Descrição de chapéu The New York Times

Os bilionários que gastam uma fortuna para atrair cientistas de universidades

Um sigilo calculado circunda as recentes operações da Arena BioWorks, empresa que diz oferecer menos burocracia e até participação nos lucros aos pesquisadores que embarcarem

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Rob Copeland
The New York Times

Em um laboratório não identificado localizado entre os campi de Harvard e do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), um grupo dissidente de cientistas está em busca do próximo medicamento bilionário.

O grupo, financiado com US$ 500 milhões de algumas das famílias mais ricas da esfera de negócios dos EUA, tem causado alvoroço no mundo acadêmico ao oferecer salários de sete dígitos para atrair professores universitários altamente qualificados para uma caçada com fins lucrativos.

Seu objetivo autodeclarado: evitar os bloqueios e a burocracia que retardam os caminhos tradicionais da pesquisa científica nas universidades e empresas farmacêuticas, e descobrir uma série de novos medicamentos (inicialmente, para câncer e doenças cerebrais) que possam ser produzidos e vendidos rapidamente.

Quatro homens posam para fotografia em laboratório; um deles está sentado
Da esquerda para a direita: Stephen Pagliuca, proprietário do Boston Celtics; Keith Joung, uma das mais recentes contratações da Arena; Thomas Cahill, um capitalista de risco de Boston; e Stuart Schreiber, um pesquisador que foi por muito tempo afiliado à Harvard e que deixou o cargo para ser o cientista-chefe da Arena BioWorks em Cambridge, Massachusetts - Bob O'Connor - 11.jan.2024/The New York Times

A fanfarronice das startups é de praxe, e muitos ex-acadêmicos fundaram empresas de biotecnologia, esperando enriquecer com sua grande descoberta. Esse grupo, chamado de Arena BioWorks, emprestando de forma bastante orgulhosa uma citação de Teddy Roosevelt, não tem uma ideia singular, mas tem um grande talão de cheques.

"Não me desculpo por ser um capitalista, e essa motivação de uma equipe não é algo ruim", disse o magnata da tecnologia Michael Dell, um dos principais apoiadores do grupo. Outros incluem um herdeiro da fortuna dos sanduíches Subway e um proprietário do Boston Celtics.

A questão é que, há décadas, muitas descobertas de medicamentos não apenas se originaram em faculdades e universidades, mas também geraram lucros que ajudaram a encher seus cofres. A Universidade da Pensilvânia, por exemplo, afirmou ter ganhado centenas de milhões de dólares com pesquisas sobre vacinas de mRNA usadas contra a Covid-19.

Nesse modelo, qualquer lucro desse tipo permaneceria privado.

A Arena tem operado em modo sigiloso desde o início do outono, antes da turbulência entre Israel e o Hamas eclodir nas universidades vizinhas.

No entanto, o impulso por trás disso, segundo pesquisadores que migraram para o novo laboratório, está se tornando cada vez mais agudo à medida que as reputações das instituições de ensino superior sofrem um golpe. Eles dizem estar frustrados com o ritmo lento e os entraves administrativos em seus antigos empregos, bem como o que um novo contratado, J. Keith Joung, descreveu como salários "atrozes" no Massachusetts General Hospital, onde trabalhava antes da Arena.

"Costumava ser considerado um fracasso ir da academia para a indústria", disse Joung, um patologista que ajudou a projetar a ferramenta de edição de genes Crispr. "Agora o modelo se inverteu."

A motivação por trás da Arena tem componentes científicos, financeiros e até emocionais. Seus primeiros apoiadores começaram a discutir a ideia em uma mansão em Austin, Texas, no final de 2021, onde Dell, juntamente com o investidor inicial do Facebook James W. Breyer e um proprietário do Celtics, Stephen Pagliuca, desabafaram sobre os pedidos aparentemente intermináveis de dinheiro dos arrecadadores de fundos universitários.

Pagliuca havia doado centenas de milhões de dólares para suas antigas universidades, a Universidade Duke e Harvard, em grande parte destinados à ciência. Isso lhe rendeu assentos em quatro conselhos consultivos nas instituições, mas ele começou a perceber que não tinha ideia concreta do que todo aquele dinheiro havia produzido, exceto pelo seu nome em algumas placas do lado de fora de vários prédios universitários.

