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Lucas Carlos Lima

Os Brics e o direito internacional

Qual é a estratégia de política externa jurídica dos países do bloco?

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Lucas Carlos Lima

Professor de direito internacional na UFMG, é diretor do Centro de Estudos para a Ásia Oriental da UFMG

Desde sua criação, em 2009, tem havido alguma incerteza sobre os reais objetivos e metas dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), especialmente após sua expansão, em 2023, com Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã (a Argentina decidiu não entrar no bloco). Já foi sugerido que o bloco seria uma alternativa à governança global ou uma proposta de remodelagem da ordem internacional pelo Sul Global.

Em 10 de junho de 2024, uma declaração conjunta dos ministros de Relações Exteriores dos Brics, realizada em Nijni Novgorod, na Rússia, oferece indicações mais substanciais do que almeja a governança prevista por esse grupo de países.

Ministros das Relações Exteriores dos Brics em encontro em Nijni Novgorod,na Rússia - Reuters

A leitura do documento conduz à percepção de que o acusado revisionismo dos Brics está menos interessado em substituir a ordem atual do que em articular uma interpretação própria de uma governança ideal baseada em regras. Os 54 pontos cuidadosamente elaborados abordam questões que vão desde segurança internacional, mudanças climáticas e direitos humanos aos conflitos no Oriente Médio e na Ucrânia.

No entanto, parece haver um fio condutor na linguagem da declaração conjunta: um persistente excepcionalismo em relação aos países em desenvolvimento e a necessidade de levar em conta as desigualdades estruturais da ordem global. Essa ideia é exemplarmente resumida na proposta de um "sistema internacional e multilateral mais ágil, eficaz, eficiente, responsivo, representativo, legítimo, democrático e responsável".

Do ponto de vista do direito internacional, a declaração conjunta pode ser lida como uma oportunidade de avançar pelo menos dois grandes conjuntos de ideias.

Em primeiro lugar, reforçar a ambição de maior participação na governança global e em suas instituições, exigindo uma aplicação excepcional de certas regras em relação a determinadas áreas —como comércio e meio ambiente. Aqui é interessante notar uma aderência à linguagem do direito internacional e às suas instituições.

Os Brics propõem a reformulação do Conselho de Segurança, a revitalização da Organização Mundial do Comércio e o fortalecimento dos fóruns climáticos, privilegiando o princípio de responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Não por acaso, "[o]s ministros reiteraram seu compromisso com o multilateralismo e com a defesa do direito internacional".

A referência ao direito internacional é uma constante no documento. Se o direito internacional foi, no passado, uma construção imperial para "civilizar as nações", há uma apropriação da linguagem jurídica internacional pelos Brics para indicar as inconsistências ocidentais com a ordem baseada em regras.


Esta é a segunda ambição do documento: formular uma crítica direcionada a determinadas políticas ocidentais consideradas pelos Brics como particularmente incompatíveis com seus interesses, rotulando-as como legalmente inaceitáveis. Há uma forte crítica ao uso de sanções unilaterais pelo Ocidente, bem como críticas às ações de Israel. Por óbvio, parece haver um duplo padrão de crítica quando se trata das ações da Rússia na Ucrânia —a prova disso é que apenas as ações em curso na Corte Internacional de Justiça em relação ao primeiro conflito são mencionadas.


Se o grupo dos Brics veio para ficar —e provavelmente veio—, a declaração conjunta de ministros deve ser percebida como uma importante lista de prioridades e estratégias jurídicas do bloco, com efeitos internos e externos. Sua capacidade de se manter coerente com suas metas e objetivos é um teste para sua legitimidade e também para sua capacidade de recrutar outros membros do Sul Global.

Do ponto de vista político e jurídico, a declaração conjunta não é um documento pouco ambicioso —assim como o projeto dos Brics também não é.

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