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É Logo Ali - Luiza Pastor
Luiza Pastor
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escalada

Subi ao cume do Everest, e agora?

Aretha Duarte, a primeira mulher negra latino-americana a escalar o Everest, conta como é a vida após essa conquista

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A conquista do cume do Everest, na cordilheira do Himalaia, é o grande troféu cobiçado por todo escalador de altas montanhas. E é cada vez maior o número de pessoas que carimbam o perfil nas redes sociais com amplos sorrisos no topo do mundo. Mas, como é voltar de um desafio desse porte? E mais: como é voltar depois de percorrer o mais longo e difícil dos caminhos até lá, tendo como ponto de partida um humilde barraco próximo ao aeroporto de Viracopos, em Campinas?

"É bem curioso, o mundo fica completamente diferente após o Everest", contou Aretha Duarte, a primeira mulher negra latino-americana a chegar lá, no dia 23 de maio de 2021.

Aretha Duarte, que subiu o Everest com expedição financiada só com material reciclável - Bernardo Coelho

"A primeira referência é a de que, depois de ter ficado 64 dias fora do Brasil, focada no projeto Everest, 54 dias só em altas montanhas, onde tudo é diferente da nossa vida urbana, tudo é mais lento, exige mais concentração, a gente precisa se readaptar ao dia a dia cheio de informação, que exige as coisas com mais rapidez", definiu Aretha, que liderou no sábado (22) a Expedição Decathlon ao topo da Pedra Grande, em Atibaia, no interior de São Paulo —um morrinho modesto, modestíssimo, com seus 1.418 metros de altitude, mas que conduziu com a energia, a motivação e o sorriso largo de quem escala uma montanha na Lua.

Grupo liderado por Aretha Duarte (no chão) no topo da Pedra Grande, em Atibaia (SP)
Grupo liderado por Aretha Duarte (no chão) no topo da Pedra Grande, em Atibaia (SP) - Luhan Grolla/Divulgação

"Eu levei três, quase quatro meses para a readaptação", continua, ponderando que havia outro lado, inevitável: "Tinha que ver o que havia passado a ser minha vida após essa conquista".

Aretha gosta de dizer que não subiu ao Everest sozinha. "Eu me sentia imparável porque representava uma legião de pessoas, era muita gente chegando no topo comigo", afirmou ela à Folha em maio passado, lembrando que professores lhe confidenciavam que meninas negras haviam ido à escola por primeira vez com o cabelo solto depois de verem notícias sobre ela, suas fotos e o sorriso contagiante.

Aretha Duarte, no acampamento-base do Everest - Gabriel Tarso

"Até meu bairro na periferia, o Jardim Capivari, entrou no mapa", se surpreendeu ela.

A visibilidade obtida com a história emocionante da mulher que conseguiu financiar sua escalada ao topo do mundo coletando 130 toneladas de materiais recicláveis e, até, participando do quadro The Wall, do apresentador Luciano Huck, na TV Globo, trouxe, como conta, novas responsabilidades.

"Não dava mais para fazer as coisas pensando que era só para mim, a partir dali tudo o que vou fazer tenho que fazer de maneira muito pensada, muito ética e cuidadosa, justamente pela representatividade, em todas as minhas atitudes", explica, acrescentando que uma das surpresas foi reconhecer que a conquista não era apenas o seu grande sonho. "Meu sonho grande sempre foi gerar transformação", afirma, "ver pessoas na periferia se realizando, fazer do meu trabalho ferramenta dessa transformação".

Desde seu retorno, a vida de Aretha inclui uma rotina de palestras em escolas públicas e visitas a ONGs, sempre buscando conversar com crianças, adolescentes e jovens mulheres empreendedoras para mostrar que sonhar é possível e, principalmente, desejável. Um de seus projetos mais recentes é a implantação de paredes de escalada nas periferias, o que conseguiu com parceria com o canal OFF e por lei de incentivo ao esporte. A primeira parede será instalada na Lagoa do Mingone, em sua Campinas natal, em parceria com a Fábrica de Formas, de André Braga, o Deco, que participou do reality show "A escalada", da HBO.

"O projeto vai mostrar que mesmo que não possam pagar um clube de montanhismo, ou contratar uma operadora desse tipo de atividade, eles podem ter contato com escalada numa tarde de domingo lá na praça ao lado da casa deles, democratizando e facilitando o acesso gratuito a esse esporte", conta ela, que busca parceiros para disponibilizar os equipamentos básicos, uma vez que não conta com patrocínio privado, mas apenas parcerias pontuais, como a Decathlon, que a levou em turnê para promover o livro autobiográfico "Da Sucata ao Everest" entre os meses de setembro de 2022 e janeiro de 2023.

"Eles também patrocinaram parte da Expedição Sajama, na montanha mais alta da Bolívia, com 6.542 metros de altitude, que é parte já de meu próximo projeto, de escalar os sete cumes mais altos da América do Sul", diz a montanhista, sempre ligada nos 220.

E, embora pareça óbvio, perguntamos à Decathlon o que a levou a apoiar os projetos de Aretha. E foi o líder da marca no Brasil, Fábio Cedano, que explicou a importância de caminhar ao lado de uma atleta de elite como ela.

O líder de marca, Fábio Cedano, fala ao grupo da Expedição Decathlon
O líder de marca da Decathlon, Fábio Cedano, fala ao grupo da Expedição Decathlon - Divulgação

"Além de podermos dar suporte para a esportista praticar sua atividade, é muito importante para nós termos o feedback dos produtos, se ela gosta do que usou vai naturalmente propagar por aí a qualidade", disse Cedano.

Na apresentação inicial da Expedição Decathlon, Aretha ressaltou ao grupo, formado principalmente por influencers do meio nas redes sociais, a importância de estar sendo apoiada por uma empresa preocupada com a sustentabilidade —e isso, garante Cedano, não fica só no discurso. "Nós temos a meta de ter 100% dos produtos de nossas marcas próprias produzidos com o máximo de redução de gás carbônico em todo o processo produtivo, desde a matéria prima até a fabricação, e hoje já estamos quase com 90% dessa meta cumprida", ressalta.

E Aretha concorda com ele: "Essa postura me deixa muito feliz, porque ainda tem sido raro as empresas terem essa dedicação não só à democratização dos esportes, com produtos acessíveis, como também à sustentabilidade e a preocupação com a natureza".

*A repórter participou da Expedição Decathlon a convite da empresa

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