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Sob desconfiança, MP-RJ inicia escolha de chefe de órgão que investiga Bolsonaros

De cinco candidatos, procurador bolsonarista é único a não se comprometer com o mais votado em escolha do governador

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Rio de Janeiro

Sob um clima de desconfiança interna, os quase mil membros do Ministério Público do Rio de Janeiro definem nesta sexta-feira (11) a lista tríplice da qual sairá a escolha do governador interino, Cláudio Castro (PSC), para chefiar o órgão pelos próximos dois anos.

A principal preocupação é sobre a influência da família de Jair Bolsonaro (sem partido) sobre o governador interino na nomeação do novo procurador-geral de Justiça. Dois filhos do presidente, o senador Flávio e o vereador Carlos (ambos do Republicanos-RJ), são alvos de investigação no MP-RJ.

Dos cinco candidatos, quatro deles se comprometeram por escrito a apoiar a nomeação do mais votado na eleição interna, reivindicação histórica da categoria a fim de eliminar o componente político da escolha.

O único a não defender a prática é o procurador Marcelo Rocha Monteiro, que apoiou Bolsonaro e Flávio nas eleições de 2018.

Os procuradores Ertulei Mattos e Leila Costa e os promotores Virgílio Stavridis e Luciano Mattos, além de manifestarem esse compromisso no lançamento de suas candidaturas, tiveram que assinar um documento organizado por promotores que atuam na área de Tutela e Cidadania —setor responsável por investigar atos de gestores públicos.

“Estamos vivendo um momento grave e perigoso para a autonomia e a autoridade da nossa instituição, talvez o mais grave e mais perigoso desde a Constituição", diz o texto.

"A nossa independência diante de poderosos de plantão pode se ver sob suspeita diante dos olhos da sociedade, parecendo-nos fundamental garantir a legitimidade de quem vier ocupar tão importante cargo no próximo biênio”, completa, ao pedir a assinatura dos candidatos de apoio ao mais votado.

Governador interino, Castro não se comprometeu em manter a tradição de escolha do primeiro nome da lista —apenas uma vez, desde 1988, o governador fluminense não escolheu o vencedor da eleição interna.

"Esse debate está sendo muito antecipado. Eu só vou receber [a lista tríplice] das mãos do [procurador-geral de Justiça] Eduardo Gussem no dia 1º de janeiro. No dia 1º de janeiro a gente marca outra coletiva para falar disso”, disse o governador interino no mês passado.

Mesmo com a assinatura dos quatro candidatos, há o temor entre alguns membros de que algum deles desista do compromisso após a eleição.

A Folha questionou esses postulantes sobre que medida tomariam para garantir a escolha do mais votado, mesmo em caso de insistência do governador.

Os promotores Luciano e Virgílio declararam que recusarão a nomeação caso componham a lista tríplice sem serem os mais votados. Os dois afirmaram que comunicarão ao governador sobre a decisão no momento do envio do documento.

Ertulei afirmou que pedirá para que seu nome sequer seja enviado na lista caso não vença a disputa interna. Leila não respondeu ao questionamento da reportagem.

A entrada de Rocha Monteiro na lista é vista como improvável. Mas há apreensão sobre que estratégia adotar para garantir a escolha do mais votado.

Há preocupação com o fato de uma recusa à nomeação levar à abertura de uma nova vaga na lista a ser preenchida pelo procurador bolsonarista.

Rocha Monteiro enviou à classe uma mensagem explicando as razões pelas quais não adotou a mesma posição dos outros candidatos. Ele afirma que a lista tríplice é definida pela Constituição, e não cabe aos promotores impor novos critérios.

“O legislador entendeu conveniente que a escolha do PGJ não se desse exclusivamente pela classe, para que pudesse haver a participação indireta da população, através do governador democraticamente eleito”, afirmou ele.

“Pleitear [a escolha do mais votado] é legítimo. Coisa diferente, no entanto, é pretender, através de artifício (por bem intencionado que seja) impor ao governador (e, de resto, a toda a população) um sistema de escolha do PGJ que o legislador expressamente não admitiu”, escreveu.

Ele afirma ainda que “a nomeação do mais votado não representa garantia alguma de um PGJ que não ceda a eventuais propostas ilícitas provenientes dos poderosos de plantão”.

Foi uma referência ao ex-procurador-geral de Justiça Cláudio Lopes, acusado de participar do esquema de corrupção do ex-governador Sérgio Cabral.

A interlocutores o senador Flávio Bolsonaro tem dito não ser necessário interferir na eleição interna, mas considera natural ser consultado pelo governador como um gesto de aproximação com o Palácio do Planalto.

Castro fará a nomeação, após assumir o cargo de governador fragilizado politicamente em razão das buscas realizadas em sua casa, além de delações divulgadas que mencionam o seu nome com a cobrança de propina no estado.

Sua gestão interina é vista, por essa razão, como dependente da relação com a família do presidente Jair Bolsonaro.

Ele está no comando do Palácio Guanabara desde a deflagração da Operação Tris In Idem, em que o ministro Benedito Gonçalves, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), determinou o afastamento de Wilson Witzel (PSC) do cargo.

O cargo de procurador-geral ganhou mais importância para as investigações sobre Flávio após o Tribunal de Justiça definir que o senador tem direito ao foro especial.

Neste caso, é o próprio chefe do MP-RJ quem tem atribuição para conduzir as apurações, oferecer denúncia e atuar em eventual ação penal contra o senador.

Flávio foi denunciado no mês passado ao Órgão Especial. Ele é acusado de recolher parte dos salários de seus funcionários para pagar despesas pessoais, além de criar um esquema de lavagem de dinheiro com imóveis. A acusação ainda será analisada pela corte, composta por 25 desembargadores.

O MP-RJ também defende junto ao STF a revogação da decisão que concedeu foro especial a Flávio, tese que poderá ser reavaliada pelo novo procurador-geral de Justiça.

Carlos, por sua vez, perdeu foro especial após o Supremo considerar suspenso o dispositivo que previa este benefício a vereadores do Rio de Janeiro.

O chefe do MP-RJ não tem poder para interferir diretamente nas investigações de promotores que atuam na primeira instância. Pode, contudo, desfazer estruturas especializadas criadas na atual gestão.

O Gaecc (Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção) é o responsável por prestar auxílio aos promotores em investigações consideradas complexas.

Ele conta com equipe própria para a realização de diligências. Depois de concluir o caso Flávio, este grupo assumiu as investigações sobre Carlos.

O debate entre os candidatos a PGJ previsto para essa sexta-feira (4) foi adiado porque Rocha Monteiro está hospitalizado. De acordo com a Amperj (Associação do do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro), o quadro dele é estável.

O encontro seria fechado para membros e servidores do MP-RJ, por acordo dos candidatos. A associação não autorizou que a imprensa acompanhasse o debate. Uma nova data ainda será marcada.

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