Descrição de chapéu Saiu no NP

1998: Rei na música, Reginaldo Rossi diz que prefere jovens cheirando xereca a cocaína

Em entrevista ao Notícias Populares, cantor, que tinha vendido mais de 5 milhões de discos, falou da carreira e da vida

Banco de Dados
São Paulo

“Todo mundo diz que sou um fenômeno. Então, eu devo ser!”, disse o cantor e compositor recifense Reginaldo Rossi em entrevista ao Notícias Populares, publicada em 1º de novembro de 1998 no suplemento “Domingão no NP”, que toda semana trazia um bate-papo com famosos.

Com então 54 anos de vida e 34 de carreira, o “Rei do Brega”, como o cantor ficou conhecido, acabava de lançar o seu 19º álbum, “Reginaldo Rossi Ao Vivo - Grandes Sucessos” (Sony). A terceira faixa, “Garçom”, gravada originalmente em 1987 no disco “Teu Melhor Amigo”, tornou-se no ano seguinte uma de suas composições mais executadas nacionalmente.

Na entrevista, o músico falou de fama, mulheres, homossexualismo, drogas e do início da carreira nos anos 1960, quando integrou o The Silver Jets, segundo ele o primeiro grupo nordestino de iê-iê iê.

Na época, o cantor conciliava a função de artista com a faculdade de engenharia civil no Recife, além de lecionar as disciplinas de matemática e física.

Em 1999, já reconhecido no eixo Rio-São Paulo, ele foi homenageado com o álbum “Reginaldo Rossi - Um Tributo” (Mangroove Records), com as participações de grandes nomes do cenário musical nordestino como Lenine, Zé Ramalho, Otto, Lula Queiroga e Geraldo Azevedo, além das bandas Cascabulho e Mundo Livre S/A.

Ao longo de mais de 50 anos de carreira, ele conquistou 14 discos de ouro, um de diamante, dois de platina e um de platina duplo. No auge fazia uma média de 25 apresentações por mês. Seu último trabalho foi o DVD "Cabaré do Rossi", com releituras de seus grandes sucessos.

Reginaldo Rossi morreu em 20 de dezembro de 2013, aos 70 anos, vítima de complicações causadas por um câncer no pulmão. Ele deixou dois filhos, um biológico e um de coração, que se tornou seu secretário.

Entre as canções mais conhecidas do cantor estão “Deixa de Banca”, “Tô Doidão”, “A Raposa e as Uvas”, “Era Domingo”, “Ai Amor”, "Mon Amour, Meu Bem, Ma Femme" e “Garçom”, que o consolidou nacionalmente.

Leia a íntegra da entrevista de Reginaldo Rossi concedida ao Notícias Populares.

 

Quem é Reginaldo Rossi? É um cara romântico, um showman irreverente, engraçado, bem-humorado, feliz e que adora ver o povão cantando suas músicas.

Você começou na época da Jovem Guarda e se mudou para o Nordeste. Por quê? Os críticos mais ferrenhos achavam que a Jovem Guarda era coisa de alienado. Eles achavam que, se um cara cantasse uma canção romântica, era brega. Se cantasse algo de protesto, era chique. A própria CBS, que hoje é a  Sony, tinha pedido para eu mudar o jeito de cantar. Eu, que em 72 tinha colocado a música “Mon Amour, Meu Bem, Ma Femme” em primeiro lugar no Brasil todo. Pensei: “Está na hora de ir embora!”.

No final de 1978, voltei para o Recife, minha terra. No final de 79, fiquei definitivamente ao Recife. A Odeon acreditou em mim, mas em termos. Falaram para eu fazer um disco que teria que vender 15 mil cópias. E já estava bom. Na época, vendi 125 mil discos. De 1980 a 1990, gravei dez discos na Odeon. Os dez foram disco de ouro.

