Descrição de chapéu The New York Times

Via Láctea tem trilhões de mundos errantes

Astrônomos descobrem que planetas livres superam aqueles ligados a uma estrela hospedeira

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Katrina Miller
The New York Times

Os planetas errantes —orbes escuras e isoladas que erram pelo universo sem estar ligados a qualquer estrela hospedeira— não surgem do nada, simplesmente, no meio do nada cósmico. É provável que se formem da mesma maneira que outros planetas: dentro do disco giratório de gás e pó que cerca uma estrela "bebê".

Mas, diferentemente de seus irmãos planetários, esses mundos são expulsos violentamente de suas vizinhanças celestiais.

Astrônomos calcularam certa vez que haveria bilhões de planetas errantes ou órfãos na Via Láctea. Agora, cientistas da Nasa e da Universidade de Osaka, no Japão, elevaram a estimativa para trilhões. Em conclusões detalhadas em dois artigos científicos aceitos para publicação na revista The Astronomical Journal, os pesquisadores deduziram que esses planetas são seis vezes mais abundantes que os mundos que orbitam seus próprios sóis e identificaram o segundo planeta errante do tamanho da Terra jamais detectado.

Impressão artística de um planeta errante na escuridão do espaço, sem estar ligado a uma estrela
Impressão artística de um planeta errante na escuridão do espaço, sem estar ligado a uma estrela - Goddard Space Flight Center/Nasa/via NYT

A existência de mundos errantes que ficaram órfãos de seus sistemas estelares é conhecida há muito tempo, mas pouco compreendida. Descobertas anteriores sugeriram que a maioria desses planetas teria aproximadamente o tamanho de Júpiter, o maior planeta de nosso sistema solar. Mas essa conclusão encontrou muita resistência; houve até cientistas que declararam considerá-la surpreendente.

Para melhor estudar esses mundos errantes, David Bennett, astrônomo do Centro Goddard de Voos Espaciais, da Nasa, e sua equipe usaram nove anos de dados do telescópio Microlensing Observations in Astrophysics (MOA), do Observatório Canterbury Mount John, na Nova Zelândia. Exoplanetas foram detectados indiretamente pela medição de como sua gravidade distorcia e ampliava a luz que chegava de estrelas distantes atrás deles, em um efeito conhecido como microlente gravitacional.

Com a ajuda de modelos empíricos, os pesquisadores calcularam a disseminação das massas de mais de 3.500 eventos de microlente gravitacional (os dados de um desses candidatos foram suficientemente convincentes para levar a equipe a anunciar a descoberta de um novo planeta errante). A partir dessa análise, eles estimam que há cerca de 20 vezes mais mundos errantes em nossa Via Láctea do que há estrelas e que planetas com massa equivalente à da Terra são 180 vezes mais comuns que Júpiteres errantes.

A conclusão de que a maioria dos mundos errantes é pequena faz mais sentido que a ideia de que eles tenham as dimensões de Júpiter, disse Bennett. Isso porque acredita-se que os planetas se tornam errantes quando dois protoplanetas colidem. A força do impacto é tão grande que um deles expulsa o outro completamente do sistema estelar emergente.

Mas os planetas só podem ser chutados para fora de seus sistemas estelares por objetos maiores que eles. Se a maioria dessas estrelas órfãs tivesse tamanho comparável ao de Júpiter, muitos dos chamados super-júpiteres teriam que estar orbitando estrelas hospedeiras —mas existem poucas delas. Por outro lado, esses resultados sugerem que os planetas de massa menor são os que correm o risco de ser despejados.

"Portanto, a situação é perigosa para as terras", disse Bennett.

Ele também disse que a abundância de estrelas órfãs na Via Láctea sugere que casos de objetos do tamanho de planetas que colidiram durante o processo de formação "talvez sejam mais comuns do que os teóricos teriam imaginado".

Przemek Mróz, astrônomo da Universidade de Varsóvia que não participou do trabalho, disse que os resultados obtidos pelo grupo reforçam indicações anteriores sobre mundos errantes vindas de observações feitas dentro do Experimento Óptico de Microlente Gravitacional e da Rede Coreana de Telescópio de Microlente. "Logo, agora temos três estudos e três linhas de evidência independentes indicando que planetas errantes de massa pequena são muito comuns na Via Láctea", ele escreveu em um email.

Ainda não há certeza sobre se esses planetas são realmente errantes ou se apenas estão em órbitas suficientemente distantes para que os cientistas não consigam ligá-los a uma estrela hospedeira. Mróz pensa que a população observada provavelmente inclui um misto das duas coisas, mas será difícil deduzir os números relativos de cada um apenas pelas medições de microlente gravitacional.

Os astrônomos responsáveis pelos novos estudos estão antevendo dados ainda melhores sobre planetas soltos obtidos pelo Telescópio Espacial Nancy Grace Roman, uma missão da Nasa prevista para ser lançada em 2027. Juntando esses dados com outros obtidos pelo Telescópio Euclides, da Agência Espacial Europeia, ou observatórios bem posicionados em terra, os cientistas poderão medir a massa mais diretamente, recorrendo menos a modelos.

Existe a possibilidade de alguns desses planetas serem habitáveis? Talvez, teorizou Bennett, explicando que sem uma estrela hospedeira eles devem ser escuros, mas não necessariamente gelados. O hidrogênio na atmosfera de um planeta pode atuar como estufa e prender o calor que emana do interior do planeta. É isso que sustenta a vida microbiana em fissuras marinhas profundas na Terra.

Por enquanto, porém, não temos como procurar por sinais de vida nesses mundos isolados. "Dentro de cem anos, talvez haja um método para fazê-lo", disse Bennett. "Mas, por ora, os cientistas estamos procurando coisas que podemos fazer de fato."

A equipe não procurou mais além da Via Láctea. "Mas imaginamos que a situação seja semelhante em outras galáxias", disse Bennett —ou seja, que esses planetas despejados possam estar espalhados por nosso universo inteiro.

Tradução de Clara Allain

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