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Caderneta da criança é lançada sem teste de rastreio de autismo

Falta foi criticada, e Ministério da Saúde promete voltar com o teste

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Johanna Nublat

Um teste simples de rastreio de autismo foi excluído da caderneta da criança, cuja última edição foi lançada pelo Ministério da Saúde no último dia 5.

A ausência da escala M-CHAT-R, uma ferramenta usada no Brasil e internacionalmente, foi percebida por especialistas em autismo e virou alvo de críticas nas redes sociais.

Procurado pelo blog, o Ministério da Saúde afirmou que o teste será recolocado numa nova versão da caderneta a ser publicada nos próximos dias e que ele também estará presente na caderneta da criança que, no curto prazo, estará disponível no aplicativo "Meu SUS digital".

O teste faz indagações simples, que podem ser facilmente respondidas por pais, avós, professores e profissionais da saúde. O resultado não é um diagnóstico, mas pode apontar para uma suspeita e uma necessidade de maior observação da criança ou de intervenção.

Capa da caderneta da criança mostra desenho de adultos e crianças em volta de uma roda
Caderneta da criança lançada em 2024 pelo Ministério da Saúde - Divulgação

"A grande importância do M-CHAT para a caderneta é justamente que ele não é uma tabela de observação de desenvolvimento, mas escala de triagem de TEA [Transtorno do Espectro Autista]. É o que ele tem a acrescentar de forma definitiva, porque olhar para o desenvolvimento é importante, mas o autismo está na atipicidade do comportamento que pode aparecer como habilidade, mas que muda de frequência e apresentação", afirma Poliana Martins, mãe atípica, mestre e doutoranda em psicologia e cognição, e especialista em autismo precoce.

Ela continua: "Por exemplo, no M-CHAT existem perguntas que nenhuma tabela de desenvolvimento apresenta como de comportamentos regulatórios e estereotipias (item 18, sua criança faz movimentos estranhos perto dos olhos?) e comportamentos de atenção compartilhada (item 23, sua criança olha no seu rosto sua reação para conferir sua reação quando vê algo estranho?). Ele também tenta triar comportamentos sensoriais peculiares (item 11, seu filho já pareceu muito sensível ao barulho?). Se as famílias ou médicos têm acesso à triagem na caderneta, elas não precisam saber sobre autismo, apenas aplicar os itens".

Em uma primeira entrevista, nesta terça-feira (16), o secretário de atenção primária à saúde do Ministério da Saúde, Felipe Proenço, afirmou que o M-CHAT saiu da caderneta para priorizar outros conteúdos sobre o desenvolvimento infantil que seguem presentes no material, mas que a avaliação precoce dos sinais do TEA seguia uma prioridade e que a pasta está trabalhando pela capacitação e difusão do uso do M-CHAT entre profissionais do Mais Médicos e de programas de saúde da família.

Numa segunda conversa, algumas horas depois, Proenço disse que uma reunião na própria terça (16) definiu os novos passos para a caderneta da criança que será disponibilizada pelo aplicativo "Meu SUS digital" e que, ali, o M-CHAT estará disponível de maneira interativa e conectada com o serviço e os profissionais de saúde. Além disso, completou, o M-CHAT será recolocado na versão em PDF da caderneta disponível no site do ministério, o que, segundo ele, deve ocorrer nos próximos dias.

Informação errada sobre o diagnóstico

Ao mesmo tempo em que questionaram a mudança na caderneta da criança, especialistas em autismo criticaram uma publicação do governo federal com informação incorreta sobre o diagnóstico do autismo.

Em uma postagem feita em uma rede social, no dia 2 de abril, Dia Mundial da Conscientização do Autismo, o Ministério da Saúde afirmou que, apesar de os sinais de autismo aparecerem nos primeiros meses de vida da criança, "o diagnóstico é feito a partir dos 3 anos de idade".

A informação está incorreta, já que não existe uma idade mínima para o diagnóstico de autismo.

Poliana Martins classifica como "muito grave" a divulgação da informação errada pelo ministério.

"As pesquisas longitudinais mais recentes que mensuram a estabilidade diagnostica do TEA mostram que aos 14 meses o diagnóstico de autismo é estável, ou seja, essa avaliação clínica é provavelmente definitiva para a maioria das crianças dessa idade", diz. "A precocidade da intervenção é o principal fator de prognóstico de autismo, mas, quando o próprio Ministério da Saúde diz que o diagnóstico é aos três anos, ele reafirma a crença de que poderíamos aguardar para que atrasos do desenvolvimento se resolvessem sozinhos, o que está exatamente na contramão dos maiores órgãos de desenvolvimento infantil que preconizam por intervenção precoce frente a qualquer dúvida sobre o desenvolvimento."

Por fim, diz ela, esse erro tem consequências práticas na vida das famílias. "Para a maior parte das pessoas, o acesso ao tratamento é a partir do diagnóstico (seja pelo SUS, seja pelo convênio), e essa informação diz para a sociedade que até os três anos elas não terão acesso ao documento que dá acesso ao tratamento."

Quando questionado sobre a informação incorreta, o Ministério da Saúde afirmou que a postagem foi um "engano". Ela foi removida após questionamento do blog na segunda-feira (15).

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