Siga a folha

Descrição de chapéu Lava Jato

Gestão Doria poupa de punições empresas suspeitas em obras bilionárias em SP

Sanções não foram aplicadas por contratos do Rodoanel Norte, dos contornos da Tamoios e da linha 6-laranja do Metrô

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

São Paulo

A gestão de João Doria (PSDB) trabalha pela retomada de obras bilionárias em São Paulo sem ter aplicado sanções a empresas cujos contratos, segundo o próprio estado, foram rescindidos após terem causado prejuízos aos cofres públicos.

Parte dessas obras é alvo de investigações da Lava Jato e há suspeitas de fraudes e desvios de dinheiro público durante suas execuções.

Além de essas punições não terem sido instituídas, o estado corre o risco de ter que pagar indenização a essas companhias, por ter rompido unilateralmente parte dos contratos, segundo documentos obtidos pela Folha via Lei de Acesso à Informação.

Em alguns casos, sanções às empresas chegaram a ser anunciadas pelo governo, como multas e declarações de inidoneidade, que suspendem a possibilidade de as empresas concorrerem a licitações. A justificativa era a de que as companhias teriam abandonado os canteiros e paralisado os trabalhos.

No entanto, o valor dessas multas nem sequer foi dimensionado, e os processos administrativos acabaram suspensos.

Dois casos sem sanção envolvem a Dersa, estatal paulista de rodovias envolvida em escândalos. Não foram aplicadas punições administrativas às construtoras dos contornos da rodovia Tamoios, no litoral norte, e do trecho norte do Rodoanel, na Grande São Paulo, obras paralisadas em 2018.

Também chegou a ser aberto um processo para sanção contra as responsáveis pela construção da linha 6-laranja do Metrô, obra sob a alçada da Secretaria de Transportes Metropolitanos do estado e paralisada desde 2016. A secretaria chegou a dizer que aplicaria R$ 259 milhões de multas a empreiteiras, o que não se concretizou.

No caso da Tamoios, os contratos dos contornos foram rescindidos depois de terem sido aplicados quase R$ 2 bilhões na obra. Ela era executada pela Serveng/Civilsan e Queiroz Galvão. Na versão do governo, as obras foram desmobilizadas pelas empresas.

O estado vem realizando perícias e diz que ainda "serão instaurados os devidos processos sancionatórios às empresas", com direito ao contraditório e ampla defesa.

Já no Rodoanel Norte, a Folha teve acesso à íntegra dos processos de rescisão dos contratos, que acabaram paralisados mesmo antes que o governo definisse quais valores de multas pretendia aplicar às empreiteiras.

Esses processos agora estão sob análise de uma Câmara de Arbitragem, que avalia demandas extrajudiciais dos contratos. O governo tem evitado comentar essa disputa na arbitragem, e inclusive vetou questões relativas a esse tema em audiência pública ocorrida março, cujo tema era o lançamento de editais para a conclusão das obras.​

Só esse trecho norte do Rodoanel, iniciado em 2013, já consumiu R$ 7,3 bilhões e deve custar outros R$ 2 bilhões para ficar pronto. Inicialmente, tinha a inauguração prevista para 2016.

Nos processos de rescisão, abertos no governo Márcio França (PSB), em 2018, a Dersa alega que as empresas que eram responsáveis pelos lotes 1 (um consórcio liderado pela Mendes Júnior), 2 e 3 (OAS) desmobilizaram os canteiros das obras.

O governo decidiu, então, sancionar as empresas com multa e declaração de inidoneidade. Essa deliberação chegou a ser publicada no Diário Oficial, mas penalidades não foram aplicadas.

“Em momento oportuno será encaminhado o cálculo da multa e aplicação das penalidades contratuais e legais cabíveis, além da responsabilização do consórcio por todos os prejuízos causados ao erário”, disse em janeiro do ano passado a Gerência de Divisão da Obras da Dersa, após o consórcio da Mendes Júnior pedir para suspender as sanções.

O mesmo foi dito à OAS meses depois, em junho. “Não houve a mensuração do quantum devido e nem das devidas responsabilidades da contratada, motivo pelo qual a autorização [para que a empresa fosse punida], inicial, não produziu efeitos concretos”, informou a estatal paulista.

Em suas defesas nos processos, as empresas reagiram de forma dura contra a Dersa e disseram que o estado estava em dívida com elas, o que justificaria as paralisações.

