Que imposto é esse

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Que imposto é esse - Eduardo Cucolo
Eduardo Cucolo
Descrição de chapéu
Flávia Bortoluzzo e Filipe Luis de Paula e Souza

A grama de outros países é mais verde quando falamos de transação tributária?

Uma comparação entre os modelos brasileiro, americano, britânico e italiano

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Flávia Bortoluzzo

Sócia da LBZ Advocacia. Especialista em Tributário pelo IBET e MBA cursado na Fipecafi. É associada ao IBATT (Instituto Brasileiro de Arbitragem e Transação Tributárias)

Filipe Luis de Paula e Souza

Coordenador da LBZ Advocacia. Advogado e Administrador Judicial. Associado ao TMA Brasil (Turnaround Management Association) e ao IBATT

A transação tributária tem se tornado um instituto cada vez mais relevante na relação entre Fisco e contribuintes, dadas suas características de celeridade e efetividade na solução do endividamento tributário, evitando o prolongamento de processos —algo arraigado na cultura brasileira— e reduzindo os custos da máquina pública na cobrança do crédito tributário.

No Brasil, a transação tributária foi regulamentada recentemente e a lei trouxe inovações importantes para o sistema tributário. Apesar de jovem por aqui, institutos semelhantes são utilizados com grande sucesso em outros países, como é o caso dos Estados Unidos, que inspiraram nosso modelo, assim como o Reino Unido e a Itália.

Nesse contexto, é sempre saudável dar uma "espiada na grama dos vizinhos" para que seja possível aprender com as diferenças, valendo-se do exercício comparativo, de forma a contribuir para o seu aprimoramento, mas acima de tudo, na tentativa de promover uma cultura de maior diálogo e negociação entre o Fisco e os contribuintes.

Mulher com blusa branca
Flávia Bortoluzzo, sócia da LBZ Advocacia - Divulgação

Importante destacar que a legislação brasileira prevê três modalidades de solução alternativa de conflitos fiscais: o negócio jurídico processual, a transação individual e a transação por adesão.

A transação tributária no Brasil apresenta-se como uma alternativa para processos administrativos ou judiciais e permite que contribuintes possam regularizar suas dívidas, evitando as consequências da cobrança em dívida ativa.

Nestes países —Estados Unidos, Reino Unido e Itália—, institutos semelhantes à transação tributária também são utilizados.

Nos Estados Unidos, existe o "offer in compromisse", regulamentado pelo IRS (Internal Revenue Service), a agência federal responsável pela administração e aplicação das leis fiscais. O IRS desempenha um papel fundamental na formulação do "offer in compromisse".

O "offer in compromisse" é aplicável aos casos de cobrança de impostos ou negativa de deduções, sendo realizado por propostas do contribuinte ou do próprio IRS.

Uma das principais características do sistema norte-americano é a possibilidade de um acordo com menor valor, mas sua admissibilidade depende da análise criteriosa do IRS, que verifica se a proposta é adequada e se a dívida pode ser quitada na forma sugerida, com ampla discricionariedade para negociação, que pode ser feita individualmente ou por programas coletivos.

Homem de terno e gravata
Filipe Luis de Paula e Souza, coordenador da LBZ Advocacia - Divulgação

De acordo com dados do IRS, em 2020, foram recebidas 54.106 propostas, das quais 17.712 foram aceitas. Isso representa uma taxa de aceitação de cerca de 32,7% das propostas recebidas. No mesmo ano, o IRS arrecadou aproximadamente US$ 269,9 milhões com o instituto.[1]

No Reino Unido, por sua vez, o HMRC (HM Revenue & Customs) é a autoridade fiscal que organiza "time to pay". Esta agência governamental é responsável pela administração e aplicação das leis fiscais do país, assim como pelo controle aduaneiro.

O "time to pay", se destaca como um programa de renegociações administrado pelo HMRC, que permite aos contribuintes o pagamento da dívida tributária parcelada.

O processo começa com o contribuinte acionando o HMRC para solicitar seu "time to pay" e informar detalhadamente sua situação financeira e a natureza da dívida. Após análise do HMRC, poderá ou não haver o reconhecimento da elegibilidade do contribuinte para o acordo. O contribuinte que for apto a participar de um "time to pay" receberá um plano de pagamento personalizado.

Em 2020, o HMRC divulgou que havia recebido cerca de 8.000 solicitações de transação tributária, com um valor total de dívida tributária de cerca de £ 2,4 bilhões. O HMRC concedeu cerca de 6.000 acordos de transação tributária, totalizando cerca de £ 500 milhões em pagamentos de dívida tributária.[2]

A Itália também possui ferramentas semelhantes e que são conhecidas como "accertamento con adesione" e a "conciliazione fiscale", dois mecanismos que permitem a solução de controvérsias com a Agenzia delle Entrate, responsável pela administração e aplicação das leis fiscais do país, bem como pelo controle e supervisão das atividades econômicas.

No cenário das negociações entre Fisco e contribuintes italianos, o "accertamento con adesione", surge como um procedimento completamente extrajudicial, o contribuinte recebe uma notificação da Guardia di Finanzae, caso tenha interesse, deve aceitar, sem contestação, a correção proposta pela Agenzia delle Entrate.[3]

Por outro lado, na "conciliazione fiscale" existe, de fato, uma negociação. Nesse caso, o contribuinte contesta a correção proposta pela administração tributária e busca um acordo sobre os valores em disputa. Durante o procedimento de conciliação, as partes envolvidas negociam os termos do acordo que, uma vez alcançado, o contribuinte inicia o pagamento do valor acordado.[4]

A análise dos diferentes institutos acima revela a diversidade de abordagens. Em cada um a forma de solução de conflitos foi desenvolvida com base em cultura, valores e necessidades específicas, mas, acima de tudo, na relação de confiança existente entre Fisco e contribuintes. Assim, quanto maior a confiança, mais desenvolvido é o mecanismo.

A comparação leva à conclusão de que houve evolução, com melhorias significativas em relação ao modelo italiano. Porém, entre os modelos brasileiro, americano e britânico é evidente que ainda há espaço para aprimoramentos. A transação tributária individual, neste ponto, se mostra como a aposta mais certeira, pois representa o remédio correto para a dor existente em cada um dos contribuintes, devendo prevalecer sobre os programas por adesão que são mais genéricos e podem passar a falsa impressão de que são novos incentivos ao devedor contumaz.

[1] https://www.irs.gov/pub/irs-pdf/p55b.pdf
[2] https://www.gov.uk/government/publications/hmrc-annual-report-and-accounts-2019-to-2020
[3] https://www.agenziaentrate.gov.it/portale/web/guest/schede/accertamenti/contenzioso-e-strumenti-deflativi/accertamento-con-adesione-cont-strum-defl
[4] https://www.giustiziatributaria.gov.it/gt/web/guest/conciliazione-giudiziale

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