Alvaro Costa e Silva

Jornalista, atuou como repórter e editor. É autor de "Dicionário Amoroso do Rio de Janeiro".

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Alvaro Costa e Silva

Imitando macacos

Comum nos estádios, racismo chega às rodas de samba

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No livro "No Princípio, Era a Roda", Roberto M. Moura defende a tese de que a roda de samba é anterior ao próprio samba, fenômeno que opõe os conceitos de casa e rua, criando as condições para o aparecimento, consolidação e divulgação do gênero. É também responsável pela sua sobrevivência: se o "samba agoniza mas não morre" é por causa da roda.

No Rio há cerca de 120 rodas fixas e conhecidas, da zona norte à zona sul, em especial no Centro. Um ecossistema em expansão: aos sábados, na região que engloba as ruas do Ouvidor e do Mercado, esbarra-se em cinco ou seis delas. Passa-se de Cartola a Toninho Geraes caminhando poucos metros.

Duas pessoas no centro de uma roda. Uma mulher está de costas de blusa branca, calça preta e cabelo azul. Ela tem as duas pernas abertas, joelhos dobrados, e faz menção de colocar a mão inteira na boca
Casal é suspeito de imitar gestos de macaco em roda de samba no Rio; registrado foi filmado e é usado pela polícia para tentar identificar autores dos gestos - Reprodução/TV Globo

A novidade são as rodas que se oferecem como espaços seguros e confortáveis para pessoas pretas, mulheres e a comunidade LGBTIQA+. A tradição, no entanto, sempre foi acolhedora: a violência, o preconceito e a exclusão socioeconômica ficam de fora; a legitimidade do sambista independe do sucesso comercial. É um dos programas mais baratos que se pode fazer na cidade e nele a amizade vale mais que o dinheiro.

Pois um casal (ela argentina, ele brasileiro) resolveu imitar macacos na roda Pede Teresa, da praça Tiradentes. Pularam, guincharam, a madame chegou a fingir que catava alguma coisa na cabeça do companheiro e comia. A Orff-Schulwerk, associação com a qual a mulher tem vínculo, publicou uma nota nas redes dizendo que "na Argentina, no contexto de uma atividade pedagógica, a imitação de animais não tem conotação racista".

Poderiam ter dito qualquer coisa. Que era uma homenagem ao presidente Milei, que se considera "esteticamente superior", e ao jogador Enzo Fernández, com seus cantos transfóbicos. Que tudo não passou de brincadeira, a desculpa padrão, ou vexame de quem bebeu mal. Ou até mesmo que era uma práxis identitária. Nada encobre a verdade: foi uma grosseria estupidificante, uma cena de racismo explícito.

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