Em uma manifestação, a OAS disse que tinha mais de R$ 100 milhões a receber e que a rescisão unilateral só iria fazer a empresa acabar cobrando, também, indenização da Dersa. A empreiteira justificou que havia desmobilizado as obras “por não suportar mais executar serviços sem remuneração”.

“[A] OAS não inadimpliu o contrato, não incorrendo, portanto, na hipótese de inexecução contratual", disse a empresa em uma segunda manifestação, assinada pelo então diretor superintendente Renato de Barros Correia Matos. Segundo ele, a obra foi paralisada e o canteiro desmobilizado como consequência da "contumaz inadimplência, sobretudo de pagamento”.

O consórcio liderado pela Mendes Júnior também reclamou de falta de pagamento e disse que esse fator justificaria “fundamento inequívoco para suspensão imediata de todos os serviços prestados pelo consórcio”.

Atualmente, executivos de ambas as empreiteiras respondem criminalmente na Justiça por fraude a licitação e organização criminosa, que teriam encarecido a obra em R$ 480 milhões. As acusações foram feitas no âmbito da Operação Pedra no Caminho, um desdobramento da Lava Jato em São Paulo.

O caso da linha 6-laranja do Metrô também envolveu a Lava Jato. A estação, que ligará a Brasilândia (zona norte) à estação São Joaquim (centro), foi paralisada por uma concessionária formada por empreiteiras envolvidas na operação, após complicações do consórcio para obter financiamento devido às investigações.

Uma construtora espanhola irá assumir a retomada da obra, que já consumiu quase R$ 3 bilhões (entre obras civis e desapropriações) e deve custar ao menos mais mais R$ 7 bilhões, após negociar com as empresas que paralisaram a obra.

O governo chegou a iniciar um processo sancionatório, que não foi encerrado e ainda está na fase de recursos.

OUTRO LADO

Procurado por meio da assessoria da Secretaria de Logística e Transportes, o Governo de São Paulo disse que a Dersa “esclarece que os contratos foram encerrados em dezembro de 2018". "Em decorrência de tais encerramentos, foram instaurados os respectivos procedimentos arbitrais, que se encontram em andamento."

A secretaria foi questionada sobre o motivo de não ter dimensionado o valor das multas, o andamento dos processos na Câmara de Arbitragem e a suspensão dos procedimentos administrativos, mas nenhuma das questões foi respondida.

Sobre as obras dos contornos da Tamoios, a Dersa diz que a Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) foi contratada para produzir um estudo sobre a situação das obras e que as sanções serão definidas "após a conclusão das perícias que estão sendo feitas nos contratos e nos serviços executados na Nova Tamoios Contornos".

Também procurada, OAS afirmou que pede à Câmara de Arbitragem do Rodoanel Norte "o reconhecimento de que o descumprimento contratual foi da Dersa, não da OAS, e cobra valores não pagos pela Dersa e indenização pela rescisão indevida, entre outros pontos".

"Além de serviços contratuais não pagos, a Dersa deixou de remunerar a OAS por serviços adicionais que a empresa executou. Na arbitragem estes valores também são cobrados", afirma a empresa.

"A Dersa deu causa a diversos atrasos da obra e até mesmo admitiu sua responsabilidade durante o contrato", diz a empresa.

"A OAS demonstra na arbitragem que a suspensão da obra foi feita com autorização legal diante do descumprimento de obrigações contratuais da Dersa. As exigências da Dersa durante o contrato, como a de apresentação de nova garantia em um dos lotes, não tinham fundamento legal ou contratual, o que também é demonstrado na arbitragem."

A Mendes Júnior foi procurada e não se manifestou, nem a Secretaria de Transportes Metropolitanos. A reportagem não conseguiu localizar representantes da Serveng/Civilsan. A Queiroz Galvão disse que não irá comentar o assunto.

Obras sem sanções em SP

Rodoanel Norte
Início: 2013
Valor gasto até agora: R$ 7,3 bilhões
Valor a ser desembolsado: Cerca de R$ 2 bilhões
Situação atual: 87% completa, será relicitada

Contornos da Tamoios
Início:​ 2013
Valor gasto: R$ 1,8 bilhão
Valor a ser desembolsado: Ao menos R$ 1 bilhão (estimativa em 2017)
Situação atual:​ 76,4% completa, perícia analisa a situação das obras

Linha 6-laranja do Metrô
Início:​ 2015
Valor gasto: R$ 2,7 bilhões
Valor a ser desembolsado: Ao menos R$ 7 bilhões
Situação atual:​ 15% completa, deve ser transferida para construtora espanhola

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas