Música em Letras

O mundo dos sons por meio da leitura

Música em Letras - Carlos Bozzo Junior
Carlos Bozzo Junior

Álbum 'Grande Sertão: Gonzaga' mostra matrimônio de interesse

Conheça o faixa a faixa do álbum de Carol Andrade e Alex Maia, feito com exclusividade para o blog, e assista aos vídeos no final do texto

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Acontece nesta sexta-feira (26), nas plataformas de áudio, o lançamento do álbum "Grande Sertão: Gonzaga" do casal formado pela cantora Carol Andrade e pelo violonista e arranjador Alex Maia. A dupla fez um faixa a faixa do trabalho com exclusividade para o Música em Letras (leia no final do texto).

Há muito o matrimônio da cantora Carol Andrade com o violonista e arranjador Alex Maia gera patrimônio de inestimável valor à MPB.

Em foto colorida, o  violonista e arranjador Alex Maia e sua mulher a cantora Carol Andrade posam para a câmera
O violonista e arranjador Alex Maia e sua mulher a cantora Carol Andrade - Divulgação/Anaryá Mantovanelli

A dupla existe desde 1997, conta com cinco discos e quatro turnês internacionais. A próxima acontecerá em novembro deste ano, na Europa, passando pela França, Bélgica, Holanda, Suíça e Alemanha.

Quanto aos álbuns lançados pelo casal, vale ouvir os cinco e sentir o propósito de cada um. "Vida Adentro" (2005), primeiro álbum feito pelo duo; "Outras Mulheres" (2013), trabalho solo da cantora, com arranjos, produção musical e violão de seu marido; "Sorria" (2016), outro trabalho autoral de Carol, com arranjos, produção musical e violão de Alex Maia; "Canção pra Dois" (2018), trabalho realizado pelo duo; "O Fio da Vida", (2022), mais um trabalho autoral da cantora, com arranjos, produção musical e violão de seu marido.

O sexto álbum, a ser lançado na próxima sexta-feira, "Grande Sertão: Gonzaga", chega trazendo na interpretação da obra musical de Luiz Gonzaga (1912-1989) a voz de Carol Andrade e o violão de Alex Maia, fundindo -se em arranjos precisos e de extremo bom gosto. Neles, o som cristalino e vigoroso do violão de Alex Maia une-se à bela e clara voz de Carol Andrade, mostrando a profunda intimidade que há entre os dois artistas.

Gravado pelo músico, produtor e engenheiro de som Alexandre Fontanetti, o Fonta, do estúdio Space Blues, em São Paulo, e com mixagem do Homem Morcego, Homero Lotito, o som do trabalho é de altíssima qualidade. Carol e Alex parecem cantar e tocar em letras de forma.

Em foto colorida, a paisagem do sertão é mostrada através de um solo de terra sêca e uma árvore desfolhada
Capa do álbum ‘Grande Sertão: Luiz Gonzaga’, - Divulgação/Lu Brito

"Esse trabalho mostra um Gonzaga para além do arrasta-pé. No minimalismo da formação voz e violão, descobrimos as sutilezas guardadas na voz e na sanfona de um Luiz que conta a nossa história e representa a nossa gente", disse Carol Andrade.

No repertório do álbum figuram "Pau de Arara", de Luiz Gonzaga e Guio de Morais; "Riacho do Navio", de Luiz Gonzaga e Zé Dantas; "Assum Preto", de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira; "Olha pro Céu", de Luiz Gonzaga e José Fernandes; "Juazeiro", de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira; "A Morte do Vaqueiro", de Luiz Gonzaga e Nelson Barbalho; "Festa", de Gonzaguinha; "Súplica Cearense", de Gordurinha e Nelinho; "Respeita Januário", de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira; e "Óia Eu Aqui de Novo", de Antonio Barros.

Em foto colorida, o casal Alex Maia e Carol Andrade posam para a câmera
O casal de músicos Alex Maia e Carol Andrade - Divulgação/Anaryá Mantovanelli

Segundo Millôr Fernandes (1923-2012), "Quando o matrimônio é por interesse devia se chamar patrimônio". Verdade absoluta. No entanto, no caso de Carol Andrade e Alex Maia, os dois têm interesse um no outro também como artistas, pois cada um sabe ser extremamente respeitosos com relação à música. Em seus trabalhos, além de valorizarem suas talentosas características artísticas, em vários momentos conseguem uma fusão única em meio a harmonias, melodias e ritmos da música popular brasileira sem descaracterizá-las. "Grande Sertão: Gonzaga" é mais uma prova audível disso.

Outra prova de que o casal sabe fazer músicas realmente juntos está no faixa a faixa do álbum preparado pelos dois artistas, que você poderá ler após assistir, a seguir, aos vídeos nos quais a dupla interpreta "Respeita Januário" e "Óia Eu Aqui de Novo".

