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Apertem os cintos... o diretor sumiu!

Departamento do patrimônio histórico (DPH) está acéfalo há 30 dias

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Douglas Nascimento
São Paulo (SP)

Não é de hoje que tenho a impressão de que a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo parece ter deixado de lado seu dever de zelar, estimular e difundir a cultura na capital paulista. Por mais que o entretenimento possa estar atrelado à cultura, a sensação que eu e muitos outros temos ao conferir o calendário da secretaria é que deixaram de se preocupar com a memória da cidade, se concentrando apenas em eventos mais direcionados ao entretenimento.

Priorizam apoios e/ou verbas para shows, como o Festival GRLS, os bloquinhos de carnaval e o festival de música The Town, em detrimento de museus com programações pífias, a vergonhosa e interminável restauração da Vila Itororó, além da lamentável situação de parte dos monumentos da capital paulista.

Aline Torres, secretária Municipal de Cultura da cidade de São Paulo, na sacada de seu gabinete no oitavo andar do edifício Sampaio Moreira, na rua Líbero Badaró, no centro de São Paulo. - Eduardo Knapp/Folhapress

Um bom exemplo deste descaso com a memória cultural paulistana é possível notar na longa vacância do cargo de chefia do órgão municipal fundamental para a defesa do patrimônio da cidade, o DPH (Departamento do Patrimônio Histórico), algo inédito na já longeva história deste departamento, criado em 1930 por Mário de Andrade e reformulado em 1975.

Sem Paixão, nem compaixão

Exonerado do cargo em 17 de fevereiro, Orlando Paixão era diretor do DPH desde dezembro de 2021. Sua indicação foi bastante polêmica por ser um autêntico "perdido no ninho", ou seja, alguém sem qualquer experiência para o cargo que passou a exercer, estando lá mais por ser próximo do prefeito Ricardo Nunes (MDB), o que nem de longe deveria ser a premissa para ocupar um cargo dessa importância, onde a experiência na área é fundamental para estudar tombamentos, deliberar sobre monumentos e outras questões intimamente ligadas à memória da cidade.

diretor
Orlando Paixão, diretor do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), exonerado em fevereiro de 2023. - Reprodução/Instagram @dph_sp

No oposto disso Paixão é conhecido e apresentado em suas próprias redes sociais como consultor e mentor de líderes, liderança que ao que indica jamais exerceu no órgão a qual foi nomeado para dirigir. Durante sua gestão foi notável o retrocesso que o departamento teve em suas atividades mais importantes.

A alta rotatividade de diretores do DPH é uma marca da atual gestão municipal, iniciada com o prefeito Bruno Covas, falecido em maio de 2021, e com a posse de seu então vice e atual prefeito Ricardo Nunes. Desde janeiro de 2021 passaram pelo cargo diretivo cinco pessoas, algo que torna impossível fazer qualquer planejamento de longo prazo acarretando na ineficiência do departamento.

Voltando a Paixão o que se fala pelas salas do Departamento de Patrimônio Histórico e Secretaria Municipal de Cultura é que sua queda se deu principalmente por sua morosidade no emblemático caso de tombamento do anexo do Espaço Itaú de Cinema e o Café Felini, na rua Augusta, cuja demora para dar prosseguimento na avaliação do caso no órgão demorou quatro meses, deixando por todo esse tempo a prefeitura vulnerável a críticas da imprensa, ativistas e munícipes. Apesar da exoneração ter acontecido em 17 de fevereiro, tenho fontes que afirmam que desde o início do referido mês Orlando Paixão não mais despachava.

Café Fellini, no anexo do Espaço Itaú de Cinema da rua Augusta
Café Fellini, no anexo do Espaço Itaú de Cinema da rua Augusta. Possível pivô da exoneração de Orlando Paixão. - Divulgação

Departamento acéfalo

A saída do diretor foi uma clara mostra da total falta de planejamento da atual gestão da Secretaria Municipal de Cultura nos assuntos culturais da cidade. Embora não seja uma regra, recomenda-se que ao exonerar alguém de um cargo tão importante já se tenha um substituto em mente, mas não foi o caso desta vez.

Prestes a completar 30 dias da publicação da exoneração no Diário Oficial do município, até agora ninguém foi indicado para o cargo. Tal morosidade é péssima para o DPH pois deixa servidores sem perspectivas e sem a liderança necessária para deliberar sobre o patrimônio histórico da cidade. Além da posição de diretor, estão vagos o cargo de assessor e o de secretário executivo do Conpresp.

A ausência de diretor causou indignação a alguns vereadores paulistanos, entre eles Toninho Vespoli (PSOL), que encaminhou para a coluna a seguinte declaração: "Há um bom tempo o patrimônio da nossa cidade tem sido entregue ao descaso pela administração pública. Em que pese a qualidade dos técnicos envolvidos, muitas vezes seus relatórios são colocados em segundo plano em detrimento de interesses econômicos e políticos. A memória da cidade sofre em ser preservada, vide recentemente o caso do Cine Augusta salvo devido a uma grande mobilização e, infelizmente, uma grande parcela da Vila João Migliari demolida na calada da noite devido a demora de implantação de seus processos. A ausência de uma diretoria, tornou-se a cereja do bolo de uma situação de descaso que se arrasta há anos em nossa cidade!".

Vila Itororó palco de restauração interminável que já se arrasta por três gestões municipais. - Keiny Andrade/Folhapress

Encaminhei diversos questionamentos à assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Cultura e até o fechamento deste texto não recebi qualquer resposta. O silêncio da secretaria é um sinal alarmante de que já passou da hora de vereadores preocupados com a cultura da cidade, bem como o Ministério Público, tomarem urgentes providências contra este descaso junto ao departamento responsável por gerir tombamentos e a preservação do patrimônio cultural da capital paulista.

Atualização 9/3/2023

Recebi ontem à noite as respostas da Secretaria Municipal de Cultura, a qual publico a seguir:

"A Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Cultura, informa que não há atraso, demora ou descaso na nomeação do novo diretor do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) e que o processo segue todos os trâmites legais em tempo normal.
O diretor anterior teve sua exoneração publicada em de 17 de fevereiro. A SMC encaminhou administrativamente, no primeiro dia útil após o recesso de Carnaval, a nomeação do novo diretor, e a mesma está em trâmite. Sobre a vacância de cargos, o cargo vago de assessor do DPH será preenchido assim que a nova direção assumir. A SMC irá aguardar a formalização em Diário Oficial para divulgar o nome do novo diretor.
A SMC ressalta que, mesmo durante esse breve período de transição, o DPH nunca deixou de cumprir com as suas obrigações com a cidade e com o munícipe, e todo o competente trabalho do órgão segue sendo realizado com dedicação pelo quadro de funcionários do Departamento. Portanto, não há qualquer indício de paralisação do DPH ou do CONPRESP.
A Prefeitura esclarece também que não recebeu o ofício do vereador citado pela reportagem."

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