O artigo a seguir é de autoria de Germano Siqueira, juiz do Trabalho de 7ª Região.
Recente punição esportiva ao Corinthians, pela prática de cantos homofóbicos, reavivou o debate sobre essa questão. E não só a torcida do clube paulista, mas várias outras em todo o Brasil, entoam cânticos dessa mesma natureza.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADO n. 26, decidiu que, até a aprovação de lei específica pelo Congresso Nacional, as condutas homofóbicas devem ser processadas sob a ótica do art.20 da Lei nº 7.716, que pune com pena de reclusão de um a três anos --podendo chegar a cinco anos-- aqueles que praticarem os referidos atos discriminatórios. O STF, além do mais, considerou esses crimes imprescritíveis e inafiançáveis.
Além da responsabilização criminal, a nova Lei Geral do Esporte, em seu art. 158, IV, explicita que o acesso e a permanência do espectador no recinto esportivo está condicionado a não entoar cânticos de caráter racista, homofóbico, sexista ou xenofóbico, de modo que o descumprimento desse dever legal pode acarretar prejuízos econômicos para as torcidas organizadas, caso sejam condenadas por danos morais, inclusive coletivos, à luz dos §§ 5º e 6º da citada Lei Geral do Esporte (LGE).
Vale lembrar que essa responsabilidade é solidária (em conjunto), respondendo tanto a organizada como os seus associados ou membros, sendo de se destacar, ainda, que essa modalidade de responsabilidade civil do tipo é objetiva, quer dizer, independentemente de culpa. Além disso, o § segundo do art.192 da LGE estabelece que se a torcida organizada ou seus membros praticarem tais condutas serão impedidos de comparecer a eventos esportivos pelo prazo de até cinco anos.
Mas não é só isso. Do ponto de vista desportivo, os clubes também podem ser punidos, uma vez que o art.243-G do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) veda a prática de ato discriminatório em razão de sexo, raça ou etnia e o seu parágrafo primeiro estabelece que se a conduta nele prevista for praticada simultaneamente, por considerável número de pessoas vinculadas a uma mesma entidade de prática desportiva, como a sua massa torcedora, o clube poderá ser punido com a perda do número de pontos atribuídos a uma vitória no regulamento da competição.
Essa responsabilidade transversal não é novidade no CBJD, uma vez que no parágrafo primeiro do seu art.203 ficou estabelecido que se houver suspensão de partida, inclusive em curso, causada ou provocada pela sua torcida, o clube pode ser punido com perda de pontos.
É preciso lembrar, ainda, que o § 3º do mesmo art.243-G estabelece que quando a infração for considerada de extrema gravidade o órgão julgador poderá aplicar as penas previstas nos incisos V, VII e XI do art.170 desse Código, respectivamente, as possibilidades de perda de pontos, perda de mando e até mesmo exclusão do campeonato ou torneio.
Além do mais, o art.134 do Regulamento Geral de Competições da CBF (RGC/2023) pontua que o descumprimento de suas regras sujeitará o infrator a penalidades que vão de advertência, multas a perda de pontos (incisos I, II e IV), mencionando que é de extrema gravidade a conduta da própria torcida em casos de ofensas à dignidade de uma pessoa ou coletividade em razão de gênero ou orientação sexual.
Em acréscimo, o já citado RGC, no parágrafo primeiro de seu art.2º, exige de todos os participantes da competição desenvolvam ações destinadas a prevenir comportamentos antidesportivos, tais como racismo e LGBTfobia.
Justo nesse sentido, é de fundamental importância que todos os envolvidos estejam conscientes de seus atos e responsabilidades, sendo relevante destacar que o Ceará Sporting Club, dando cumprimento ao que estabelece o Regulamento Geral de Competições, foi o primeiro clube no Brasil a realizar o seu Congresso sobre Racismo, Homofobia e Violência nos estádios, ocorrido no último dia 27/7, dando passo importante em direção à conscientização de sua grande torcida.
Que outros clubes sigam o mesmo caminho.
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