Descrição de chapéu The New York Times

Abelhas mumificadas há 3.000 anos são encontradas em casulos

Os insetos raramente sobrevivem em forma fossilizada, mas uma estranha série de eventos de alguma forma matou e preservou essas abelhas por milênios

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Sarah Derouin
The New York Times

Uma equipe de investigação estava vasculhando a costa sudoeste de Portugal em 2019 em busca de sinais de como o seu ecossistema tinha mudado ao longo do tempo. Eles se depararam com uma cena surpreendente e inesperada: abelhas que foram mumificadas em sarcófagos subterrâneos há quase 3.000 anos.

Uma série improvável de acontecimentos conspirou para preservar esse enxame de polinizadores indefesos ao longo de milênios. O que quer que tenha acontecido, foi "uma noite infeliz para centenas de abelhas adultas que estavam prestes a deixar seus casulos", disse Carlos Neto de Carvalho, paleontólogo e coordenador científico do Geoparque Global Naturtejo da Unesco, em Portugal.

Estas não eram típicas abelhas europeias numa colmeia, mas membros de um grupo chamado Eucera. As abelhas passam a maior parte da vida gestando no subsolo e comendo o pólen deixado por suas mães, emergindo apenas durante algumas semanas quando sua planta favorita floresce.

Uma imagem de microtomografia computadorizada de raios-X de uma abelha Eucera macho dentro de um casulo selado de 3.000 anos
Uma imagem de microtomografia computadorizada de raios-X de uma abelha Eucera macho dentro de um casulo selado de 3.000 anos - Federico Bernardini/ICTP

Considerando as pistas, Carvalho e seus colegas deduziram que as abelhas provavelmente tiveram uma morte repentina.

"Centenas de abelhas preservadas em seus ninhos pouco antes de sair significam que algo catastrófico aconteceu para elas no que hoje é a ensolarada costa de Portugal", disse ele.

A equipe descreveu sua descoberta no mês passado na revista Papers in Palaeontology e apresentou uma hipótese sobre o que matou as abelhas enterradas.

As abelhas têm poder de permanência evolutivo, e sabe-se que seus ancestrais viveram na Terra ao longo de 120 milhões de anos. Elas resistiram a mudanças climáticas violentas e prosperaram onde quer que uma planta com flores pudesse crescer.

Mas encontrar corpos fossilizados de abelhas é raro –ao contrário dos ossos de tartarugas preservados em camadas de sedimentos.

"O exoesqueleto das abelhas (e dos insetos em geral) é feito de quitina, um biopolímero semelhante à celulose que se decompõe rapidamente após a morte do animal", escreveu Carvalho por email.

O que as abelhas normalmente deixam são vestígios de fósseis ou icnofósseis –impressões congeladas no tempo de corpos, ninhos abandonados ou ativos ou antigas tocas.

Os casulos que a equipe descobriu foram forrados e selados com um fio semelhante à seda produzido pela abelha mãe. Esse fio era um polímero orgânico à prova d'água –uma mistura de engenharia de materiais e estrutural– que promoveu a preservação das abelhas no interior.

Carvalho disse que essa "argamassa orgânica" protegeu as células do meio ambiente, salvando a delicada quitina da atividade bacteriana e da decomposição.

Seladas em seus casulos, as abelhas mumificaram, preservando o formato do corpo e características distintas. A equipe usou tomografia microcomputadorizada de raios X –um tipo de tomografia que capta imagens detalhadas de pequenas coisas como insetos– para examinar as abelhas mumificadas sem destruir os casulos protetores.

"Acho que o que torna esse estudo tão instigante é que você tem a abelha e pode ver que ela pertence à tribo Eucerini, que são as abelhas de chifres longos", disse Bryan Danforth, entomologista da Universidade Cornell, que não participou do estudo.

"Se você olhar a imagem da tomografia computadorizada, poderá ver as longas antenas, então saberá que é um macho."

Normalmente, determinar o que criou uma célula de ninhada fossilizada é complicado. "Existem outros animais que escavam o solo e podem criar algo parecido com um ninho de abelhas", disse Danforth.

Essa descoberta, acrescentou, é "o primeiro icnofóssil que realmente contém a abelha dentro dele".

Quanto ao que matou os insetos, os investigadores consideraram inundações ou uma seca prolongada que poderia ter limitado a oferta de alimentos. Mas o pólen armazenado nas células mostrou à equipe que as abelhas tinham bastante comida (o que significa que não morreram de fome).

A hipótese deles, em vez disso, é a mudança do clima.

"Presumimos que uma queda repentina para temperaturas congelantes naquele início de primavera foi responsável pela morte maciça no nível do solo", disse Carvalho.

Embora este ninho seja um exemplo de morte em massa localizada, também pode ser um lembrete de como as abelhas perseveraram diante das mudanças de condições climáticas. Existem ainda mais de 25 espécies de abelhas do tipo Eucera vivendo em diferentes hábitats em Portugal.

"Esperamos que esta descoberta nos traga mais informações sobre como esses animais se tornaram resistentes às mudanças climáticas", disse Carvalho. "As múmias das abelhas Eucera podem ser consideradas, portanto, uma mensagem de esperança neste mundo de caos climático que estamos vivendo."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.