros.

Corretamente ou não, as fraquezas e deficiências da intervenção externa receberam muito mais atenção no Haiti e em todo o mundo do que suas múltiplas realizações positivas. Não é surpreendente que muitos brasileiros, militares e civis, relutem em se voluntariar novamente para o Haiti. Além disso, a tensão contínua entre o governo brasileiro e segmentos importantes das Forças Armadas pode representar um obstáculo especial para o envio de tropas em uma missão de paz. Mais amplamente, as demandas políticas domésticas sobre o governo Lula podem ser um fardo grande o bastante para não retornar ao Haiti.

O Brasil não tem como ter certeza de que uma nova missão ou outras formas de assistência seriam bem-sucedidas —mas seu envolvimento no Haiti certamente aumentaria as perspectivas de progresso. Não há dúvida de que o Brasil (e o Chile também) poderia dar enorme contribuição para reviver a democracia haitiana e reconstruir sua economia. As forças de segurança dos dois países estão entre as melhores da América Latina e não estão começando do zero. Têm profundo conhecimento da realidade do Haiti.

O reengajamento brasileiro poderia muito bem ser um chamado claro para outros países latino-americanos sobre a responsabilidade da região de ajudar o Haiti. Quando chegaram, em 2004, os brasileiros foram amplamente e efusivamente recebidos. Apesar das preocupações levantadas sobre seu desempenho, há fortes razões para acreditar que seriam acolhidos calorosamente de novo. Um retorno bem preparado iluminaria a reputação do Brasil como um ator global confiável comprometido em ajudar aqueles mais necessitados. O Haiti é o lugar óbvio para o presidente Lula demonstrar o compromisso total do Brasil com sua recém-proposta aliança global contra a fome e a desigualdade.

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