Alexandre Schneider

Pesquisador do Transformative Learning Technologies Lab da Universidade Columbia em Nova York, pesquisador do Centro de Economia e Política do Setor Público da FGV/SP e ex-secretário municipal de Educação de São Paulo.

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Termômetro não cura febre

Avaliações externas são importantes do ponto de vista da gestão pública, mas dão poucas pistas para que professores atuem de maneira efetiva junto aos seus estudantes

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Alexandre Schneider

Presidente do Instituto Singularidades, pesquisador do Transformative Learning Technologies Lab da Universidade Columbia em Nova York, pesquisador do Centro de Economia e Política do Setor Público da FGV/SP e ex-secretário municipal de Educação de São Paulo

Barbara Born

Coordenadora de pesquisa do Instituto Singularidades, doutoranda da Faculdade de Educação de Stanford e ex-professora da rede municipal de educação de São Paulo.

A pandemia do Covid-19 entra em uma nova fase, com boa parte da população brasileira imunizada e com a circulação de uma nova variante, mais transmissível e a princípio menos letal. Desde 2020 as narrativas em relação à educação também ocorreram em ondas, a mais recente de maior gravidade: as avaliações existentes demonstram que os "estudantes retrocederam" ou tiveram "perdas de aprendizagem quase irrecuperáveis" durante a pandemia.

As avaliações externas padronizadas são importantes do ponto de vista da gestão pública, mas dão poucas pistas para que professores atuem de maneira efetiva junto aos seus estudantes, que são únicos e possuem problemas específicos. Ao invés de seguirmos com o discurso sobre "perdas de aprendizagem" ou sobre o que os alunos não sabem, talvez seja a hora de fortalecer as práticas dos docentes para que eles sejam capazes de promover uma avaliação para a aprendizagem, capaz de identificar as condições nas quais cada grupo de alunos específico está chegando na sala de aula. Mais do que isso, é preciso munir os professores de ferramentas para a utilização dessas informações a serviço da construção de experiências de aprendizagem efetivas.

Alunos em uma sala de aula
Aulas no colégio Humboldt, em SP, em 2021 - Karime Xavier - 18.out.2021/Folhapress

Essa perspectiva é corroborada por evidências das ciências da aprendizagem. Um amplo estudo conduzido pelo Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos ("How People Learn") identificou que a promoção da aprendizagem com compreensão e em profundidade requer, entre outros aspectos, uma articulação deliberada e cuidadosa dos conteúdos a serem aprendidos com os conhecimentos prévios dos estudantes. Inúmeras pesquisas no campo das ciências cognitivas demonstram que não mobilizar os saberes construídos pelos estudantes e a forma como construíram interpretações sobre o mundo faz com que os conhecimentos "novos" apresentados pela escola sejam apenas assimilados de maneira superficial e logo esquecidos.

Por que isso é importante no contexto em que vivemos? Apesar de todo o discurso ancorado nos resultados das avaliações externas sobre o que os alunos não sabem, não podemos ignorar que ao longo dos últimos dois anos eles viveram experiências múltiplas e construíram outros saberes, outras formas de interpretar o mundo. As crianças e jovens não estavam presos em uma caverna, e não podemos achar que a única aprendizagem que conta é aquela que ocorre no espaço escolar. Assim, ao invés de partirmos dos pressupostos da deficiência de aprendizagem, talvez seria rico e produtivo do ponto de vista cognitivo e afetivo compreendermos o que se aprendeu para, a partir desses saberes, desenvolver o currículo e fortalecer os conhecimentos dos estudantes.

Não se trata, contudo, da promoção de uma escuta superficial ou assistemática dos estudantes (simplesmente promover uma roda de conversa e, na aula seguinte, continuar com o currículo como se nada tivesse acontecido, por exemplo). Da mesma forma, a estratégia tradicional de formar professores para conhecer os conteúdos curriculares e reproduzi-los em sala será ainda mais inócua nesses novos tempos. É essencial, portanto, investir na formação continuada de professores para fortalecer suas capacidades de promoção de uma escuta qualificada e adoção de estratégias pedagógicas apropriadas para garantir que todas as crianças e jovens aprendam o que é esperado para sua idade.

A febre indica que algo não vai bem. Mas sem a ação humana de observar outros fatores que acometem o indivíduo, não é possível ter clareza do que acontece com o corpo e muito menos de como lidar com o problema. É hora de apostar na capacidade dos nossos professores e investir em sua formação para que melhor observem seus estudantes e sejam capazes de adotar as ações mais adequadas para a garantia do direito à educação de todos.

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