Políticas e Justiça

Editado por Michael França, escrito por acadêmicos, gestores e formadores de opinião

Políticas e Justiça - Michael França
Michael França

Inclusão de pessoas com deficiência no trabalho ainda enfrenta resistência de empresas

Mundo corporativo precisa superar barreiras estruturais para inserção efetiva de pessoas com deficiência em sua rotina

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Carlos Eduardo Ferreira

é advogado no Araúz Advogados, especialista em direito do trabalho e processo do trabalho pela Escola da Associação dos Magistrados do Trabalho do Paraná, e graduado em Direito pelo Centro Universitário Franciscano do Paraná

Inclusão ainda é um debate que perpassa vários níveis de discussão no Brasil, sendo necessário pensar constantemente em novas atitudes inclusivas e não excludentes para pessoas com deficiência. Mas, apesar de avanços significativos, ainda nos deparamos com uma barreira preocupante: a resistência de empresas em relação ao cumprimento de cotas legais para esses trabalhadores.

Nosso país conta com mais de 17 milhões de pessoas com deficiência, isto é, 8,4% da população acima de dois anos, segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019. Assim, conforme o art. 93, da Lei Federal n.º 8.213/91, empresas com cem ou mais empregados devem preencher de 2% a 5% dos cargos com pessoas com deficiência habilitadas ou beneficiários reabilitados.

Carlos é um homem branco de cabelos lisos, olhos escuros e barba. Na imagem em preto e branco, ele veste paletó e gravata
Carlos Eduardo Ferreira é advogado no Araúz Advogados. Especialista em direito do trabalho e processo do trabalho pela Escola da Associação dos Magistrados do Trabalho do Paraná. Graduado em direito pela FAE (Centro Universitário Franciscano do Paraná) - Divulgação

No entanto, algumas empresas têm apresentado "dificuldade" no cumprimento dessa cota. Ao exigir experiência nas funções, domínio e conhecimento em atividades específicas, conhecimento em outras línguas, disponibilidade para trabalhar em turnos, entre outros requisitos, que acabam desqualificando a maioria dos trabalhadores com deficiência e dificultam a inclusão social. Ainda temos, talvez, a ideologia de incapacidade desses trabalhadores, uma barreira ainda mais crítica.

Dificuldade em estabelecer quais as vagas para pessoas com deficiência (assim como a baixa atratividade em função da qualidade "ruim" das vagas para pessoas com deficiência), resistência dos gestores e pouco apoio da liderança para a contratação do perfil, são algumas das situações encontradas nas rotinas das empresas.

Além disso, com o intuito de afastar a sua obrigação, muitas empresas realizam a divulgação de vagas na tentativa de preencher a cota ou justificar que não há mão de obra suficiente no mercado de trabalho. Indo além da mera divulgação das vagas, algumas empresas demonstram complicações na identificação e mapeamento interno sobre as suas atividades e o que o mercado pode oferecer, sendo que a dificuldade no cumprimento da cota está enraizada como um problema estrutural no mundo corporativo.

Pensando nisso, o Ministério Público do Trabalho e a Justiça do Trabalho vêm atuando incisivamente para impor às empresas o cumprimento efetivo da cota, considerando a "resistência" de alguns empregadores.

Além da aplicação de multa por descumprimento do empregador —podendo ser de R$ 3.100,06 até R$ 310.004,70 por profissional não contratado—, a Justiça do Trabalho também aplica multas a título de dano moral coletivo.

Ademais, sob a forma da lei, a Instrução Normativa n.º 98/2012 garante o acesso às etapas de recrutamento, seleção, contratação e admissão, capacitação e ascensão profissional, sem ocorrência de exclusões com base na deficiência ou na condição de reabilitado, tendo como parâmetro as reais potencialidades individuais e as habilidades requeridas para a atividade.

Isto posto, é importante ressaltar um elemento em alta no processo de inclusão de pessoas com deficiência em empresas: a adoção de uma postura atitudinal ativa. Imprescindível para consolidar a inclusão, empresas devem adotar medidas efetivas com a intenção de reduzir as barreiras de exclusão enfrentadas por pessoas com deficiência para trabalhar, além da adequação do meio ambiente do trabalho, com uma mudança de paradigma e adaptações para acessibilidade desses profissionais.

Não estamos afirmando que o descumprimento da cota é uma culpa exclusiva da empresa, já isto é resultado de uma sociedade historicamente estruturada pelo capacitismo, exclusão e segregação, contudo, há a necessidade de comprovar que a empresa está se adequando para sua função social. Aprimorar os processos e criar um ambiente acessível é importante, mas transformar a visão e a cultura organizacional dentro das empresas para que todos entendam o potencial das pessoas com deficiência é essencial.

Existem inúmeras formas de empresas cumprirem a cota, como a avaliação interna ou criação de projetos e parcerias, no entanto, esse deveria ser apenas um mero detalhe e não o elemento que motiva a contração da pessoa com deficiência. Inclusão social da pessoa com deficiência é um tema sensível e que precisa de atenção, sendo cada vez mais oneroso para a empresa a não contratação desses trabalhadores.

O editor, Michael França, pede para que cada participante do espaço "Políticas e Justiça" da Folha sugira uma música aos leitores. Nesse texto, a escolhida por Carlos Eduardo Ferreira foi "Maior Que As Muralhas", de Fresno.

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