Os protestos contra a contestada reeleição do ditador Nicolás Maduro, que tomaram as ruas de diversas cidades da Venezuela a partir de segunda-feira (29), deixaram ao menos 11 pessoas mortas e mais de 700 detidas.
O balanço de óbitos mais recente foi divulgado pela ONG Foro Penal, especializada na defesa de presos políticos. O diretor da organização, Alfredo Romero, afirmou em entrevista coletiva na tarde desta terça-feira (30) que dois dos mortos eram menores de idade.
Um deles, morto em um protesto em Zulia, no noroeste do país, completara 15 anos na véspera do protesto. O outro, morto em Yaracuy, no centro-oeste, tinha 16 anos.
Além deles, cinco pessoas foram mortas na capital, Caracas. Romero enfatizou que a cifra é alarmante dado que elas contabilizavam apenas os óbitos registrados na segunda, dia imediatamente posterior à divulgação dos resultados da votação. As outras mortes ocorreram em outros estados do país.
Do lado do regime, o ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino López, disse que ao menos um policial foi morto e que mais de 30 ficaram feridos em confrontos com manifestantes.
Houve ainda centenas de prisões, de acordo com a ditadura. Nesta terça, o procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, anunciou que 749 pessoas foram detidas e alertou que o número pode crescer nas próximas horas. Em comunicado à imprensa, ele afirmou ainda que o Ministério Público avaliava acusar os presos de resistirem às autoridades e de terrorismo.
O anúncio foi feito um dia após Saab afirmar que convocar atos para contestar os resultados oficiais poderia render prisão. "Vimos com preocupação a falta de reconhecimento do resultado por um setor radical com um longo histórico de chamados à violência", afirmou ele na segunda.
Saab tem publicado nas redes sociais vídeos de confrontos nas ruas e imagens de jovens detidos. O procurador-geral foi nomeado após sua antecessora ser derrubada em 2017 pela Assembleia Nacional Constituinte —órgão criado para, na prática, anular os poderes da Assembleia Nacional, que tinha maioria opositora desde 2016.
O alto-comissário da ONU (Organização das Nações Unidas) para os Direitos Humanos, Volker Türk, disse em comunicado publicado nesta terça estar "extremamente preocupado" com as tensões na Venezuela. Entre os pontos que ele listou no texto estavam evidências de uso desproporcional da força por parte da polícia, com relatos de vários manifestantes sendo feridos por armas de fogo, e acusações de interferência na contagem de votos.
"A Venezuela está enfrentando um momento crítico", afirmou Türk na nota. "As pessoas responsáveis por violações dos direitos humanos devem prestar contas."
Esse pode ser o início de mais uma longa jornada de manifestações no país, que vive múltiplas crises há mais de uma década. Liderados por María Corina Machado, os críticos ao regime denunciam uma fraude no pleito de domingo (28) e afirmam que a votação deu vitória para Edmundo González, candidato que entrou no lugar da líder opositora, inabilitada politicamente.
A principal coalizão opositora diz ainda possuir atas eleitorais suficientes para mostrar que seu candidato é o vencedor. Também há levantamentos diferentes, feitos com base em amostragens, que também apontam vitória do ex-diplomata González.
Entre a segunda e a terça, o Observatório Venezuelano de Conflitos Sociais documentou mais de 300 manifestações contra o resultado oficial em todos os estados do país, sobretudo em zonas de baixa renda.
Várias regiões da capital foram palco de atos, e alguns manifestantes caminharam a pé das montanhas que cercam Caracas até o palácio presidencial, percorrendo uma distância de quilômetros, para protestar.
A Guarda Nacional militarizada dispersou muitas dessas aglomerações com gás lacrimogêneo e tiros de bala de borracha. Também foram ouvidos disparos em alguns bairros, e dois manifestantes derrubaram um enorme painel publicitário com o rosto de Maduro.
No estado de Falcón, manifestantes contrários à declaração do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) derrubaram uma estátua de Hugo Chávez, antecessor de Maduro, morto em 2013.
Ainda de acordo com o Observatório Venezuelano de Conflitos Sociais, ao menos 115 do total de atos teriam sido reprimidos por civis armados até o meio-dia desta terça. Identificados como Coletivos Paramilitares, eles supostamente atuam em coordenação ou são alvos de vista grossa por parte das forças de segurança estatais.
A situação tem o potencial de escalar. Maduro, anunciado como vencedor pelo CNE com 51,2% dos votos contra 44,2% de González, afirma que os protestos fazem parte de uma tentativa de golpe de Estado "de caráter fascista e contrarrevolucionário".
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