Clareza. Foco. Precisão.
Cuidar da saúde dos olhos é dever de todos.
Dona Valdomira estava contente.
—Esse doutor Marco Aurélio é um gênio.
A operação de catarata tinha sido um sucesso.
—E já posso voltar para casa, doutor?
—Claro. Hoje mesmo.
Dona Valdomira chegou aliviada ao seu amplo apartamento em Higienópolis.
—Será que a Damiana ainda está me esperando?
Tratava-se da empregada doméstica.
Vinte e cinco anos de dedicação.
Logo no hall de entrada, dona Valdomira reparou em alguns detalhes insatisfatórios.
—Não limpou o aparador... cheio de poeira.
A visão da viúva chegava a prodígios de nitidez.
—Cocô de mosca no vaso de cristal. Onde já se viu?
Na sala de estar, dona Valdomira teve outra surpresa desagradável.
—Assistindo televisão, Damiana? Quem deu autorização?
As ordens eram estritas naquela residência.
—Esses canais só dizem mentira. Uma vergonha.
Ela não queria que ideias subversivas atingissem o cérebro da criada.
—Só me faltava a Damiana virar comunista.
Imagens chocantes, enquanto isso, sucediam-se na tela plana de altíssima definição.
Pancadaria. Quebra-quebra. Ônibus incendiados.
Dona Valdemira contemplou o espetáculo com olhos agudos. Penetrantes. Percucientes.
—Não disse? Bastou o Lula ganhar...
Ela deu um suspiro.
—E esses maloqueiros tomam conta.
A idosa teve um leve arrependimento.
—Sem querer ofender você, Damiana.
A funcionária resolveu explicar.
—São bolsonaristas, dona Valdomira. Invadindo a Polícia Federal.
Um manto de severidade cobriu repentinamente os traços da anciã.
—Ah, é? Ah, é?
As pulseiras de ouro tremeram no braço em riste.
—Considere-se despedida, Damiana.
—Mas, dona Valdomira... é verdade.
—Comunista dentro de casa? Além de tudo, respondona.
Dona Valdomira se olha no espelho.
—Pensar que eu estive cega durante esses vinte e cinco anos.
Novas tecnologias tornam a operação de catarata uma coisa simples.
Mesmo assim, cada pessoa continua com sua própria visão.
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