Raiva. Protesto. Panelaço.
Para alguns setores de opinião, o momento é de reagir.
Elpídio era ex-sindicalista.
—Fim de linha para o Bolsonaro.
Uma conhecida emissora de TV dá a partida nos debates.
—Hora do panelaço monstro.
Elpídio ligou o seu velho aparelho Colorado RQ.
—Não que eu vá assistir esse babaca.
O frio chegava intenso no pequeno apartamento de Santa Cecília.
—Vamos esquentando o clima...
A garrafa de conhaque já estava pela metade.
—Não começa essa entrevista, pô?
Ele retirou a panela de pressão dos fundos da área de serviço.
—Vamos lá, pessoal. Chega de ficar esperando.
O silêncio da noite cercava o predinho de quatro andares.
—Povinho frouxo.
Na sacada do apartamento, Elpídio fazia a sua parte.
—Béin. Béin. Como é que é, pessoal?
A resposta parecia ir embora com o vento.
—O que está acontecendo? Cadê o povo?
Elpídio arremessou a panela para longe.
—Quer saber? O negócio é radicalizar.
Ele subiu com esforço os quatro lances da escada.
Várias antenas parabólicas o esperavam no teto do predinho.
—Cadê a marreta? Sei que tinha uma aqui.
O conserto da coluna ainda não tinha terminado.
—Botando pra quebrar.
O síndico se chamava Licurgo e reclamou no dia seguinte.
—O senhor destruiu todas as parabólicas do prédio.
—Era preciso, seu Licurgo. Barulhinho bom.
—E agora ninguém vai poder ver a entrevista hoje à noite.
—Que entrevista?
—Do Bolsonaro, amigo. Esqueceu ou é alienado mesmo?
Elpídio teve de conferir no calendário.
—Errei o dia. Maldita cachaça.
Ele se consola com um reforço no copo de requeijão.
—Vamos dobrar a dose. Haha.
Mas é como dizem.
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer.
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