FAIXA A FAIXA DO ÁLBUM ‘GRANDE SERTÃO: GONZAGA’

1- "Pau de Arara", por Carol Andrade

Abertura do álbum. Canção de chegada. De algum lugar. Sempre me emocionei ouvindo essa canção e não sabia o porquê. Hoje, mais conectada com a minha ancestralidade, compreendo a origem desse sentimento -escuto a voz dos meus avós- e é com ela que eu cantei essa faixa, bem como todo o disco ‘Grande Sertão: Gonzaga’".

2- "Riacho do Navio", por Alex Maia

É um arranjo muito interessante, no sentido de que a afinação do violão é totalmente modificada pra ter uma tessitura do que eu chamo de um "violão piano" (que é a sexta corda afinada em si e a quinta em fá sustenido) e isso dá a ideia do grave do apito de um navio. Outro detalhe, é o dedilhado da introdução que simula as águas cristalinas, correndo pelas pedras pra encontrar o Rio São Francisco, que vai bater lá "no meio do mar".

3- "Assum Preto", por Carol Andrade

Em todas as músicas eu tive que fazer transposições de tom, mas nessa aceitei o desafio de cantar no original, pra favorecer o arranjo do violão. Tenho graves potentes, mas cantar a música inteira assim não rolava, não vinha brilho. Daí que resolvi cantar apenas as duas primeiras estrofes na oitava do Gonzaga e nas outras seguintes brinquei com a voz: na terceira, faço um contracanto -a melodia principal fica no violão- e na última, canto uma oitava acima, atingindo o extremo da minha extensão vocal bem na hora do clímax da música, para depois cair novamente no grave, como quem cai em si e aceita a tristeza em paz.

4- "Olha pro Céu", por Alex Maia

Na introdução trago a ideia de um realejo -aquela caixinha que tem um pássaro que fica pegando um papelzinho com mensagens e dando para as pessoas nos parques das cidades do interior- e também me inspirei no filme "Paris-Texas", do Win Wenders, que tem uma música chamada "Cancion Mixteca", que tem um pouco dessa sonoridade. Nessa viagem, fiz uma conexão entre o sertão de Pernambuco e o deserto do Texas. Um começo leve e valseado, pra depois a gente cair num frevo rasgado, voz e violão.

5- "Juazeiro", por Alex Maia

É uma música que tem uma imagem, pra mim, muito clara: uma cena parada no tempo, onde o ar não circula e onde a paixão da saudade rói -como se diz no nordeste, é uma paixão "roedeira". Inspirado nisso, eu fiz um som com as cordas, em cima da boca do violão, que não é um acorde especificamente, é um ruído, como se estivesse roendo por dentro a saudade e, ao mesmo tempo, fosse o barulho de uma pessoa escrevendo um nome na árvore, como diz a letra: "No teu tronco tem dois nome, ela mesma que escreveu".

6- "A Morte do Vaqueiro", por Alex Maia

Nessa faixa, chamo a atenção para o solo de violão. A letra fala de um vaqueiro que foi morto numa emboscada, e o solo é todo construído em cima da imagem dele tentando fugir dessa caçada. São muitas notas, é polifônico pra caramba, até ficar numa nota só, que é a hora que o vaqueiro morre solitário e é deixado numa cova a céu aberto.

7- "Festa", por Carol Andrade

Nós tivemos a sorte de apresentar esse trabalho para o grande violonista Paulo Bellinati, antes de gravarmos o disco. Ele, generosamente, nos deu sugestões maravilhosas que fizeram toda a diferença na produção. Uma delas foi começar esse arranjo apenas com voz. "Festa" é uma canção difícil de cantar, com espaços muito curtos pra respirar, mas é claro que eu topei o desafio e acho que deu muito certo. A poesia do Gonzaguinha chegou com tudo e foi "pegando fogo" a cada vez que eu a repetia, inspirada pela surpreendente dinâmica do violão.

8- "Súplica Cearense", por Carol Andrade

Diferente da versão do Gonzagão, resolvemos deixar essa canção em andamento mais lento, pra potencializar o drama que essa letra apresenta: "Oh Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe, eu acho que a culpa foi desse pobre que não sabe fazer oração". Acho essa frase, particularmente, a mais dolorida pra mim. A sensação de culpa de um pobre, a fé como única resposta para os problemas vividos. Canto essa música com o desejo de expor essa realidade, que ainda é a de milhões de pessoas do nosso país, e despertar, em quem vive melhores condições, a noção de responsabilidade social e ambiental.

9- "Respeita Januário", por Alex Maia

Introdução transcrita da sanfona de Gonzaga para os baixos do violão. Nesse arranjo, eu quis reforçar a conexão entre o blues americano e o xote e o baião do nordeste, que tem harmonias parecidas -aquela história da tônica, dominante e subdominante caminhando como harmonia- e sempre muito simples, mas com muita personalidade.

10- "Óia Eu Aqui de Novo", por Carol Andrade

Fechamento do álbum… Ou um convite para escutar tudo novo? Essa canção tem a energia e o bom humor nordestino que envolve qualquer um! Adoro esse momento: "Vai, chama Maria, chama Luzia! Vai, chama Zabé, chama Raqué!" Ninguém pode ficar de fora! Então, vai lá, chama todo mundo pra escutar o Grande Sertão: Gonzaga!

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.