Descrição de chapéu genética

Extração de DNA antigo revela possível dona de pingente de 20 mil anos

Método consegue isolar material genético de um objeto para ligá-lo a uma pessoa específica que o manipulou num passado distante

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Will Dunham
Washington | Reuters

Dentro de uma caverna siberiana que tem sido uma arca arqueológica do tesouro, um dente canino de alce perfurado para se tornar um pingente foi desenterrado por cientistas cuidadosamente, para evitar a contaminação desse intrigante artefato feito há cerca de 20 mil anos.

A coleta do pingente preservado na caverna Denisova rendeu dividendos. Cientistas disseram na quarta-feira (3) que um novo método para extrair DNA antigo identificou a possível dona do objeto —uma mulher da Idade da Pedra intimamente relacionada a uma população de caçadores-coletores conhecida por ter vivido numa parte da Sibéria a leste do local da caverna, no sopé dos montes Altai, na Rússia.

O método consegue isolar DNA que estava presente nas células da pele, suor ou outros fluidos corporais e foi absorvido por certo tipo de material poroso, incluindo ossos, dentes e presas, quando foi manuseado por alguém há milhares de anos.

Interpretação artística de um antigo pingente feito com um dente de alce, encontrado na caverna Denisova, no sul da Sibéria, com cordão escuro em forma de DNA
Interpretação artística de um antigo pingente feito com um dente de alce, encontrado na caverna Denisova, no sul da Sibéria, com cordão escuro em forma de DNA - Myrthe Lucas via Reuters

Objetos usados como ferramentas ou para adorno pessoal —pingentes, colares, pulseiras, anéis e similares— podem oferecer uma visão sobre o comportamento e a cultura do passado, embora nossa compreensão tenha sido limitada pela incapacidade de vincular um objeto a uma determinada pessoa.

"Acho esses objetos feitos no passado remoto extremamente fascinantes, pois nos permitem abrir uma pequena janela para viajar para trás e ter uma visão da vida dessas pessoas", disse a bióloga molecular Elena Essel, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva na Alemanha, principal autora do estudo publicado na revista Nature.

Os pesquisadores que encontraram o pingente, com idade estimada entre 19 mil e 25 mil anos, usaram luvas e máscaras ao escavá-lo e manuseá-lo, evitando a contaminação com DNA moderno. Tornou-se o primeiro artefato pré-histórico ligado por investigação genética a uma pessoa específica. Não se sabe se a mulher o fez ou apenas o usou.

Essel disse que, ao segurar o artefato com as mãos enluvadas, sentiu-se "transportada de volta no tempo, imaginando as mãos humanas que o criaram e usaram há milhares de anos".

"Ao olhar para o objeto, uma enxurrada de perguntas me veio à mente. Quem foi a pessoa que o fez? Esse utensílio foi passado de geração em geração, de mãe para filha, ou de pai para filho? O fato de podermos começar a abordar essas questões usando ferramentas genéticas ainda é absolutamente incrível para mim", acrescentou Essel.

O fabricante do pingente fez um furo no dente para passar alguma espécie de cordão, agora perdido. O dente também poderia fazer parte de uma faixa de cabeça ou de uma pulseira.

Nossa espécie, a Homo sapiens, surgiu pela primeira vez há mais de 300 mil anos na África, depois se espalhou pelo mundo. Os objetos mais antigos usados como adornos pessoais datam de cerca de 100 mil anos na África, de acordo com Marie Soressi, da Universidade de Leiden (Holanda), principal arqueóloga do estudo.

A caverna Denisova foi habitada em diferentes épocas por denisovanos e neandertais, espécies humanas extintas, e pela nossa espécie. A caverna produziu ao longo dos anos achados notáveis, incluindo os primeiros restos conhecidos de denisovanos e várias ferramentas e artefatos.

A nova técnica de pesquisa não destrutiva, usada em um laboratório em Leipzig (Alemanha), funciona um pouco como uma máquina de lavar. Nesse caso, um artefato é imerso num líquido que funciona para liberar o DNA dele, da mesma forma que uma máquina de lavar remove a sujeira de uma roupa.

Ao vincular objetos a pessoas específicas, a técnica poderia esclarecer os papéis sociais pré-históricos e a divisão do trabalho entre os sexos, ou mesmo se um objeto foi ou não feito por nossa espécie. Alguns artefatos foram encontrados em lugares conhecidos por terem sido habitados, por exemplo, por Homo sapiens e neandertais ao mesmo tempo.

"Este estudo abre grandes oportunidades para reconstruir melhor o papel dos indivíduos no passado de acordo com seu sexo e ancestralidade", disse Soressi.

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