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Tempo perdido

Podemos nos dar ao luxo de perder todo esse tempo?

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Simone Campos

Voltar ao lugar onde você morou a vida toda dá uma sensação estranha. O lugar, no caso, é o Rio de Janeiro.

Casei-me com um programador, carioca, contratado por uma empresa do Vale do Silício. Enrolamos ao máximo, mas fomos —em outubro de 2018, após votar para presidente. Soubemos do resultado no aeroporto, com dois gatos e oito malas.

Desde então, voltei duas vezes: a primeira para defender meu doutorado em letras na Uerj, a outra, de férias. Virei turista em minha própria cidade. Eu me hospedei em Botafogo, o bairro em que sempre morei.

Gosto porque lá você é obrigada a andar na rua, encarando a variedade de vidas e humores numa calçada estreita ao lado de ônibus resfolegantes e desviando de cantadas. Se for demais para você, distrair-se olhando rede social não é opção —seu celular pode ser subtraído, porque você deu mole.

Cristo Redentor, Baía de Guanabara e Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro - Daniel Marenco/Fohapress

Eu seria muito mais desconectada do que já sou caso não tivesse essa experiência do imprevisível desde pequena. Na minha visita mais recente, voltando do supermercado onde comprei água após passar mal com a do filtro, mais de uma vez dobrei a esquina errada. A esquina que já tinha sido a da minha casa. Não mais.

Então reparei que a calçada estava completamente esboroada, que as atendentes das lojas desertas estavam com cara de enterro e que uma grande obra imobiliária estava parada. Algo estava morrendo.

Lembrei do Botafogo dos anos 1980, da era Sarney, da debandada de cariocas para lugares onde havia emprego. Dos supermercados vendendo comida estragada, das construções embargadas na metade, do labirinto de Creta de tapumes após o calote no pagamento da obra do metrô (eu passei dez anos indo para a escola por ele).

O Rio morre e renasce; mas demora. Podemos nos dar ao luxo de perder todo esse tempo?

Simone Campos

É escritora e tradutora

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