O Mundo É uma Bola

O Mundo É uma Bola - Luís Curro
Luís Curro

Pia pede 'jogo bonito', mas contra França brasileiras mal dominaram a bola

Em derrota na Copa do Mundo, treinadora sueca acerta no conceito e erra no 'timing'; era partida para dar chutão

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Deu-me um pequeno nó na garganta a derrota da seleção feminina para a França, em Brisbane (Austrália), na segunda partida das equipes na Copa do Mundo da Oceania.

Não pelo resultado em si, pois não é uma aberração o Brasil, oitavo do ranking da Fifa, não ganhar das francesas (quintas na lista); aliás, é praxe não vencer, já que as de uniforme azul jamais caíram ante as bazucas em 12 confrontos.

O que incomodou foi o jeito. Mais de um.

A técnica Pia Sundhage olha para a jogadora Mônica depois da derrota por 2 a 1 do Brasil para a França na segunda rodada do Grupo F da Copa do Mundo
A técnica Pia Sundhage com jogadoras brasileiras depois da derrota por 2 a 1 para a França na segunda rodada do Grupo F da Copa do Mundo - Dan Peled - 29.jul.2023/Reuters

Quando a zagueira e capitã Renard, de 1,87 m, colocou a França novamente em vantagem e definiu o 2 a 1, a equipe brasileira estava melhor.

Não parecia tão difícil naquele momento, diante de um rival de respeito mas que transparecia certo cansaço, segurar o empate, que seria ótimo pois manteria o Brasil à frente das europeias no Grupo F.

O modo como Renard marcou me deixou pasmo. Quando a gigante francesa –a mais alta brasileira em campo era a zagueira Lauren, com 1,78 m– cabeceou para as redes da goleira Lelê, ela estava livre de marcação. Escandalosamente livre.

Perdoem-me a técnica Pia Sundhage e as jogadoras, porém não é uma falha aceitável. Renard pode fazer gol de cabeça, até porque é um dos pontos fortes dela, desde que tenha o mérito de ganhar, na impulsão, de uma ou mais brasileiras.

Sem marcação alguma –quando Andressa Alves decidiu ir atrás da rival já era tarde–, a carrancuda Renard fez aquele gol que, como diziam os locutores de antigamente, "até a minha avó faria".

Nas costas de Antônia, a capitã da França, Renard, cabeceia para fazer o segundo gol contra o Brasil, em Brisbane, na Copa do Mundo
Nas costas de Antônia, que não a marcava, a capitã da França, Wendie Renard, cabeceia após escanteio para fazer o segundo gol contra o Brasil, em Brisbane, na Copa do Mundo - Franck Fife - 29.jun.2023/AFP

Como declarou Lelê, esse gol teve um sabor "revoltante", porque "não dá para errar nesse ponto", lembrando que o time estava preparado para conter essa jogada.

É inconcebível haver um "apagão" assim da seleção, ainda mais em uma Copa do Mundo.

Renard deveria ter marcação dupla em todo lance de bola parada no ataque francês. É questão de sobrevivência para a defesa.

Depois do jogo, a sueca Pia reconheceu, sem mencionar nomes, que a defesa falhou. Frisou, entretanto, que esse erro não foi o mais grave, e sim a falta do "jogo bonito brasileiro".

Só que ela está errada. Muito errada. E olhe que não há ninguém mais fã de futebol arte (com chapéus, canetas, dribles da vaca etc.), seja do Brasil ou não, do que eu.

O problema é que, diante das francesas, na maior parte da partida, principalmente na metade inicial, as brasileiras mal conseguiam ficar com a posse da bola.

O primeiro tempo foi de amargar para a equipe nacional. A França pressionou o tempo todo a saída de bola, de forma competente, o que ocasionou seguidos erros de passe do Brasil.

A volante Luana, do Brasil, usando a camisa amarelo de número 5, tenta fugir da marcação francesa na partida em Brisbane pela Copa do Mundo
A volante Luana tenta fugir da marcação francesa; brasileiras tiveram dificuldade enorme para sair jogando com troca de passes desde a defesa na partida em Brisbane pela Copa do Mundo - Xiong Qi - 29.jul.2023/Xinhua

As zagueiras e meio-campistas, cercadas por duas ou três atletas de azul, não tinham tempo para pensar. Como, então, jogar bonito, "com mais alegria", conforme pregou Pia, nessa circunstância?

Sem chance de felicidade assim. O desafio imediato era árduo: evitar perder mais bolas, a fim de impedir que as francesas começassem a investida já próximas da meta de Lelê.

Ficou muito evidente que essa seleção brasileira, quando pressionada ao iniciar o ataque a partir da defesa, não tem condição técnica para fazê-lo. Ou, se tem, faltou treinar mais. Pois, tentativa após tentativa, não deu certo. Era desesperador.

Qual minha sugestão ao se deparar com essa situação? Tenho duas.

A primeira é o chutão, em baixa no esporte e odiado por muita gente (como Guardiola e Fernando Diniz).

Despachar a redonda para a frente e as atacantes que se virem para, na disputa com as defensoras, levar vantagem na corrida ou dominar a bola e tentar criar algo ou cavar uma falta. Às vezes funciona.

A segunda é passar o problema para o adversário.

Dar um chutão (olha ele aqui de novo) para o mais longe possível (até para a goleira) e fazer, o Brasil, a marcação por pressão. Dificultar o começo de jogada das oponentes, forçá-las a um erro não forçado. Às vezes funciona.

As duas alternativas são factíveis e fáceis de serem viabilizadas com algum treino.

O que não dá é para sofrer um tempo inteiro –na segunda etapa foi menos pior, pois a pressão francesa perdeu intensidade– pela falta de capacidade de trocar passes rápidos e precisos na defesa.

O Brasil, mesmo com esse revés, depende só de si para se classificar para as oitavas de final.

Para isso, terá, a fim de não ter de contar com uma improvável derrota da França para o frágil Panamá, de derrotar a Jamaica na quarta-feira (2).

A seleção de Pia entrará como favorita e, felizmente, não terá de encarar marcação por pressão. Espera-se que a Jamaica se feche na defesa e contra-ataque.

O Panamá jogou assim contra as brasileiras e levou de 4 a 0. As jamaicanas, no entanto, tiveram sucesso ao segurar a França (0 a 0).

Que Pia ache soluções para vazar a empolgada Jamaica, que neste sábado passou pelas panamenhas (1 a 0). Com gols, boa vantagem no placar e a vaga assegurada, aí dá para querer jogar bonito.

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