Você costuma fazer performances em seus shows. Dizem até que dança como Mick Jagger (dos Rolling Stones). Quando isso começou e o que mais faz no palco? Isso começou quando eu era garoto. Antes mesmo de eu vir para São Paulo, eu já cantava dançando. Eu dançava como Elvis. Naquele tempo, ninguém dançava no palco e eu já era meio elétrico quando fui contratado para vir para São Paulo. Quando cheguei aqui meu empresário fez um contrato para eu cantar na Record, que era mais forte que a Globo hoje. Eles me contrataram e fiz os grandes programas. Acho que foi por causa da minha maneira. Fui brincando com o povo e foi dando certo.

Na primeira faixa do CD ao vivo, um apresentador diz que você é o rei, o ‘Reginaldo Rossi'. Você se considera mesmo um rei? Todo mundo fala isso nos lugares onde eu vou. Aí, eu fico contente. Acho que não tem essa frase no CD. Acho que a Sony não quis facilitar porque tem o rei Roberto. Não tem essa abertura no disco…

Tem. E você canta parecido com Roberto Carlos. Começou a cantar influenciado por quem? (escutando a faixa no discman do repórter) É, tem! Mas acho que essa é uma outra abertura. Chegou uma cópia em minhas mãos com outra abertura. Se colocaram, para mim é melhor. Nunca forcei, a coisa vem espontânea, tá entendendo?! Começou no Recife, passou para Paraíba, foi para Bahia… Quando eu chego nos shows, a meninada canta “Rei, rei, rei, Reginaldo é rei”. Eles até beijam o chão… Meu cabelo virou minha marca registrada. Os óculos também. Tudo na minha vida veio naturalmente. Sou cego do olho direito. Quase cego. Nos shows à noite, para poder ver o povo, comecei a usar um óculos de grau com lente escura. Virou marca registrada.

Qual é seu figurino nos shows? Uso sapato sem meia, calça jeans e um blusão. Ando assim porque trabalho muito no Nordeste e sou aquariano, que vive adiantado… Como sou folgado e irreverente, ando assim. A roupa não muda a capacidade intelectual do cara. Tenho 54 anos com cabeça de 18 ou 15.

Nos seus shows, você fala das “mulheres de pé grande”. Qual sua opinião sobre o homossexualismo? Acho legal. Hoje em dia muito mais avançado. Fui o primeiro nordestino a usar sandália havaiana. Hoje, é o sapato de todo mundo. O primeiro cara a fazer um grupo de rock fui eu. Fui o primeiro a usar calça sem prega, que era a calça calhambeque. Sempre fui adiantado. Você pode ser o que quiser. Se o prazer do cara está em chupar pirulito... Se está em transar mulher com mulher, que transe. Macho com macho, que transe. Não vejo nada de mais. O problema é dar prisão especial para quem tem nível superior. Deveria ser prisão mais forte. Isso revolta.

Você já vendeu mais de 5 milhões de cópias. Até já falou que se considera um fenômeno. Acha mesmo que é um fenômeno? Não é que eu me considere um fenômeno… Todo mundo diz que sou um fenômeno. Então, eu devo ser! Fazer essas coisas que estou fazendo, sem a mídia do Sudeste, eu não devo ser. Tudo com muito trabalho e esforço. Minha irreverência fez com que a meninada gostasse da minha música. Estou em todo o país. Agora vou tomar conta de São Paulo, Rio de Janeiro e todos os lugares.

Por quê resolveu lançar um CD ao vivo? A exigência deste CD foi de milhares de pessoas. Vamos dizer que no Recife, minha base, tenho mil músicas que o povo conhece. Na Bahia, cantam 30. Em São Paulo, de um modo geral, cantam três músicas. Se eu cantasse só quatro músicas, o povão ia cantar quatro. Se a Sony não investisse em mim, tinha um monte de gente atrás. Vários empresários foram na minha porta para saber quanto custava o contrato. Só não me lancei sozinho porque não tenho a estrutura correta.

