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Vende-se: o futuro do Brasil

Os perigos de privatizar as escolas estaduais

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uma crinça de costas usando uma mochila com uma etiqueta pendurada
SoU_Ciência - Meyrelle Nascimento

A privatização está na ordem do dia, e não é de hoje. Privatizar as estradas, o saneamento, as praias e as escolas. O mito da ineficiência estatal ressoa nas justificativas que prometem soluções miraculosas para problemas crônicos no sistema educacional, terceirizando aquilo que é um direito da população e um dever do Estado, garantido pela Constituição Federal.

No contexto atual, é necessário entender que privatização, concessão e terceirização são variações de um mesmo vocabulário; ou seja, trata-se de esforço político neoliberal de diminuição extrema das estruturas do Estado em favor do interesse privado. Agilidade e eficiência são apenas promessas, nunca comprovadas, diga-se, mas os altos custos para a população certamente se apresentam, seja nas taxas cobradas diretamente dos usuários, seja nos subsídios dos recursos públicos direcionados a empresas com fins de lucro.

Projetos como o programa de Parceria Público Privada (PPP) "Educação Novas Escolas", do governo de São Paulo, e o Projeto de Lei n. 345/2024, do governo paranaense, caminham juntos nessa direção, resguardadas as especificidades. Tarcísio de Freitas pretende leiloar 33 novas escolas a serem construídas e administradas por empresas privadas, enquanto Ratinho Júnior intenta terceirizar para a esfera privada a gestão de 204 escolas já em funcionamento, ambos ancorando-se numa desconexão fantasiosa entre administração escolar e gestão do ensino.

Com o argumento de que o Estado fracassa na oferta de serviços públicos de qualidade, essas administrações buscam com tais medidas transferir para o setor privado parcelas significativas das atividades pedagógicas próprias das escolas públicas, mercantilizando-as. As empresas privadas serão responsáveis pela administração escolar e por atividades como limpeza, merenda, matrículas, material didático e gestão do trabalho dos funcionários, todas classificadas como burocracia pelos governos.

Contudo, a Constituição Federal determina que os recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) devem ser destinados, conforme o próprio nome indica, para financiar ações de Manutenção e Desenvolvimento da Educação (MDE) básica pública (Art. 211, §§ 2º e 3º), e o Art. 77 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional determina que "os recursos públicos serão destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas" desde que respeitem algumas condições, entre as quais, que comprovem finalidade não lucrativa.

Na prática, os projetos dos governos estaduais transferem a administração dos recursos públicos a entidades privadas, uma vez que usarão os recursos públicos de MDE para pagar pelo lucro que os donos dessas empresas esperam colher, razão de existir de qualquer empresa privada no capitalismo.

A pergunta que fica é: como dissociar todo o funcionamento do ambiente escolar do ensino ali realizado? Parece impossível. E é! A escola, seus funcionários e seus alunos ficarão reféns do interesse privado.

E quando os interesses da empresa diferirem dos interesses do corpo pedagógico? Por exemplo, o que acontecerá quando a aquisição de materiais para a realização de uma feira de ciências não for considerada um gasto "útil" pela lógica do mercado?

Iniciativas como essas já foram empreendidas em outros países, e fracassaram. Não faltam exemplos como o dos Estados Unidos ou o da Suécia.

Criar diferenciação no âmbito da educação pública — umas escolas militarizadas, outras de Educação Integral, outras administradas pela iniciativa privada etc. —, inclusive aportando recursos desiguais para o seu financiamento, promove exatamente o contrário de um acesso universalizado e equitativo para crianças e jovens brasileiros que devem ter seu direito à educação garantido pelo Estado. A terceirização dos serviços, além de cindir o pedagógico do administrativo, produz desigualdades para a população usuária e trabalhadora das redes públicas.

O Brasil precisa assumir definitivamente o compromisso político e social com a escola pública, visto ser esta a instituição que materializa o direito de todos à educação gratuita e de qualidade socialmente referenciada e democrática. Essa responsabilidade é do Estado, que deve ser eficiente e não transferir tal dever a nem um ente privado.

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