Descrição de chapéu Estados Unidos

Pela primeira vez, Starship sobrevive à reentrada na atmosfera terrestre

Quarto teste do veículo projetado pela levar humanos à Lua registrou avanços

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São Paulo

O Starship, veículo projetado pela SpaceX para levar astronautas de volta à superfície da Lua, ganhou os ares mais uma vez nesta quinta-feira (6), no quarto voo-teste integrado realizado pela companhia a partir da Starbase, instalação localizada em Boca Chica, no Texas. E foi nada menos que espetacular.

O veículo decolou às 9h50 (pelo horário de Brasília), com 32 dos 33 motores operacionais (há redundância, de modo que isso não impactou o voo), e a separação dos dois estágios se deu como o previsto, dois minutos e 45 segundos depois.

Entre os objetivos novos para esse novo voo de teste estavam o retorno controlado do primeiro estágio, chamado de Super Heavy, com um pouso suave no mar –manobra realizada apenas de forma parcial no voo anterior, em março– e a sobrevivência do segundo estágio, o Starship propriamente dito, à feroz reentrada na atmosfera terrestre, quando o exterior do foguete é exposto a temperaturas que podem chegar a 1.500 graus Celsius. No teste anterior, o estágio acabou destruído no início da descida.

Desta vez, os dois objetivos foram plenamente cumpridos.

O primeiro estágio fez com sucesso o disparo dos motores para o retorno e para o pouso, descendo suavemente sobre o mar.

O segundo estágio sobreviveu à reentrada –embora tenha perdido pelo menos parte da estrutura de seus flaps para manobra na atmosfera– e realizou também sua queima para um pouso na água.

E o mais incrível: imagens foram transmitidas durante todas as fases do voo, inclusive enquanto a nave esteve parcialmente envolvida pelo plasma incandescente formado na fase mais aguda da reentrada.

A transmissão foi possível graças à constelação de satélites Starlink, também da SpaceX, que pôde captar os sinais enviados do Starship para cima, para o espaço, sem serem bloqueados pelo plasma que se formava embaixo do veículo –e normalmente provoca blecaute de comunicações.

Os dados ainda precisam ser analisados, mas se trata do teste mais convincente e completo já realizado pela empresa com o foguete mais poderoso do mundo. E, após esse quarto voo, a cadência dos testes deve aumentar.

Ao conceder autorização para o procedimento, a FAA (agência que regula aviação civil e lançamentos espaciais comerciais) já levou em consideração que alguns elementos do veículo são experimentais e naturalmente sujeitos a falha: a proteção térmica para a reentrada, o sistema de flaps para guiar o estágio pela atmosfera e o acendimento dos motores para a queima de pouso.

Isso significa que, mesmo considerando algumas intercorrências, como os danos observados nos flaps, não será preciso realizar uma investigação antes que a SpaceX possa voltar a voar. Na prática, as chances são boas de que a SpaceX realize mais quatro ou cinco voos do foguete ainda neste ano.

Em uma apresentação feita em abril na Starbase, Elon Musk disse esperar que a SpaceX consiga realizar a recuperação do primeiro estágio com um pouso diretamente na plataforma de lançamento até o fim deste ano, e a recuperação do segundo estágio até o fim de 2025.

O voo desta sexta pode muito bem acelerar esse cronograma. Ainda assim, é pouco para quem, como a Nasa, quer usar o Starship em um pouso lunar tripulado a ser realizado até o fim de 2026.

AMBIÇÕES E REALIZAÇÕES

Além de realizar dezenas de voos bem-sucedidos e dominar a recuperação pelo menos do primeiro estágio, será preciso demonstrar a capacidade de reabastecer o veículo em órbita, o que exigirá uma sequência de dez a 20 lançamentos, em rápida sucessão. Depois disso, será preciso demonstrar sem tripulação um pouso e uma decolagem bem-sucedidos na Lua. Só aí ele poderá ser incorporado à missão Artemis 3.

A perspectiva já faz a Nasa pensar em mais um adiamento ou talvez em mudar o perfil da terceira missão Artemis, eliminando um pouso lunar.

Nada disso, contudo, tira o brilho do programa Starship. Desenvolvido pela SpaceX e depois abraçado pela Nasa (que fechou contrato com a empresa por US$ 2,9 bilhões pelo primeiro pouso lunar tripulado do século 21), o foguete, mesmo em seu estágio experimental, já mostra capacidades jamais antes vistas.

É o mais potente do mundo, podendo levar mais de cem toneladas de cada vez à órbita terrestre. Para que se tenha uma ideia do que isso significa, ele poderia levar ao espaço a massa equivalente à da Estação Espacial Internacional (ISS), 400 toneladas, em apenas três ou quatro voos. Construído pelos antigos ônibus espaciais americanos e por foguetes Proton e Soyuz russos, o complexo orbital exigiu 31 voos entre 1998 e 2011. Adições ao complexo foram feitas com 13 voos subsequentes entre 2013 e 2023.

Uma capacidade como essa, com as dimensões do foguete, também representa um potencial muito maior para missões científicas. O telescópio James Webb, com seu espelho segmentado de 6,5 metros, é o maior telescópio espacial já levado ao espaço. O Starship poderia acomodar um telescópio com espelho de 9 metros inteiriço, e talvez até maior, se segmentado.

Restrições de massa para futuras missões tripuladas e robóticas, um dos principais fatores limitantes, caem vertiginosamente com o novo veículo. A SpaceX espera poder levar com um único voo lunar de carga do Starship o equivalente à área de carga de um avião Boeing 737. É basicamente uma mudança de paradigma.

E o melhor: a preços muito competitivos. Estima-se que o Starship possa voar hoje, com a não recuperação de nenhum dos estágios, a um custo de US$ 100 milhões. Pode parecer muito, mas o único foguete comparável atualmente em operação é o SLS da Nasa, que sai por US$ 2 bilhões por lançamento e cuja cadência dificilmente ultrapassa um lançamento a cada dois anos.

Contraste com o que vimos nos últimos 13 meses: quatro lançamentos do Starship, e isso num ritmo impactado por trâmites burocráticos, que permitiram à FAA fazer a análise rigorosa dos impactos de cada voo antes da liberação do próximo. A tendência é o ritmo dos lançamentos aumentar, conforme a SpaceX ganha maior domínio sobre o sistema.

E, se o sonho da reutilização rápida e frequente se realizar, Elon Musk estima que o custo de cada lançamento pode cair para US$ 10 milhões. Preço de minifoguete com capacidade de foguete lunar tripulado.

O caminho até essa nova realidade ainda é longo e tortuoso. Mas, a cada novo voo, parece mais próximo e acessível.

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