Então você já ficou rico?  Não, porque estraguei muito dinheiro. Teve um tempo em que eu jogava muito e perdia muito. Mas nunca faltou nada para a minha família. Não só minha mulher e meu filho mas também pessoas que ajudo. No momento, cerca de 30 pessoas vivem do meu dinheiro. Estou guardando para a velhice, mas não quero morrer rico. Quero viver como rico. Já comprei casa, apartamento… Já dei casa para a minha mãe. Ajudo instituições… Minha casa parece casa de político em véspera de eleição. Podia ter uma Mercedes, mas não faço questão disso. Não tenho essas vaidades.

Como se relaciona com as fãs? É considerado galã?  Acho que tenho uma postura boa. Acho que não sou extremamente feio nem extremamente bonito. No palco, eu cresço e procuro agradar tanto e encantar as pessoas… Nele, me sinto alto, forte, bonito e gostosão. Quando você se sente bem, as pessoas te veem assim.

Coloca dançarinas no palco? Não. Não tem dançarina, não tem iluminação, não tem roteiro… Não tem nada. Normalmente, meus shows recebem um público de 20 mil a 25 mil pessoas.

Então você é um mágico? É por isso que me chamam de fenômeno. Só defino a primeira música do show. Depois, é o que Deus quiser. Coloco um dedo para baixo e aviso a banda que vou cantar em mi menor. Aí, posso cantar de Pavarotti a Carlos Alexandre. A banda nunca sabe o que vou cantar.

Como se define? Ser chamado de brega o incomoda? Sou um cantor. Não incomoda o brega, eu progredi. Na época, eu vinha de uma escola de engenharia e cantava iê-iê-iê com cuidado. Voltei para Recife porque tinha uma coisa de o cara cantar ou só no AM ou só no FM. O cantor era de classe A ou brega. Como eu cantava tudo, fiquei sem saber o que fazer. Se falarem que é brega, quero que falem sou brega ao quadrado. Assim vendo mais.

Se formou em engenharia? Estudei no Recife, de 65 a 67. No final de 66, vim para São Paulo fazer o disco. Gravei e voltei para casa. E o disco explodiu. Eu era um garoto na época. Vou contar uma história. Na época, eu já era o rei do Recife e ganhava cerca de R$ 1.000 por show. Aí, recebi um convite para cantar em Manaus por R$ 40 mil. Era 40 vezes o que eu ganhava! Na volta de Manaus, comprei uma maleta 007 e botei o dinheiro dentro. Entrei no avião e fiquei contando o dinheiro de 40 em 40 minutos. Eu não acreditava que tinha tanta grana. Tive que abandonar a escola (risos)

Você já foi homenageado pelo Raul Seixas?  Em um dos discos dele, o Raul fez uma citação de “Mon Amour, Meu Bem, Ma Femme”. Agora, estão descobrindo Reginaldo Rossi. Não abro mão da frase “Ao invés de cheirar cocaína é melhor cheirar xereca de menina”. Inventei e não vou deixar que a roubem de mim. É uma maneira de ensinar o jovem a ficar longe das drogas. Eu criei muita coisa, muita coisa mesmo.

Reginaldo Rossi é um cantor pop?  Dizem que Rossi é cult, que é brega, que é chique, que é pop, que é fenômeno. Isso tudo me deixa envaidecido. Alguns grupos do Recife, ligados ao manguebeat, estão fazendo o CD “O Rei Ginaldo Rossi”, onde cantam minhas músicas. Lenine e Zé Geraldo fizeram questão de gravar participações. Isso tudo é Deus que me dá. A base de “pelados em Santos”, da Brasília Amarela, é Reginaldo Rossi. Eu já dizia “mina” em 1972 (emocionado). O Dinho, dos Mamonas, me chamava de rei. O pai dele disse que eu era o grande ídolo dele. Quando o pai do Dinho abriu o quarto dele tinha fotos minhas. Tudo isso é o homem lá em cima que me dá. Você perguntou no começo quem era Reginaldo Rossi, Reginaldo Rossi é isso.

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