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Bolsonaro no JN e a batalha nas redes sobre o MEC

Acompanhamos como perfis do twitter reagiram quando o assunto da entrevista foi educação

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São Paulo
Ilustração mostra várias pessoas, de diferentes raças e gêneros, navegando na internet e interagindo por meio das redes sociais usando dispositivos portáteis (smartphone).
Meyrele Nascimento/SoU_Ciência

Como era de se esperar, as redes sociais estiveram em polvorosa durante a entrevista de Jair Bolsonaro ao Jornal Nacional, nesta última segunda-feira. O SoU_Ciência analisou especificamente os tweets e memes relacionados à entrevista quando o tema abordado foi Educação: MEC, a indicação e troca de ministros e o afastamento e prisão de Milton Ribeiro devido ao esquema de corrupção.

Para quem não assistiu à entrevista na Globo, vale destacar que entre os ministros dos quais Bolsonaro se orgulha em seu governo, e por ele foram citados, não houve menção a qualquer ocupante das pastas de Educação ou Saúde. E não foram poucos a passar por esses ministérios: 5 na Educação e 4 na Saúde. Ou seja, constituiu-se no atual governo um cenário de instabilidade e incompetência em duas áreas mais do que fundamentais para o país e para nós cidadãos, especialmente na conjuntura que vivemos de pandemia associada a múltiplas crises.

Na entrevista do Jornal Nacional, quando tocou no assunto, Renata Vasconcellos perguntou: "Educação é um tema importantíssimo para o futuro do Brasil. No seu governo o senhor indicou 5 ministros diferentes, um deles caiu pelo escândalo de ter beneficiado pastores com dinheiro da Educação, a seu pedido. Qual a dificuldade de escolher um bom Ministro da Educação?". Ao que Bolsonaro respondeu: "Muitas vezes, depois que a pessoa chega, a gente vê que não leva jeito para aquilo".

Renata Vasconcellos insistiu, depois de listar o perfil dos ministros escolhidos e demitidos - um caiu por escândalo, outro fugiu do Brasil depois de insultar o Supremo, outro maquiou o currículo e o último caiu por corrupção: "Quais os critérios para escolher um Ministro de uma área tão vital para o futuro do país?", insistiu a âncora. A resposta mais uma vez soou em tom de lamento, recorrendo novamente à metáfora predileta do casamento: "As pessoas se revelam quando chegam… como um casamento muitas vezes, mas acontece…".

Questionado sobre o caso de corrupção, Bolsonaro disse que o Ministro foi afastado e que "começou a investigar o caso com CGU (Corregedoria Geral da União)" – contudo, não comentou que a própria CGU encerrou o caso por falta de provas e este só foi reaberto e a investigação aprofundada depois de reportagem da Folha de S.Paulo baseada em denúncia de prefeitos. Bonner retornou ao "escândalo do MEC", ao que Bolsonaro rebateu irritado: "Cadê o duto do dinheiro vazando ali? Cadê o dinheiro?". Bonner reagiu: "Não sei", ao que Bolsonaro replicou de imediato: "E está me acusando? [se não sabe onde está o dinheiro]".

O mapeamento abaixo, de uma das redes sociais mais usadas em tempo real naquele momento, permite afirmar que o mote em defesa de Bolsonaro será insistir nessa tecla.

Gráfico mostra uma coleta de informações realizada no Twitter pelo método Louvain, no dia 22/8, entre 20:30 e 22 horas com o termo: Bolsonaro + (Educação, MEC, Milton Ribeiro).
Coleta realizada no Twitter pelo método Louvain, no dia 22/8, entre 20:30 e 22 horas com o termo: Bolsonaro + (Educação, MEC, Milton Ribeiro). Mapeados 9460 tweets de 7952 perfis. Comunidade 1 (vermelha) pró-Bolsonaro. Comunidade 2 (verde) crítica a Bolsonaro. Em cinza, postagens que pouco interagiram com as duas comunidades. - Grafo produzido por Nelson de Almeida Passos/pesquisador SoU_Ciência

