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Da lavra de Bolsonaro

Constituição e razões pragmáticas se chocam com mineração em terras indígenas

Índios da etnia Guajajara na aldeia Jenipapo, na Terra Indigena Arariboia - Eduardo Anizelli - 24.nov.19/Folhapress

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Muito tempo, tinta e saliva ainda serão despendidos na discussão do projeto de lei enviado pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso para regulamentar a mineração em terras indígenas. O debate, no entanto, pode se mostrar ocioso, uma vez que o texto se choca com dispositivos da Constituição.

Se a regulação da atividade minerária em tais áreas não se efetivou ainda, foi por boas razões. Em especial na modalidade predatória do garimpo, ela tem alto potencial disruptivo para os recursos ambientais necessários ao bem-estar e à reprodução física e cultural dos povos indígenas —que a Carta de 1988, no artigo 231, manda proteger.

Verdade que o texto constitucional não veda a mineração nessas terras, ainda que lhe dê caráter excepcional ao exigir que haja autorização do Congresso, oitiva das comunidades afetadas e sua participação nos resultados da lavra. Mas, em sua ofensiva, o Planalto avança o sinal vermelho em pelo menos dois entroncamentos.

O primeiro diz respeito à determinação de ouvir os indígenas. O projeto presidencial lhes nega o direito de veto, no caso de exploração mineral por empresas comerciais, aproveitamento hidrelétrico e extração de hidrocarbonetos.

Além de destoar da intenção do constituinte, a provisão conflita com o consentimento livre e informado previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil.

No segundo atentado constitucional, o projeto só reconhece aos índios, como se fora grande concessão, o direito de vetar exploração por garimpeiros. Evidencia-se aqui o intuito de ludibriar, pois a mesma Carta veda essa atividade em terras indígenas (artigos 231 e 174).

Em bom português, Bolsonaro lhes concede a prerrogativa de rejeitar o que já está proibido fazer.

Não são só a letra e o espírito da Lei Maior que se levantam contra o projeto mas também razões pragmáticas. Pela lógica, grandes empresas dificilmente vão se animar a investir em projetos de exploração contra a vontade de seus ocupantes, por temor de danos à imagem e da reação dos afetados.

Parece plausível que a proposta acabe esquecida no Congresso, como tantas outras iniciativas do atual governo. Ainda assim, resta o risco de que garimpeiros ilegais a tomem como senha para intensificar suas investidas, devastadoras para a saúde e a integridade sociocultural das aldeias —um bem maior que a Constituição consagra.

editoriais@grupofolha.com.br

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