Andanças na metrópole

As camadas de história encobertas em construções, ruínas e paisagens

Andanças na metrópole - Vicente Vilardaga
Vicente Vilardaga
Descrição de chapéu indústria

Por que Matarazzo ainda exerce tanto fascínio

Empresário deixou marcas profundas no espaço urbano e no imaginário popular

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São Paulo

Oitenta e seis anos depois de sua morte e 30 anos depois da derrocada final de seu grupo empresarial, Francesco Matarazzo ainda é um nome que ecoa vigoroso por todo o Brasil. Seu poderio industrial é inesquecível. Nunca houve um sujeito tão rico no pais, capaz de se tornar onipresente nos lares e nas mentes dos brasileiros com seus bens de consumo e feitos impressionantes.

Partindo de um negócio de banha de porco em Sorocaba, ele criou um conglomerado polivalente que produzia de perfumes a parafusos, de tecidos a azulejos e formou um complexo industrial de fazer inveja aos magnatas americanos, com produção verticalizada e grande diversificação de produtos.

Nascido há 170 anos na remota aldeia de Castellabate, na Itália, Matarazzo foi um exemplo do homem que se fez por si mesmo, partindo praticamente do zero no Brasil. Chegou aqui em 1881 com um carregamento de 20 toneladas de banha de porco, mas perdeu a carga na Baía da Guanabara num naufrágio.

Com o pouco dinheiro que lhe restou foi para o interior de São Paulo onde trabalhou como mascate antes de montar um pequeno comércio e, em seguida, um novo empreendimento de banha de porco. Percebeu logo que faltavam no Brasil gêneros alimentícios básicos e passou a importar farinha de trigo dos Estados Unidos.

Francesco Matarazzo
Matarazzo foi o homem mais rico do Brasil na primeira metade do século 20 - domínio público

Logo viu, porém, que precisava produzir internamente em vez de importar e em 1900 inaugurou o Moinho Matarazzo, no Brás, maior unidade industrial da cidade no seu tempo. Alguns anos depois, com seu senso de oportunidade e com a ideia de que "uma coisa puxa a outra", Matarazzo ergueu, em frente ao moinho, a Tecelagem Mariângela que fornecia os sacos para embalar a farinha e o farelo de trigo. E dando mais um passo, começou a produzir óleo com um subproduto da tecelagem, as sementes de algodão.

A receita bruta das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo (IRFM), conglomerado criado em 1911, era a a maior do país. Cerca de 6% da população paulistana tinha algum integrante que trabalhava nas suas empresas. Chegou a ter 200 fábricas e 30 mil funcionários. Em alguns bairros como Mooca, Belém ou Brás é fácil encontrar alguém hoje que seja filho ou neto de algum ex-funcionário do grupo empresarial. Quando morreu tinha uma fortuna estimada de 20 bilhões de dólares e era um dos homens mais ricos do mundo.

Vista da antiga sede das Indústrias Matarazzo, no bairro da Pompéia, em São Paulo - Niels Andreas/Folhapress

Grandes fábricas e vilas operárias do grupo ou vestígios delas ainda estão espalhados por toda a cidade, como tenho verificado em minhas andanças. No Brás, há o Moinho Matarazzo e a Tecelagem Mariângela, ambos de pé, Na Água Branca, onde construiu seu maior complexo industrial, resta a Casa das Caldeiras. Em Ermelino Matarazzo, bairro da zona Leste, há construções que pertenciam à Celosul, fábrica de papel celofane do grupo.

Ermelino era o filho dileto de Matarazzo e sucessor natural para o comando do conglomerado, mas morreu precocemente em um acidente automobilístico na Itália – foi um dos primeiros brasileiros a morrer dessa forma. Seu corpo está sepultado no Cemitério da Consolação, na cripta que pertence à família, a maior da necrópole.

Edifício Matarazzo, também conhecido como Palácio do Anhangabaú é a sede da prefeitura da cidade de São Paulo desde 2004 - Folhapress

Não se pode esquecer também do Edifício Matarazzo, sede da Prefeitura de São Paulo, inaugurado em 1939, com projeto de Marcelo Piacentini arquiteto oficial do fascismo. O prédio foi erguido na gestão de Francisco Matarazzo Júnior, que acabou sucedendo o pai.

Prova cabal da vitalidade da marca é que agora está em formação a Cidade Matarazzo, complexo urbanístico na Rua Itapeva, travessa da Avenida Paulista, na Bela Vista. Envolve dez edifícios centenários e tombados que pertenciam ao empresário e ocupa uma área de 30 mil metros quadrados.

Num desses edifícios funcionou o Hospital Umberto I, conhecido domo Hospital Matarazzo, de 1904. Outra construção abrigava a Maternidade Condessa Filomena Matarazzo, de 1943. Partes do complexo já estão em funcionamento, como o hotel Rosewood e a Capela Santa Luzia, que foi restaurada. A Cidade Matarazzo é mais uma demonstração de que o fascínio pelo magnata italiano e por seu nome ainda resiste com força.

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