Os tweets mais replicados entre bolsonaristas (em vermelho no grafo) apenas repetem os bordões: "Cadê o duto?", "Cadê o dinheiro?", o "Bonner não sabe". Ou seja, não vão além das próprias falas do candidato. Ao que se segue, em geral a hashtag #globolixo. Interessante notar que a reação bolsonarista naquele momento da entrevista esteve concentrada em apenas dois perfis, com alta capacidade de replicação (alcançaram 51% dos retweets em defesa do presidente). Não há posições vivas ou analíticas. Enquanto na reação de oposição, em verde, são múltiplas vozes, formando uma rede com maior organicidade, mas que chegou apenas a 39% de reação crítica. Outros 10% pouco interagiram com as outras duas comunidades (em cinza no grafo).

Os dois influenciadores bolsonaristas que atuaram no tema neste momento e dominaram a reação foram Bernardo Küster e o perfil Brazil Fight. Küster é um youtuber olavista e negacionista com quase 1 milhão de seguidores, que se apresenta como diretor do jornal digital "Brasil sem medo", autointitulado "o maior jornal conservador do Brasil". Küster teve sua contratação anunciada pela Jovem Pan que depois recuou e afirmou que ele não teria condição de ser chamado pela emissora "nem como convidado, em nenhum programa". A CPI da Pandemia recomendou o indiciamento de Küster por fake news e incitação ao crime. A segunda conta com maior retweet foi @Brazilfight do perfil "FamíliaDireitaBrasil", que se apresenta como: "Brasileiros e patriotas, reunindo os que querem combater a narrativa esquerdista" e conta com 320 mil seguidores no twitter. O perfil foi criado logo após a posse de Bolsonaro, em 2019, como outros, como artilharia na guerra cultural, como revela o nome em inglês "Brasil Fight", da família brasileira em luta contra a esquerda.

Na rede de oposição a Bolsonaro, em verde, as mensagens mais replicadas reiteraram o escândalo do MEC em um governo que se diz sem corrupção, o ataque e descaso com a Educação, a repetição de mentiras etc. Os principais tweets estão diluídos entre doze perfis: "Jairmearrependi", que surgiu para mostrar posts de eleitores de Bolsonaro arrependidos; do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP); do deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ); do coletivo de esquerda negro "Quebrando o tabu"; do canal "Eixo político", coordenado por cientista político da UnB; Mateus Gomes, candidato negro a deputado estadual pelo PSOL-RS e mestre em história pela UFRGS; do jornalista e pesquisador da FGV Thomas Traumann; do ativista negro Zé Gotinha; dos jornalistas Ricardo Noblat, André Shalders e Andreia Sadi; e da Folha de S. Paulo com um tweet "Relembre o escândalo do MEC citado por Bonner".

O padrão de compartilhamento da oposição foi mais coletivo, fragmentado e com muito mais nós na rede, demonstrando maior organicidade e naturalidade. Já o padrão de compartilhamento pró-Bolsonaro é massivo, pouco plural e mais automatizado (por bots ou perfis disciplinados para isso). Essas características mostram duas formas de uso da rede e de táticas de retransmissão distintas, que talvez reflitam o modo diferente de ver e exercer a política e a opinião de cada polo.

No Instagram, a guerra de memes no tema da educação durante a entrevista do JN foi inicialmente vencida por Anitta contra Bolsonaro. Ela divulgou a "cola" escrita na mão do presidente durante a entrevista (real), mas alterada digitalmente, com a frase "defender corrupto no MEC" e que alcançou mais de 200 mil curtidas. No dia seguinte, contudo, a cantora apagou o post e foi elogiada por Bolsonaro, mostrando que a batalha nas redes será intensa e mais uma vez importante para a formação das ondas de excitação nas bolhas em choque nesta frente de batalha digital.

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