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Universalização da educação básica pública em tempo integral

Aproveitaremos a dinâmica demográfica ou o Brasil perderá mais esta oportunidade

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São Paulo (SP)
Em um fundo bege claro, no alto há os ponteiros e traços de horas de um relógio, marcando 9 em ponto, abaixo e de ambos os lados há uma série de barras de cores e padrões diferentes arranjadas de forma irregular e sem se tocarem no meio da composição.
Meyrele Nascimento/SoU_Ciência

No Brasil, apenas 18,2% dos estudantes da educação básica pública brasileira têm acesso à educação em tempo integral, segundo dados do Inep. Na região norte, este número é de apenas 8,4%. Embora o Plano Nacional de Educação (PNE) tenha estabelecido a tímida meta de 25%, tudo indica que haverá um fracasso retumbante em sua realização. E isso, infelizmente, não surpreende, visto que o país não atingiu a meta de 46 indicadores entre os 52 monitorados pelo Inep.

Ainda que a Constituição estabeleça a todos os brasileiros o direito à educação em igualdade de condições, na prática a luta em torno dos fundos públicos e as políticas fiscais têm causado perdas importantes para as políticas sociais, dentre elas a educação.

Os dados mostram que o Brasil tem uma educação básica pública subfinanciada. Investimos 3.826,00 dólares PPP (Paridade no Poder de Compra) por aluno/ano, ao passo que a Argentina investiu 4.355,00, a França 10.346,00 e os Estados Unidos 13.208,00. Cada estudante estadunidense contou com 3,5 vezes mais recursos do que os estudantes brasileiros. E, mesmo assim, alguns analistas insistem em comparar as notas obtidas por nossos estudantes no PISA com a de seus colegas estrangeiros, sem considerar o abismo que existe entre suas realidades.

É importante salientar que os países com melhor classificação no PISA contam com escolas de tempo integral para a maioria de seus estudantes, enquanto isso o Brasil ainda luta para colocar todas as crianças na escola por pelo menos quatro horas, o que obviamente tem impacto nos resultados dos testes de aprendizagem. Mas o silêncio sobre esse fato é ensurdecedor.

Uma boa notícia é que o Brasil pode ser beneficiado pelo bônus demográfico que se avizinha. A composição demográfica brasileira, revelada pelo último Censo de 2022, mostra uma redução no número brasileiros na faixa etária de escolarização básica. Desse modo, um pequeno aumento no investimento poderá elevar a receita por aluno da educação básica, favorecendo o processo educacional brasileiro.

O ritmo de crescimento populacional vem diminuindo nas últimas décadas e, desde 2018, o Brasil vem reduzindo o tamanho da população entre 0 e 17 anos, alvos prioritários da política pública de Educação Básica. Segundo projeções, em 2028 todas as séries dos anos iniciais do Ensino Fundamental demandarão menos matrículas, o mesmo ocorrerá para as séries finais em 2032 e para o ensino médio em 2035.

Os dados mostram que houve uma redução nas matrículas da educação básica pública entre 2007 (41,196 milhões) e 2022 (35,383 milhões). Em termos de matrículas em tempo integral, houve ampliação nesta modalidade, entretanto, muito inferior ao necessário, conforme mostra o Gráfico 01 a seguir:

Gráfico mostra aumento no percentual e na quantidade de matrículas no ensino em tempo integral e a correspondente diminuição no percentual e na quantidade de matrículas no ensino em tempo parcial.
Gráfico 01: Matrículas da educação básica pública. Tempo parcial x integral. Brasil, 2007-2022. - Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados do LDE e Inep.

Buscamos elaborar um modelo de cálculo para dimensionar o investimento necessário para universalizar a educação básica em tempo integral para a rede pública, considerando que a educação básica obrigatória e gratuita deve ser oferecida dos 4 aos 17 anos de idade, nos termos do Inciso I do Art. 4º da Lei 9.394/1996 (LDB).

Segundo o programa ‘Escola em tempo integral’ do MEC, o custo projetado para incluir 1 milhão de estudantes no ensino integral em 2023 será de 4 bilhões por ano. Empregando este volume de recursos como referência, é possível aferir que, em média, a transformação de uma vaga de educação básica oferecida em turno parcial para turno integral demanda um investimento adicional de R$ 4.000,00 por matrícula ao ano, valor coerente com o definido na Portaria Interministerial nº 2, de 19 de abril de 2023 que estabeleceu o do Valor Aluno Ano Fundeb (VAAF).

Em uma projeção para o ano de 2030, será necessário converter quase 26 milhões de matrículas em tempo parcial (25.866.656) para matrículas em tempo integral. Considerando o valor de referência, a universalização da educação básica dos estudantes entre 4 e 17 anos demandará um investimento adicional de R$ 103,5 bilhões/ano (R$ 103.466.625.023,42).

O PIB brasileiro de 2022 foi de R$ 9,9 trilhões. Isto indica que o investimento necessário para a universalização do ensino em tempo integral, representaria aproximadamente 1,05% do PIB/2022.

Se por um lado, os dados mostram que a ampliação de 1,05% do PIB para a educação seria capaz de colocar TODOS OS ESTUDANTES DA EDUCAÇÃO BÁSICA DE 4 A 17 ANOS na escola em tempo integral, por outro, o Senado Federal, com apoio público do comandante da Marinha, está analisando a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 55/2023 que propõe que a União destine "anualmente, percentual igual ou superior a 2% (dois por cento) do valor apurado no PIB no exercício anterior" ao Ministério da Defesa, o que representa um aumento no orçamento da ordem de 1 % do PIB brasileiro para o Ministério da Defesa.

Esta é uma daquelas encruzilhadas que definem uma nação: para onde deve ir este 1% do PIB? Para o Ministério da Defesa ou para o ataque àquele que deveria ser considerado o principal problema nacional? Como diria disse Julio Cesar Strassera: "Esta es nuestra oportunidad y quizá sea la última.

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