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Aonde os animais selvagens foram durante a pandemia de Covid?

Nem todas as espécies prosperaram durante lockdown, segundo estudo publicado na Nature

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Emily Anthes
The New York Times

Nos primeiros meses da pandemia de Covid, quando todas as notícias pareciam sombrias, uma hipótese aparentemente reconfortante ganhou destaque: com os humanos presos em suas casas, o mundo estava seguro novamente para os animais selvagens, que podiam vagar pelos cantos das cidades antes ocupados por pessoas.

Essa história, porém, não era tão simples assim, segundo um novo estudo global que usou câmeras para rastrear tanto a atividade humana quanto a animal durante o isolamento imposto pelo novo coronavírus.

"Tivemos uma noção um tanto simplista: humanos param, animais respiram aliviados e se movem mais naturalmente", disse Cole Burton, ecologista de vida selvagem e biólogo da conservação na Universidade da Colúmbia Britânica, que liderou a pesquisa. "Mas o que vimos foi bastante diferente."

Bisão em registro feito por armadilha fotográfica em Montana, nos EUA - Snapshot USA

Embora os humanos tenham desaparecido de alguns lugares durante o lockdown, eles surgiram em outros, incluindo parques que permaneceram abertos.

Além disso, houve uma enorme variabilidade na forma como mamíferos selvagens responderam às mudanças no comportamento humano. Carnívoros e animais que vivem em lugares remotos e rurais, por exemplo, estavam mais ativos quando as pessoas desapareciam da paisagem, enquanto o oposto geralmente era verdadeiro para grandes herbívoros e animais urbanos.

O estudo, publicado na Nature Ecology & Evolution nesta segunda (19), aprofunda e complica a compreensão dos cientistas sobre o que foi chamado de antropopausa, quando os bloqueios da pandemia alteraram radicalmente o comportamento humano.

"Não há uma solução única quando se trata de mitigar os impactos da atividade humana na vida selvagem", disse Kaitlyn Gaynor, ecologista de vida selvagem e bióloga da conservação na Universidade da Colúmbia Britânica. "Porque vemos que nem todas as espécies respondem da mesma forma às pessoas."

As armadilhas fotográficas, que automaticamente tiram fotos de animais selvagens quando detectam movimento e calor corporal, tornaram-se ferramentas de pesquisa essenciais para biólogos. O novo estudo é baseado em dados de 102 projetos que usam esse recurso em 21 países —a maioria dos equipamentos estava na América do Norte ou Europa mas também havia na América do Sul, África e Ásia.

Essas informações permitiram aos cientistas estudar os padrões de atividade de 163 espécies de mamíferos selvagens e monitorar com que frequência humanos apareciam nos mesmos locais que eles.

"Um dos principais pontos positivos desse estudo é que você tem informações tanto sobre humanos quanto sobre animais", disse Marlee Tucker, ecologista da Universidade Radboud, na Holanda, que não esteve envolvida na pesquisa.

No período de lockdown, a atividade humana diminuiu em alguns locais monitorados pelos projetos e aumentou em outros. Em cada um deles, os pesquisadores compararam com que frequência os animais selvagens foram detectados em períodos de alta e de baixa atividade humana, antes e durante a pandemia.

Carnívoros, como lobos e linces, pareciam ser altamente sensíveis às pessoas, mostrando a maior queda na atividade quando a atividade humana aumentava. "Carnívoros, especialmente os maiores, têm essa longa história de, digamos, antagonismo com as pessoas", afirmou Burton. "As consequências para um carnívoro de se deparar com pessoas ou se aproximar demais dela frequentemente significaram a morte."

Por outro lado, a atividade de grandes herbívoros, como veados e alces, aumentou quando humanos estavam por perto. Isso pode ser porque os animais simplesmente tinham que se mover mais para evitar as multidões de pessoas. Outra hipótese é que, com os carnívoros afastados pelos humanos, ficou mais seguro para herbívoros saírem e brincarem.

"Os herbívoros tendem a ser um pouco menos temerosos das pessoas, e eles podem usá-las como um escudo contra os carnívoros", disse Tucker.

A localização também importava. Em áreas rurais e não desenvolvidas, onde a paisagem não havia sido muito modificada pelos humanos, os animais geralmente se tornavam menos ativos conforme a atividade humana aumentava. Mas, em cidades e outras áreas desenvolvidas, os mamíferos selvagens tendiam a ficar mais ativos quando os humanos o faziam.

"Isso foi um pouco contraintuitivo e surpreendente", disse Gaynor. "Analisamos mais de perto e percebemos que grande parte dessa atividade na verdade estava ocorrendo à noite. Os animais estavam se tornando mais noturnos."

Os pesquisadores sugerem que vários fenômenos poderiam apoiar essas tendências. Talvez as espécies e indivíduos que persistiram nesses ambientes sejam os mais tolerantes e habituados aos humanos.

Além disso, poderiam ser atraídos pelos recursos humanos, como comida e lixo, e deslocariam suas expedições para o período noturno a fim de reduzir o risco de encontrar pessoas.

"Isso parece ser uma adaptação dos animais para coexistir com as pessoas", disse Burton. "São os animais trabalhando para fazer a sua parte na coexistência."

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