Nos meses seguintes, esses primeiros apoiadores se uniram a um capitalista de risco de Boston e médico treinado, Thomas Cahill, para elaborar um plano. Cahill disse que ajudaria a encontrar acadêmicos frustrados dispostos a abrir mão de sua conquistada estabilidade universitária, bem como cientistas de empresas como a Pfizer, em troca de uma generosa participação nos lucros de quaisquer medicamentos que descobrissem.

Os bilionários apoiadores da Arena ficarão com 30%, e o restante será destinado aos cientistas e às despesas gerais.

A ciência com fins lucrativos, é claro, não é algo novo; a indústria farmacêutica de US$ 1,5 trilhão é prova disso. Empresários como Jeff Bezos e Peter Thiel investiram centenas de milhões de dólares em startups que tentam prolongar a vida humana, e muitas empresas farmacêuticas têm recrutado talentos das universidades.

Uma parcela considerável dos medicamentos tem origem em bolsas do governo ou da universidade, ou em uma combinação dos dois. De 2010 a 2016, cada um dos 210 novos medicamentos aprovados pela FDA (Food and Drug Administration) estava conectado a pesquisas financiadas pelos NIH (Institutos Nacionais de Saúde), de acordo com a revista científica PNAS. Um estudo de 2019 de um ex-reitor da Faculdade de Medicina de Harvard, Jeffrey Flier, afirmou que a maioria das "novas descobertas" sobre biologia e doenças veio da academia.

Esse sistema tem vantagens de longa data. As universidades, geralmente ajudadas por seu status sem fins lucrativos, têm um suprimento quase ilimitado de assistentes de pesquisa com baixos salários para ajudar os cientistas nas pesquisas em estágio inicial.

Medicamentos inovadores, incluindo a penicilina, nasceram desse modelo. O problema, dizem cientistas e pesquisadores, é que pode haver esperas de anos para aprovações institucionais universitárias para avançar com pesquisas promissoras.

O processo, com o objetivo de filtrar propostas irrealistas e proteger a segurança, pode envolver a escrita de longos ensaios que podem consumir mais da metade do tempo de alguns cientistas. Quando o financiamento é concedido, a ideia inicial de pesquisa muitas vezes já está obsoleta, desencadeando um novo ciclo de solicitações de subsídios para projetos que certamente estarão desatualizados em seu próprio tempo.

Stuart Schreiber, um pesquisador que foi afiliado à Harvard por muito tempo e que deixou a universidade para ser o cientista principal da Arena, disse que suas ideias mais inovadoras raramente recebiam apoio. "Chegou ao ponto em que percebi que a única maneira de obter financiamento era se candidatar a estudar algo que já havia sido feito", disse Schreiber.

O prestígio de Schreiber —ele é um biólogo químico pioneiro em áreas como testes de DNA— ajudou a atrair quase cem pesquisadores para a Arena. Harvard se recusou a comentar sua saída e a de outros que ele ajudou a atrair.

Uma atmosfera de sigilo calculado tem girado em torno das operações da Arena.

Joung, que renunciou ao Mass General no ano passado, disse que não contou a ex-colegas para onde estava indo e que vários perguntaram se ele estava gravemente doente. Cahill disse que vários cientistas que ele contratou tiveram seu acesso ao e-mail da universidade rapidamente desativado e receberam ameaças legais severas de retaliação se tentassem recrutar ex-colegas —um fenômeno comum no mundo dos negócios mas que conta como um soco-inglês no meio acadêmico.

Os cinco bilionários que apoiam a Arena incluem Michael Chambers, um magnata da indústria e o homem mais rico da Dakota do Norte, e Elisabeth DeLuca, viúva de um dos fundadores da rede Subway. Cada um deles investiu US$ 100 milhões e espera dobrar ou triplicar seus investimentos em rodadas posteriores.

Em materiais confidenciais fornecidos a investidores e outros, a Arena se descreve como um "um bem público, totalmente independente, privadamente financiado".

Os apoiadores da Arena disseram em entrevistas que não pretendem interromper completamente suas doações para universidades. Duke recusou uma oferta de Pagliuca, ex-aluno e membro do conselho, para estabelecer parte do laboratório lá. Dell, um grande doador do sistema hospitalar da Universidade do Texas em sua cidade natal, Austin, alugou espaço para um segundo laboratório da Arena no local.

Schreiber disse que levaria anos —e bilhões de dólares em financiamento adicional— antes que a equipe descobrisse se seu modelo levaria à produção de medicamentos valiosos.

"Vai ser melhor ou pior?" Schreiber questiona. "Eu não sei, mas vale a pena tentar."

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