Descrição de chapéu The New York Times

Golfinhos podem gritar embaixo da água, mas nunca é alto o suficiente

Barulho produzido pelos seres humanos tem impedido os animais de se comunicarem

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Carolyn Wilke
The New York Times

Os mamíferos nadam no oceano através de um mundo sonoro. Mas nas últimas décadas os seres humanos aumentaram o volume, explodindo as águas com ruídos de navios, exploração de petróleo e gás e operações militares. Novas pesquisas sugerem que esse ruído antropogênico pode dificultar a comunicação e o trabalho coletivo dos golfinhos.

Quando os golfinhos cooperavam em uma tarefa num ambiente ruidoso, não eram tão diferentes dos moradores das cidades tentando ser ouvidos em meio ao barulho de britadeiras e sirenes de ambulância.

Baía dos Golfinhos no Texas State Aquarium
Baía dos Golfinhos no Texas State Aquarium - Divulgação/Texas State

Eles gritavam, chamando cada vez mais alto, relataram pesquisadores na quinta-feira (12) na revista Current Biology. "Mesmo assim, há um aumento drástico na frequência com que eles falham em se coordenar", disse Shane Gero, biólogo de baleias da Universidade Carleton em Ottawa, em Ontário (Canadá), que não participou do trabalho. O efeito do aumento do ruído era "notavelmente claro".

Os cientistas trabalharam com uma dupla de golfinhos machos chamados Delta e Reese, numa lagoa experimental no Centro de Pesquisa de Golfinhos em Florida Keys, na Flórida. A dupla foi treinada para nadar para diferentes pontos em seu recinto e apertar um botão com um segundo de diferença.

"Eles sempre foram os animais mais motivados. Ficavam realmente empolgados com a tarefa", disse Pernille Sorensen, bióloga e doutoranda da Universidade de Bristol, na Inglaterra. Os golfinhos conversavam entre si usando assobios e muitas vezes assobiavam logo antes de apertar o botão, disse ela.

A equipe de Sorensen canalizou sons usando alto-falantes subaquáticos. Etiquetas presas atrás dos respiradouros dos animais captavam o que os golfinhos ouviam e "diziam" uns aos outros, bem como seus movimentos.

Por meio de 200 tentativas com cinco ambientes sonoros diferentes, a equipe observou que os golfinhos mudavam seu comportamento para compensar o ruído alto. Os cetáceos viravam os corpos um para o outro e prestavam mais atenção na respectiva localização. Às vezes, quase dobravam a duração de seus chamados e amplificavam seus assobios, em certo sentido gritando para serem ouvidos acima do ruído de fundo ou de uma gravação de uma lavadora de alta pressão.

Quanto mais barulhento ficava, menos sucesso os golfinhos tinham na tarefa. Na condição mais alta, eles tiveram sucesso em 62,5% das vezes, pressionando seus botões simultaneamente cerca de 20% menos do que em níveis de som ambiente.

"Foi surpreendente ver o quanto a taxa de sucesso caiu", disse Sorensen.

No passado, pesquisadores observaram golfinhos selvagens mudando seu comportamento quando os barcos estavam por perto. Por exemplo, cientistas em águas australianas observaram menos golfinhos à medida que o número de barcos turísticos para observação de golfinhos aumentou. Mas ninguém ainda havia investigado como os sons antropogênicos podem atrapalhar a capacidade de cooperação dos animais.

"Geralmente é muito difícil fazer esse tipo de estudo na natureza", disse Mauricio Cantor, ecologista comportamental da Universidade Estadual do Oregon em Newport, que não fez parte do estudo. Mas a configuração experimental usada pela equipe de Sorensen forneceu "evidência clara do efeito do ruído", disse ele, porque os pesquisadores puderam controlar quase tudo o que poderia interferir em seus resultados.

Os golfinhos caçam juntos, usando o som para se comunicar e encontrar seu caminho através da ecolocalização. Eles também usam o som para se unirem às suas famílias e assobiam para sinalizar sua presença aos pares, disse Gero. Em ambientes ruidosos, "os animais não podem falar uns com os outros". Em longo prazo, disse Cantor, essas condições podem afetar a ingestão de alimentos e a capacidade de reprodução.

Já pode haver partes dos oceanos que não são mais utilizáveis para esses animais, disse Gero. Os golfinhos podem migrar de lugares onde não conseguem se comunicar com sucesso. Esse fenômeno já pode estar ocorrendo em grandes portos em lugares como Los Angeles ou Boston, disse ele.

Os navios são um dos principais fatores das paisagens sonoras oceânicas barulhentas e, em alguns pontos, os navios são desacelerados para proteger a vida marinha da poluição sonora, disse Gero. Por exemplo, ao longo de partes da costa do Pacífico, do estado de Washington ao Chile, os barcos são instruídos a reduzir a velocidade ou alterar o curso para reduzir o ruído que pode incomodar os mamíferos marinhos.

"Já estamos impactando os animais dessa forma", disse Gero. "A triste realidade é que, de certa forma, essa história está 35 a 50 anos atrasada."

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