Siga a folha

Descrição de chapéu Folha Mulher

É preciso ter procuradoras e servidoras em chefias no Ministério Público, diz subprocuradora

Luiza Cristina Fonseca Frischeisen considera que feminismo anda junto ao combate ao racismo

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

São Paulo

No ano passado, a subprocuradora-geral da República Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, 53, foi a segunda mais votada na eleição para a formação da lista tríplice para a escolha do novo procurador-geral da República.

O presidente Jair Bolsonaro, porém, quebrou a tradição, ignorou a lista e nomeou o subprocurador Augusto Aras para o cargo. Ele sucedeu Raquel Dodge, a primeira mulher a dirigir o Ministério Público, de 2016 a 2019.

Assim como Frischeisen, outras procuradoras já haviam figurado a lista tríplice para a Procuradoria-Geral da República, com chances de chefiar da instituição. A presença delas pode fazer supor que as mulheres conseguiram equilibrar as condições de acesso aos cargos da PGR, mas a realidade não é bem assim.

“Historicamente nós somos 30% [no geral]”, diz Frischeisen, coordenadora da Câmara Criminal e integrante do Conselho Superior do Ministério Público Federal. 

“Então, essa presença feminina se verifica há muito tempo. Hoje nós colocamos assim: por que nós não conseguimos avançar nos 30%? Você tem que ter membros e servidores exercendo chefias. Como na iniciativa privada, você pode ter uma base de muitas mulheres, mas qual percentual vai estar em cargos de direção? Esse é um ponto importante.”

A sub-procuradora-geral da República Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, chefe da Câmara Criminal da PGR - Pedro Ladeira /Folhapress

Como a senhora vê a presença da mulher no Ministério Público Federal? Historicamente nós somos 30%. A nossa carreira passa a ser concursada na década de 1970 e coincide com a entrada das mulheres de classe média, formadas em direito, fortemente no mercado de trabalho no Brasil. E o concurso público sempre foi uma forma de acesso. Então nós temos muitas subprocuradoras com um longo tempo de carreira.

Desde que eu entrei na carreira havia subprocuradoras mulheres. Então essa presença feminina se verifica há muito tempo. Hoje nós colocamos assim: por que nós não conseguimos avançar nos 30%? Só que hoje a gente trabalha muito a questão das chefias, das lideranças das servidoras, porque não basta você ter membros e nem servidores.

Você tem que ter membros e servidores exercendo chefias. Que, como na iniciativa privada, você pode ter uma base de muitas mulheres, mas qual percentual vai estar em cargos de direção? Esse é um ponto importante.

Há dificuldade de acesso das mulheres aos postos com poder de decisão? No Conselho Superior [do Ministério Público Federal] nós somos 10 e, neste momento, duas mulheres. Já fomos mais, no colegiado anterior éramos quatro. Mas antes era um homem corregedor e agora temos uma corregedora. Temos muitas procuradoras-chefes, eu já fui procuradora-chefe.

Então essa é uma questão que, no Ministério Público Federal, tem que ser permanente, de observação permanente. Como atrair mais mulheres, como fazer com que mais mulheres exerçam função de chefia, coordenação e liderança no sentido de ocupar esses espaços.

Hoje em dia essa discussão do feminismo está muito ligada também à questão do combate ao racismo. E todos os Ministérios Públicos hoje têm ações afirmativas, e a questão de ter cada vez mais homens e mulheres negros nos nossos quadros. Não só ter mais mulheres, mas ter mais homens e mulheres negros nos nossos quadros, tanto de servidores quanto de membros. Esse é o grande desafio daqui para frente.

Como o feminismo e a luta racial têm influenciado as carreiras do direito? Uma das coisas mais interessantes foi o novo feminismo, das mulheres jovens, que veio fortemente junto à questão do feminismo negro. Então veio essa coisa do feminismo, mas veio também o feminismo antirracista. 

E com essa conscientização de que existe um racismo no Brasil e que o racismo incide duplamente sobre as mulheres que têm que combater o racismo e ainda têm que combater o machismo e outras lutas.

Mas existem também muitas mulheres hoje altamente escolarizadas, intelectuais, mulheres negras jornalistas, cientistas políticas, mulheres que também estão na militância nesses movimentos e que têm uma consciência muito forte do feminismo junto com o [combate ao] racismo. 

A Folha mostrou que mulheres são só 1 a cada 5 desembargadores no país. Há um gargalo na segunda instância? Mostra um gargalo. É o seguinte. As magistraturas estaduais e os Ministérios Públicos estaduais são muito grandes na base, especialmente nos estados maiores, que têm maiores números de promotores e promotoras, juízes e juízas. Na ascensão para ser desembargador, existe um gargalo muito forte.

No Ministério Público Federal nós temos três níveis de carreira. Já nas carreiras estaduais são dois níveis. Então, com essa questão também da aposentadoria aos 75 anos, cria um gargalo. Acho que daqui alguns anos, quando determinados desembargadores chegarem aos 75 anos, a gente vai ter mais mulheres e procuradoras de Justiça também.

 

Mas a gente tem que incentivar também as mulheres exercerem lideranças. Não é só a questão de ser procuradoras de Justiça e desembargadoras, mas sejam, por exemplo, diretoras de foros, no caso da magistratura, no caso do Ministério Público, coordenadoras dos centros de apoio, que existem nos Ministérios Públicos estaduais, no caso do Ministério Público Federal, coordenadoras de câmara. A gente tem que estar sempre alerta e perguntando o que podemos fazer para que tenhamos mais mulheres exercendo essas funções. 

É preciso uma mudança nos homens para que mulheres tenham mais acesso a cargos de chefia, por exemplo? Não é só o querer da mulher. Quando ela também tem ali o comportamento da família eu acho que a gente tem... eu vejo isso nos meus colegas homens mais jovens. Há muitos casamentos entre colegas e juízes, delegados, das carreiras de Justiça. E eu vejo hoje os meus colegas homens das gerações mais jovens têm esse olhar de uma paternidade compartilhada, de decisões compartilhadas e de apoio às suas companheiras e esposas. Então, eu acho que isso também é importante. A transformação também dos homens, de como os homens encaram e como eles irão juntos com as carreiras das suas companheiras.

Como a senhora viu o ataque sexista do presidente Bolsonaro à repórter da Folha Patrícia Campos Mello? Acho que todas as mulheres se sentem atingidas. O que a gente deve é dizer que isso não é adequado. Isso não está certo, e as pessoas que são atingidas diretamente vão tomar as providências cabíveis. Acho que todo mundo que está num órgão de direção deve ter cuidado com as palavras. Pode-se fazer a crítica por um tipo de atitude, a um tipo de ato, mas isso não desqualifica a pessoa como um todo e não desqualifica a instituição ou o poder como um todo.

BIOGRAFIA

Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, 53

  • Formada em direito pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
  • Mestre em direito do Estado pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo)
  • Doutora em direito pela USP (Universidade de São Paulo)
  • Membro do Ministério Público Federal desde 1992
  • Subprocuradora Geral da República desde 2015
  • Coordenadora da Câmara Criminal 
  • Membro do Conselho Superior do Ministério Público Federal 
A procuradora Luiza Cristina Frischeisen - Pedro Ladeira/Folhapress

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas